Como já disse na coluna passada, novembro está sendo um mês de muitas atividades culturais em Curitiba. Uma das mais emocionantes foi realizada em 7 de novembro no Janaíno Vegan do Largo da Ordem: um show da banda Partigianos em celebração aos 100 anos da Coluna Prestes, movimento liderado por Luiz Carlos Prestes. O evento teve apoio da banda Partigianos, do Janaíno Vegan e do Observatório da Cultura do Brasil, com participação especial de Luiz Carlos Prestes Filho, descendente do líder político que protagonizou este marcante episódio da História do Brasil.
Os Partigianos surgiram da união de grandes nomes da música curitibana: Vlad Urban (vocal e violão – Sick Sick Sinners, Os Catalépticos), David Ernst (guitarra – Kráppulas, 99 Noizagain), Rúbia Oliveira Barreto (baixo – Cigarras), Gustavo Toscan (acordeon – Decadência, Gaiteiros de Lume), Dora Urban (vocal – Madrigal Vocale, Americantiga), Beta Roberta (violino – Como Todo Mundo, Watch Out for the Hounds) e André Santos (bateria – Repudiyo).
A ideia dos integrantes dos Partigianos é combater, por meio da música, a mediocridade do pensamento autoritário conservador que vem crescendo na sociedade brasileira. “A banda surgiu da necessidade de expressar o pensamento antifascista, resgatando essas músicas que estavam esquecidas e que, apesar de antigas, continuam extremamente atuais”, declara o músico Vlad Urban.
Com apoio total da plateia presente, os Partigianos apresentaram seu repertório de hinos revolucionários, que foram intercalados com participações de Luiz Carlos Prestes Filho. Na ocasião, ele recitou algumas das lendas da Coluna Prestes em forma de poemas (publicadas em seu livro “Trilogia Heroica”), relatos históricos, e também participou de algumas músicas com os Partigianos, incluindo a inédita “Recuar Jamais”, escrita pelo próprio Prestes Filho. Uma das histórias fascinantes que ele contou foi que os sertanejos do Nordeste chamavam a Coluna Prestes de A Serpente Luminosa.
Luiz Carlos Prestes Filho desempenha diversas funções no meio cultural: músico, compositor, cineasta, letrista, escritor, poeta, ator, ilustrador, além de jornalista e economista, especializado em economia da cultura. Descendente do revolucionário Luiz Carlos Prestes, teve contato com grandes nomes da cultura desde a infância. Sua casa era frequentada por nomes como Arthur Moreira Lima, Beth Carvalho, Taiguara, Ferreira Gullar, entre outros.
A Coluna Prestes ou Coluna Miguel Costa-Prestes, formalmente designada 1.ª Divisão Revolucionária, foi um movimento político-militar brasileiro de teor tenentista ocorrido entre 1924 e 1927. O principal motivo para a criação do movimento foi a insatisfação com o governo de Artur Bernardes e o regime oligárquico, característico da República Velha, conhecido como política do café com leite. Suas reivindicações foram a implementação do voto secreto, a defesa do ensino público e a obrigatoriedade do ensino secundário para toda a população, além de acabar com a miséria e a injustiça social no Brasil. Em seus dois anos e meio de duração, a Coluna, composta de 1,5 mil homens, percorreu cerca de 25 mil quilômetros, através de treze estados do Brasil.
Apesar da marcha militar, algumas características de um movimento popular são identificadas uma vez que a maioria de seus soldados eram principalmente trabalhadores do campo, analfabetos e semianalfabetos. Cerca de cinquenta mulheres participaram da marcha, quase todas originarias do Destacamento Gaúcho. Muitas dessas mulheres chegaram a combater do lado dos revoltosos. Como consequência final, a marcha teve grande importância para a história do Brasil porque teve caráter nacional e enfraqueceu o governo oligárquico, abrindo caminho para a Revolução de 1930. Sua repercussão internacional foi tanta que inspirou a vitoriosa Grande Marcha de Mao Tse-Tung na China, anos depois.
Apesar do movimento tenentista ter os militares de baixa oficialidade como seus principais participantes, não se caracterizou como um movimento militarista. Foi, no entanto, uma expressão de revolta das classes médias com o domínio oligárquico existente no país. Não era pretensão dos tenentes o estabelecimento de um governo militar, mas sim de um legítimo poder civil baseado no liberalismo. Tendo proporções nacionais, não somente os setores militares foram mobilizados mas também os civis.
Trajetória
Rio Grande do Sul
Com a eclosão dos levantes tenentistas, principalmente após as notícias da Revolta Paulista de 1924, em 28 de outubro de 1924 na Região das Missões do Rio Grande do Sul os primeiros batalhões e cavalarias se levantaram com o incentivo do capitão Luís Carlos Prestes, que comandava o 1º Batalhão Ferroviário de Santo Ângelo. Também rebelaram-se tropas nas cidades gaúchas de São Luiz Gonzaga, São Borja e Uruguaiana, respectivamente coordenadas por Pedro Gay, Rui Zubaran e Juarez Távora. Em São Borja, Antônio de Siqueira Campos participou da chefia das tropas ao retornar clandestinamente de seu exílio em Buenos Aires. Os civis eram chefiados pelos caudilhos maragatos, acostumados com a luta de guerrilhas. Em dezembro do mesmo ano, cerca de catorze mil homens sob o comando do Estado-Maior governista marchavam sobre São Luís Gonzaga com o objetivo de cercar e suprimir as forças rebeldes que pensavam estar reunidas na cidade. No entanto, os soldados da Coluna estavam distribuídos em torno da cidade em distâncias consideráveis, o que possibilitou que Prestes encontrasse uma saída que permitisse romper o cerco legalista se infiltrando entre as colunas dos adversários. Com o exército governista desorientado pela estratégia de mobilidade adotada, a Coluna marchou durante a noite em direção a Ijuí, que era um ponto fraco dentro das defesas legalistas. Ao ficar evidente que os rebeldes haviam rompido o cerco sem serem percebidos, o governo reuniu 1,6 mil homens na região de Nova Ramada visando barrar a passagem para Palmeira das Missões. Deu-se início ao confronto de oito horas que ficou conhecido como “Combate da Ramada” no dia 3 de janeiro de 1925, onde mais uma vez a tática que Prestes concebeu como “guerra de movimento” foi decisiva para a vitória da Coluna apesar de cinquenta de seus soldados terem sido mortos e cem foram feridos. A marcha, agora com cerca de 600 homens, continuou para a travessia do norte do Rio Grande do Sul no Rio Uruguai.
Santa Catarina e Paraná
Os rebeldes deslocavam-se a pé por Santa Catarina pois haviam perdido quase todos seus cavalos na travessia do Rio Uruguai. Na cidade de Maria Preta os rebeldes escaparam provocando uma briga entre oficiais legalistas. Em 7 de fevereiro, chegaram em Barracão, Paraná, onde dias depois, travara, duas importantes batalhas, da linha Maria Preta e da famosa manobra da linha Separação, nesta última, colocando as duas tropas legalistas em confronto direto. De Barracão, Prestes, em uma carta ao general Isidoro Dias Lopes, revela seu plano de ataque ao general Cândido Rondon em Mallet. Prestes então liderou os revolucionários até o oeste paranaense com o objetivo de encontrar os rebeldes remanescentes da Revolta Paulista de 1924. A tropas paulistas foram incorporadas à Coluna em abril de 1925 em Foz do Iguaçu. No dia 12 de abril, Prestes se reuniu com Dias Lopes e Miguel Costa para formar a 1.ª Divisão Revolucionária. Os quatro destacamentos que a compunham eram comandados por Siqueira Campos, João Alberto Lins de Barros, Cordeiro de Farias e Djalma Dutra. Decidiram então prosseguir a marcha para o Mato Grosso, passando pelo Paraguai, enquanto Isidoro Lopes parte para a Argentina. para organizar uma rede de apoio externo para o movimento. Por sua vez um pequeno componente da Coluna permaneceu em Foz do Iguaçu, a fim de distrair as tropas legalistas permitindo a fuga dos revoltosos. Uma curiosidade culinária é que a Coluna Prestes trouxe a técnica do porco no rolete para o Oeste do Paraná, tendo aprendido com os paraguaios.
Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais
Com a Coluna ingressando no sul do Mato Grosso, os legalistas da região foram reforçados pelo exército do major Bertoldo Klinger com mais de mil homens. Houve um confronto de dois dias na Cabeceira do Apa onde os destacamentos de Siqueira Campos e João Alberto obrigaram o exército de Klinger a se retirar. Avançando pelo estado em direção a Goiás, combateram por vezes as forças de Klinger e a polícia goiana, percorreram a serra do Paranã e entraram em Minas Gerais. Em 7 de setembro os revolucionários voltaram a Goiás e começaram a marchar em direção ao norte do atual Tocantins. Nessa época, em um confronto os revoltosos se dividiram em pelotões plantando pistas falsas conseguindo assim despistar as tropas legalistas. Houve também um momento durante a passagem pelo Planalto Central em que Artur Bernardes mandou aviões para bombardear os revoltosos, essa tentativa fracassou devido ao mau tempo. Em um confronto no planalto, Prestes o venceu graças a ajuda de um infiltrado na tropa legalista.
Norte e Nordeste
A Serpente Luminosa seguiu em direção ao nordeste e em novembro atingiu o Maranhão. Em dezembro entrou no Piauí e travou um combate em Teresina com as forças do governo. Antes do combate os revoltosos cortaram as linhas de telégrafo que ligavam Barão do Grajaú a Teresina. Rumando então para o Ceará, a Coluna teve outra baixa importante quando Juarez Távora foi capturado. Em janeiro de 1926, atravessando o Ceará, chegou ao Rio Grande do Norte e em fevereiro invadiu a Paraíba, enfrentando na vila de Piancó séria resistência comandada pelo padre Aristides Ferreira da Cruz, líder político local. Após ferrenhos combates, a vila acabou ocupada pelos revolucionários. Também foram fustigados pelo bando de Lampião, contratado pelos coronéis locais. Prosseguindo a marcha rumo ao sul, a Coluna atravessou Pernambuco e Bahia e dirigiu-se para o norte de Minas Gerais, onde esperavam pelo levante do tenente Cleto Campelo em Pernambuco, porém o levante fracassou e os insurgentes foram cercados por quinze mil soldados legalistas, mas conseguiram escapar em uma rota de fuga encontrada nas montanhas locais. O comando da coluna decidiu interromper a marcha para o sul e retornar ao nordeste através da Bahia. A intenção da passagem por Minas era furar o cerco empreendido pelo coronel Horácio de Matos atraindo suas forças para Minas, e depois retornar para Bahia, e com isso receber novas armas e munições das mãos de Isidoro Lopes. Cruzou o Piauí, alcançou Goiás e finalmente chegou de volta a Mato Grosso em outubro de 1926. Naquele momento, foram enviados à Argentina Lourenço Moreira Lima e Djalma Dutra para consultar o general Dias Lopes quanto às orientações futuras para a Coluna.
Exílio na Bolívia
Entre fevereiro e março de 1927, após a travessia do Pantanal, parte da coluna comandada por Siqueira Campos, que comandava o melhor destacamento da Coluna, chegou ao Paraguai com o objetivo de desviar a atenção da tropa legalista, ao passo que o restante ingressou na Bolívia. Tendo em vista as condições precárias, as instruções de Dias Lopes eram para que os revolucionários se exilassem. Miguel Costa seguiu para Paso de los Libres enquanto Prestes e mais duzentos homens rumaram para Gaiba. Em 5 de julho de 1927, os exilados inauguraram em Gaiba um monumento em homenagem aos mortos da campanha da Coluna.
Participação de mulheres
É muito pouco conhecida, e explorada a participação de mulheres na Coluna Prestes. Elas eram conhecidas como viandeiras e eram frequentemente incorporadas a tropa contra a vontade dos comandantes. Elas eram constantemente vítimas da misoginia com o papel de combatente descartado e substituído pelo papel de “alma mãe”. Mesmo assim, algumas fontes mostram a força delas:
Chama-se Alzira, usa chapéu desabado, calças de montar, botas, cartucheira e maneja carabina como o mais aguerrido soldado. A prisão não abateu essa mulher varonil que se mostra rancorosa sempre que se refere às tropas fiéis à República. — Jornal A Tarde, 18/03/1926
Essa reportagem destaca o papel de combatente das mulheres na Coluna Prestes, que é frequentemente esquecido pela história.
Consequências
Como resultado do fracasso em reprimir o movimento, o governo oligárquico fica enfraquecido, com suas críticas sendo reforçadas, com isso os tenentistas retornam em 1930 desta vez vitoriosos e com o apoio de oligarquias dissidentes pondo fim a República Oligárquica iniciando um novo ciclo na história do Brasil, marcado não só por maior participação das massas na política, e por mais direitos para a população, mas também por uma instabilidade política com golpes e ditaduras.
O líder efetivo da Coluna foi Luís Carlos Prestes (Porto Alegre, 3 de janeiro de 1898 – Rio de Janeiro, 7 de março de 1990) um militar e político comunista brasileiro e uma das personalidades políticas mais influentes no país durante o século XX.
Filho de Antonio Pereira Prestes e Maria Leocádia Felizardo Prestes, formou-se no secundário no Colégio Militar e no superior pela Escola Militar do Realengo no Rio de Janeiro, através da qual ingressou no Exército Brasileiro em fevereiro de 1916. Prestes foi o primeiro de sua turma no Colégio Militar e na Escola Militar (teve as melhores notas na história das duas escolas), formando-se como oficial da Arma da Engenharia em dezembro de 1919, recebendo o diploma de bacharel em ciências físicas e matemáticas. Seus companheiros de turma foram a geração inicial do tenentismo, como Juarez Távora, Antônio de Siqueira Campos, Carlos da Costa Leite, Eduardo Gomes, Osvaldo Cordeiro de Farias, Newton Prado e Landerico de Albuquerque Lima, mas nessa época ele tinha pouco interesse na política. Ele foi engenheiro ferroviário na 1.ª Companhia Ferroviária de Deodoro, como tenente, e durante o ano de 1921 foi instrutor na Escola Militar até o final desse ano, quando voltou à Companhia Ferroviária. Como seu capitão comandante estudava medicina e pouco comparecia ao expediente, Prestes, como o tenente mais antigo, era quem de fato comandava.
No Clube Militar, Prestes acompanhou em 1922 a repercussão da crise das cartas falsas. Apesar de sua posição moderada, era solidário à conspiração para um levante militar para destituir o governo de Epitácio Pessoa e impedir a posse de Artur Bernardes. Em 13 de junho ele contraiu tifo, encontrando-se doente na sua casa no Méier quando a Revolta dos 18 do Forte estourou na noite de 4 para 5 de julho. Ele ainda esperava juntar-se aos companheiros dentro de dois a três dias, mas o movimento foi rapidamente sufocado. Após a revolta, ele não quis permanecer no Rio de Janeiro e conseguiu transferência à Comissão Fiscalizadora da Construção de Quartéis nos municípios de Santo Ângelo, Santiago do Boqueirão e São Nicolau. Este cargo o expôs ao desvio de verbas pelos políticos, e em fevereiro ele pediu exoneração, sendo mais tarde transferido ao 1.º Batalhão Ferroviário, em Santo Ângelo, onde foi chefe da seção de construção. Em outubro ele foi promovido a capitão.
Desde o início de 1924, emissários tenentistas do centro do país ligavam-se com as guarnições do Rio Grande do Sul para planejar uma nova ofensiva contra o governo de Artur Bernardes. Prestes comprometeu-se com a conspiração, mas não queria se revoltar sujeito ao seu juramento de fidelidade aos poderes constituídos. Assim, ele solicitou licença para tratamento de saúde no início de julho de 1924 e pediu demissão do serviço ativo em setembro. O requerimento foi esquecido na burocracia do Exército e só voltaria à tona em 1935, quando ele foi acusado de deserção. Enquanto estava afastado da tropa, ele trabalhou como engenheiro civil, instalando a rede de iluminação elétrica de Santo Ângelo e outras cidades e construindo uma ponte ferroviária na região.
Em outubro de 1924, Prestes liderou um grupo de rebeldes na região missioneira do Rio Grande do Sul. Saiu de Santo Ângelo e se dirigiu para São Luís Gonzaga, onde permaneceu por dois meses aguardando munições do Paraná, que não vieram. Aos poucos, foi formando o seu grupo de comandados que vieram de várias partes da região. Rompendo o famoso “anel de ferro” propagado pelos governistas, rumou com sua recém-formada coluna para o norte até Foz do Iguaçu. Na região sudoeste do estado do Paraná, o grupo se encontrou e juntou-se aos paulistas, formando o contingente rebelde chamado de Coluna Prestes, ou Coluna Miguel Costa-Prestes, com 1 500 homens, que percorreu por dois anos e cinco meses 25 000 km. Em toda esta volta, as baixas foram em torno de 750 homens devido à cólera, à impossibilidade de prosseguir por causa do cansaço e dos poucos cavalos que tinham. Prestes chegou a ser o chefe do Estado-Maior da Coluna e suas habilidades de liderança foram reconhecidas pelos seus subordinados, mas o comandante formalmente era Miguel Costa. Isto provoca polêmicas na historiografia sobre o nome dessa formação militar.
Perseguido e preso durante a ditadura do Estado Novo, Prestes perdeu sua companheira Olga Benário, morta na Alemanha Nazista na câmara de gás, após ser entregue àquele regime pelo governo do presidente Getúlio Vargas. Em 1940 foi condenado a trinta anos de prisão pelo assassinato de Elza Fernandes. Cinco anos depois foi anistiado por Vargas, a quem viria a apoiar na eleição presidencial no Brasil em 1950. Durante a ditadura militar brasileira exilou-se na União Soviética após ter os seus direitos políticos cassados, retornando ao Brasil depois da promulgação da Lei da Anistia em 1979.
Foi secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro de 1943 a 1980, defendendo a revolução comunista até o final da vida. Nos seus últimos anos, assistiu ao processo de abertura econômica iniciado por Mikhail Gorbatchov na União Soviética em 1986 (que em 1991 resultaria na sua dissolução) e também a queda do Muro de Berlim em 1989. Sobre a queda do Muro de Berlim, reagiu: “Eu não sei o que vai acontecer. Mas é lamentável que tudo isso tenha acontecido dessa maneira”.
Enfim, foi um personagem histórico polêmico, mas de cuja grandeza não se pode duvidar.
Leia outras colunas Frente Fria aqui.