Em algum ponto entre o silêncio e o gesto, há uma mãe com uma câmera na mão — ou, talvez, atrás dela. Entre os registros fotográficos que atravessam gerações, as mães aparecem como presença e ausência. Elas estão nos retratos, nos bastidores e, muitas vezes, no próprio ato de fotografar.
No passado, ser mãe em uma fotografia não era tão simples. No século XIX, quando os tempos de exposição eram longos demais para crianças inquietas, surgiu a prática da hidden mother photography — a mãe estava ali, mas coberta por panos, camuflada no fundo da imagem. Era uma presença escondida que garantia a estabilidade da cena, mas não recebia o mesmo direito à lembrança visual. Um corpo oculto para que o filho pudesse existir na imagem.
Hoje, somos inundados por registros do Dia das Mães nas redes sociais. São selfies, retratos espontâneos, imagens antigas ressuscitadas dos álbuns de família. E ainda assim, mesmo quando visíveis, muitas mães permanecem nos bastidores — aquelas que fotografam os aniversários, os primeiros passos, os dias comuns. Que compõem o álbum com zelo, que transformam a câmera do celular em diário afetivo.
A democratização da fotografia deu às mães, enfim, o poder de guardar e de guardar-se. Mas nem sempre elas se incluem nos registros. Um estudo feito pela Avast entre 2018 e 2019 mostrou que as mulheres, especialmente entre 25 e 44 anos, podem tirar até 200 fotos a mais que os homens — muitas delas dedicadas a registrar momentos dos filhos. Ainda assim, mesmo com centenas ou milhares de imagens armazenadas, essas mães raramente aparecem nelas. Estão por trás da câmera, zelando pela memória, pelo instante, pela beleza de um momento que só elas souberam enxergar.
Como aponta o fotógrafo Tony Luciani em seu projeto com a mãe idosa, a imagem pode ser uma ponte para resgatar uma presença que o tempo tenta apagar. Em sua série comovente, ele nos lembra que o afeto é também memória — e que olhar para uma foto pode ser uma forma de tocar o que está se esvaindo.
Há também os retratos do nascimento, como os de Lela Beltrão, que eternizam o instante em que uma mulher se torna mãe. Ou os olhares de Ken Heyman, que viajou o mundo com Margaret Mead, documentando a ternura cotidiana entre mães e filhos.

A fotografia, nesses casos, não é apenas testemunha: é extensão do abraço, tradução do cuidado, prova viva de que o amor — mesmo quando invisível — sempre esteve ali.
Neste mês de maio, talvez o convite seja esse: olhar para as imagens antigas e perguntar onde estavam as mães. E, ao pegar a câmera, lembrar de incluí-las. Ou melhor: entregar-lhes o lugar de quem é vista, reconhecida e lembrada — não como figura de pano no fundo, mas como o centro amoroso da memória.
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