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19/04/2024



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“O BRDE precisa ter identidade própria”

 “O BRDE precisa ter identidade própria”

 

Por André Lopes e Fernando Ghignone

 

Na presidência do BRDE desde 2021, o advogado Wilson Bley Lipski mudou a maneira do banco atuar no mercado financeiro. Para ele, que assumiu a Diretoria de Operações em 2019, o grande papel da instituição é ser indutor do processo econômico. “Nós somos um banco público. Não podemos entender que somos banco por ser banco: vender, pegar garantia e cobrar. Nós temos que vender o valor adicionado e é esse valor que a gente vem procurando”, diz ele. Com essa estratégia, o BRDE chegou a quase R$ 450 milhões de lucro líquido em 2022. O recorde, avalia Lipski, não permite acomodações. “A gente não pode olhar e consolidar o trabalho nos bons resultados que tivemos até agora. Temos que olhar para frente e entender o que é viável. Acho que esse é o compromisso que a gente quer deixar, esse é o legado que nós queremos deixar, que o banco participe efetivamente da sociedade”, completa.

 

Em entrevista ao HojePR, Lipski fez um balanço da sua gestão na presidência do BRDE, avaliou os resultados econômicos do banco, contou como enfrentou as dificuldades criadas pela pandemia e traçou os planos para o futuro da instituição.

 

HOJEPR – O BRDE anunciou um recorde no seu balanço financeiro de 2022: R$ 446,6 milhões de lucro líquido. Em um ano extremamente instável para a economia, a que atribuir esse desempenho

Wilson Bley Lipski – Eu atribuo à um plano estratégico que nós estabelecemos lá em 2019. Nós tínhamos uma dependência enorme do BNDES. Eles tinham mudado alguns regramentos e isso nos trouxe ao fluxo financeiro. Então, daquilo que eu amortizava 100%, eles me devolviam só 50%. Isso causou uma reflexão maior aqui no banco. Ser dependente 99,5% do BNDES era uma coisa muito perigosa. Até porque, se o BNDES mudasse as regras ou brigasse conosco, não teríamos mais dinheiro. Então, o que nós fizemos? Temos que ter esse relacionamento com o BNDES? Temos. Temos que aumentar? Temos. Então criamos toda uma aproximação. Voltamos a ter 100% de fluxo financeiro, aumentamos alguns limites até 130% de fluxo e, no ano de 2021, nós criamos um regramento de exposição máxima. Então, com o BNDES ficou bem balizado. Mas por outro lado, para não voltarmos a ter essa dependência com esse novo regramento, nós fomos buscar parceiros nacionais.

 

HOJEPR – Quais foram esses parceiros?

Wilson Bley Lipski – Fomos atrás do FCA (Fundo Setorial Audiovisual) e das linhas de inovação do Inovacred e do Finep. Nós somos hoje o maior repassador do Brasil das linhas de inovação, 40% delas estão só no Sul do Brasil e o Paraná é quem mais ocupa esse recurso. Fomos atrás do FGTS, do Fungetur. Nós tivemos quatro tranches do Fungetur em um ano, concorrendo com a Caixa Econômica como segundo maior executor do Brasil. E fomos atrás dos recursos internacionais. Nós tínhamos pequenas sinalizações, uma aproximação com Banco de Desenvolvimento da América Latina no início. Fomos atrás da Agência Francesa do Desenvolvimento, fomos atrás do BEI, do BID, do IRD, NDB e agora estamos até com o Banco da Ásia.

 

HOJEPR – Quais foram os resultados dessas parcerias?

Wilson Bley Lipski – O resultado disso foram boas captações. O mercado, mesmo com toda essa intranquilidade, está aquecido no Sul do Brasil. A indústria vem subindo, o agro é muito forte e nós tivemos a capacidade de sair de uma oferta, que era de R$ 2,3 bi, para mais de R$ 4 bi em recursos. No ano passado fizemos R$ 4,4 bi em novas contratações. Isso se expressa na carteira, depois nos números dos nossos resultados operacionais. São os melhores resultados operacionais dos 62 anos de história do BRDE. Então, é uma conjuntura e não se furtando do plano estratégico, que era de diversificação, de ter maior capilaridade e de pulverizar recursos. Então, a gente sai do ticket alto com um ticket mais baixo e começa a executar algumas políticas públicas. Você sabe que o banco, às vezes, era um pouco afastado das políticas públicas do Estado. Dessa forma, a gente começa a formular e executar políticas públicas. Não é diferente do Banco do Agricultor, que é juros zero aqui, o SC Mais Renda, que foi juros zero em Santa Catarina, e o Juros Zero lá no Rio Grande do Sul. Era um papel que talvez o BRDE nunca tenha assumido.

 

“Ser dependente 99,5% do BNDES era uma coisa muito perigosa”

 

HOJEPR – Qual foi a estratégia do banco para atravessar a pandemia?

Wilson Bley Lipski – Na pandemia nossa estratégia foi mais especial. Esse período nos mostrou a necessidade de ter diálogo com a sociedade. Entender que os nossos produtos, naquele momento, não eram os mais adequados. Então nós reformulamos. Criamos uma política para jovens, uma política para mulheres, fizemos capital de giro isolado, algo que nunca tinha sido feito na história do BRDE. Fizemos o segundo piso com a Fomento Paraná, que distribuiu dinheiro para nós, de R$ 1 mil a R$ 5 mil. Nós colocamos lá R$ 30 milhões, como fizemos com outras cooperativas de crédito e produção. Acho que não nos furtamos de executar na plenitude nosso plano estratégico. A nossa resposta ainda é menor do que a sociedade nos exige, por isso estamos incrementando essa possibilidade de fazer novas capitalizações. Nós temos que ir ao mercado. Em 2024, nós queremos ir ao mercado de forma bem consistente, o que é mais uma forma da gente incrementar a carteira. A carteira sai de R$ 3,2 bi para quase R$ 17 bi. Sai de 31 mil clientes para 39 mil clientes. Então, isso é o que vai dar os R$ 446 milhões que nós temos de resultado.

 

HOJEPR – Em linhas gerais, essa grande diversificação e essa maior capilaridade foram os fatores mais determinantes para o lucro registrado?

Wilson Bley Lipski – Sim, são pilares. Acho que a possibilidade de captar bons recursos, você ter oferta e direcionar isso, não na concentração, mas sim na pulverização, e você ter diálogo para entender quais são as nuances que a sociedade exige de nós, entender que tem que ser produzido mais rápido, produtos mais adequados, com uma precificação mais razoável e no prazo. A gente fez isso. E tudo isso, tem uma vertical maior, que é ser um banco verde, um banco da sustentabilidade. Isso trouxe muitos clientes que não estavam aqui. R$ 1,5 bi foram alcançados apenas com projetos verdes, então talvez seja um grupo que estava rodeando outras instituições financeiras e nós conseguimos trazer para cá.

 

HOJEPR – O volume de negócios do banco em 2022 foi de R$ 4,4 bilhões. Qual é o foco do BRDE no Paraná?

Wilson Bley Lipski – A motivação maior do banco sempre foi o Agro. Sempre. E no Paraná ainda mais: 65% da nossa carteira ainda está vocacionada no Agro. Eu pego o Agro, somado com as indústrias de transformação do Agro, isso dá 65%. O Agro é um grande motivador, mas nós tivemos algumas restrições também. O Plano Safra não foi tão amplo. O BNDES trouxe alguns limites, principalmente para as cooperativas, de uma forma menor. Nós fomos lá e equalizamos dinheiro nosso direto, para a gente poder ter uma oferta maior que foi direcionada muito aos pequenos e médios produtores.

 

HOJEPR – Esses pequenos e médios, o acesso deles é pelas cooperativas?

Wilson Bley Lipski – Cooperativas e alguns direto. Há uma divisão.

 

HOJEPR – Os diretos por agências do BRDE?

Wilson Bley Lipski – O BRDE não tem agência e nem pode ter, mas por essa execução de política alguns vêm diretamente para nós. Agora, a grande maioria dos recursos são através das cooperativas de crédito. Sicoob, Sicred, Coamo, enfim. Eu vejo que no Paraná a nossa motivação ainda é muito forte no Agro, mas com tendências de uma pulverização. Por isso essa pulverização de créditos começa a permear. Claro que a resposta não é tão rápida, ela tem um processo de construção. Nós vamos sair do Agro? Não. A porção do agro vai ser sempre muito razoável? Vai. Agora, tem outras coisas. Inovação era algo que a gente não tratava. Hoje o segundo maior funding nosso são os fundings internacionais. Nós estamos muito vocacionados em questões de sustentabilidade, energias renováveis e assim por diante. A gente vê que começa a mudar essa matriz. Quem sabe o meu legado lá no final seja de deixar uma divisão dessa pizza mais equilibrada, que todo mundo tenha o mesmo pedaço.

 

“No ano passado fizemos R$ 4,4 bi em novas contratações”

 

HOJEPR – O banco tem políticas de incentivo para o pequeno agricultor?

Wilson Bley Lipski – Tem. Através desses cooperados. Agora no último evento em que eu estive com o governador lá no Show Rural, nós financiamos a Frimesa em R$ 32 milhões e financiamos um trator de R$ 27 mil. Então, essa pulverização se dá mesmo pelas cooperativas de crédito ou por execução de políticas, como o Banco do Agricultor, que foi algo que trouxe um resultado enorme para nós, exclusivamente no Paraná. Nos outros Estados essa pulverização maior, com ticket baixo, se fez através do SC Mais Renda, do Juros Zero, enfim, outras aplicações. O Agro sempre será importante para o BRDE. O BRDE não tem como mudar essa sua matriz ou reconverter ela. A gente vai ter esse posicionamento. Mas quando a gente migra para inovação e sustentabilidade, a gente está vendo que há um movimento da sociedade acompanhando o nosso planejamento.

 

HOJEPR – E o que vem pela frente? Qual é o planejamento estratégico do banco para esse ano?

Wilson Bley Lipski – Ser o primeiro banco verde do Brasil. O primeiro banco verde do desenvolvimento. Eu quero criar uma metodologia aqui dentro que possa ser uma metodologia de respeito internacional e que nossos projetos tenham esse viés. Uma precificação diferenciada para quem tiver esse viés. Queremos trabalhar a questão do hidrogênio verde, queremos financiar essas iniciativas. Mas trabalhar a sustentabilidade e as energias renováveis vai ser a nossa motivação maior. O que eu quero continuar fazendo é a diversificação de funding, a gente quer ampliar a capacidade de captação. E a gente está criando agora uma relação com o Banco da Ásia, com a possibilidade também de fazer uma captação. A JAE é algo que estamos discutindo, a Agência Francesa nos colocou em um patamar de muita respeitabilidade e fez um crédito rotativo para nós, hoje não dependemos de contratos. O BEI e a CAF da mesma forma. Então essa diversificação internacional vai ser colocada. O que eu acho que nós temos que ter é que, com a respeitabilidade que o BRDE tem no Sul, que nós possamos levar as reivindicações, principalmente da criação do Fundo Sul, que é uma reivindicação antiga, não do banco, mas da sociedade do Sul do Brasil, nós temos que levar isso.

 

HOJEPR – Como seria feito?

Wilson Bley Lipski – Um fundo constitucional. Assim como tem o FCO, nós queremos ter um fundo constitucional aqui. Talvez um percentual menor do que o deles, mas que nós tenhamos esse aporte que hoje nós não temos. Nós não temos e o Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo também não. São Paulo com a pujância que tem, talvez não precise. Espírito Santo e Rio de Janeiro, com os royalties, talvez também não precisem, embora nós tenhamos colocado que a fundação do Fundo Sul pode ser também o precursor do Fundo do Sudoeste. E aí criar essa possibilidade. Nisso a gente vem trabalhando muito forte. Com o ingresso desses quase R$ 5 bilhões por ano imagina o tamanho da carteira que podemos criar ao longo dos próximos cinco ou anos. É um volume enorme. Eu acho que o que vem pela frente é olhar para frente. A gente não pode olhar e consolidar o trabalho nos bons resultados que tivemos até agora. Quando assumi o banco, nós queríamos ter uma carteira de 20% a mais. Muitos aqui criticavam ou não davam total importância para isso. Nós conseguimos alcançar. Só que não podemos ficar nos R$ 17 bilhões ou R$ 18 bilhões. Nós temos que ir a R$ 20 bilhões, RS 25 bilhões, e aumentar essa possibilidade de entrega. E estamos fazendo isso com diálogo, muito diálogo. Corri o Paraná inteiro, Santa Catarina, Rio Grande do Sul. Diálogo com todos, para a gente entender os momentos, entender quais são os produtos, entender o que é viável. Acho que esse é o compromisso que a gente quer deixar, esse é o legado que nós queremos deixar – que o banco participe efetivamente da sociedade. Que o BRDE não seja confundido com o BNDES. O BRDE tem que ter sua identidade própria. E eu acho que mais do que isso – que a população do Sul tenha orgulho de ter o BRDE, que é um grande motivador de desenvolvimento econômico e social para a nossa região.

 

HOJEPR – Santa Catarina e Rio Grande do Sul têm essa mesma visão?

Wilson Bley Lipski – Olha, hoje tem. Nós criamos um pacto muito forte e uma aproximação muito forte com os governadores. Na semana passada eu estava no Codesul, fui visitar tanto o Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul, quanto o Jorginho Mello, de Santa Catarina. Com o governador Ratinho Junior a gente conversa quase que diariamente, e eles começaram a entender o tamanho da importância. Até na designação dos seus diretores, no sentido em que eles têm que continuar com setores estratégicos nessa visão de incremento, de aumento, de aproximação com o BRDE. O BRDE às vezes é um pouco tímido, embora esteja trilhando um posicionamento do que chamo ‘novo BRDE’, um banco alinhado com as mudanças e os temas que a sociedade exige para a real transformação social e econômica.

 

(Colaboração: Isabella Honório)

 

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