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SERGIO-CABECA-COLUNA

Harry Houdini

06/02/2025

houdini

Desde a primeira quinta-feira de 2025, comecei uma série de matérias sobre personalidades meio extravagantes. A primeira foi sobre o oceanólogo Jacques Cousteau e a segunda será sobre Harry Houdini, nome artístico de Ehrich Weisz (Budapeste, 24 de março de 1874 — Detroit, 31 de outubro de 1926), que foi certamente o mais famoso escapologista e ilusionista da história.

Ele primeiro chamou a atenção nos Estados Unidos e, depois, como “Harry ‘Handcuff’ Houdini”, em uma turnê pela Europa, onde desafiou as forças policiais a mantê-lo preso. Logo ele ampliou seu repertório para incluir correntes, cordas penduradas em arranha-céus, camisas de força sob a água e ter que escapar e prender a respiração dentro de uma lata de leite selada com água. Em 1904, milhares de pessoas assistiam enquanto ele tentava escapar de algemas especiais encomendadas pelo Daily Mirror de Londres, mantendo-as em suspense por uma hora. Houdini também fez vários filmes, mas parou de atuar quando não conseguiu mais ganhar dinheiro.

Sua família emigrou para os Estados Unidos, quando Erik Weisz tinha quatro anos, em 1878. Teve uma infância muito pobre, o que o obrigou a trabalhar desde cedo. Era judeu e filho de um rabino conhecido, o Rabino Mayer Samuel Weisz. Foi perfurador de poços, fotógrafo, contorcionista, trapezista. Foi também ferreiro e nesse ofício ele aprendeu os truques que mais tarde o transformariam no maior mágico ilusionista do mundo. Certa vez, seu chefe encarregou-lhe de abrir um par de algemas cuja chave um policial perdera. Após inúmeras tentativas usando serras, Houdini teve a ideia de pinçar a fechadura para abri-la. Ele conseguiu e a maneira como o fez serviu de base para abrir todas as algemas que empregava em seus truques.

Erik começou sua carreira artística em Appleton, no estado do Wisconsin, e já com 9 anos era trapezista nos eventos que seu pai organizava para a congregação. Gostava de ser chamado de “Ehrich, o príncipe do Ar”. Durante sua infância, a situação financeira da família se deteriorava rapidamente, então, o jovem Ehrich, começou a trabalhar. Fazia todo tipo de trabalho, mas entre idas e vindas, nunca deixava de praticar sua paixão pelo trapézio, e logo ensaiava alguns truques de mágica. Em pouco tempo, percebeu que era isso o que queria fazer.

Ehrich já não queria mais ser conhecido como “Ehrich, o filho do rabino” e passou a utilizar o codinome de “Harry Houdini”, em homenagem ao seu mestre, o mágico francês Jean Eugene Robert-Houdin, de quem leu a biografia, onde contava alguns de seus truques. Em 1893 passou a apresentar-se com alguns de seus irmãos, tendo criado um show com o nome de “The Houdini Brothers”.

Durante uma apresentação, Houdini conheceu Bess Rahner, uma jovem americana que passou a ser sua assistente de palco. Bess era uma artista de vaudeville e tornou-se sua maior parceira. Eles se casaram em 1894 e uma de suas primeiras apresentações foi um show de sessões espíritas em que atuavam como médiuns. Com esse ato, ele provavelmente aprendeu o que um médium falso poderia realizar – e no que o público estava disposto a acreditar. Mais tarde, porém, ele viria a se arrepender, pois se envergonhava de ter brincado com a dor das pessoas.

A grande virada de Houdini se deu em 1899, quando conheceu o empresário Martin Beck que ficou impressionado com suas apresentações. E, assim, agregou as apresentações de Houdini às dos grandes mágicos até o início de 1900, quando Houdini voltou para a Europa. Dessa vez, em uma turnê exclusiva. O grande ato de Houdini chamado “Handcuff Act” era ser preso totalmente e livrar-se da caixa de prisão. Esse truque lhe valeu fama e fortuna. Passou em turnê pela Inglaterra, Escócia, Holanda, Alemanha, França e Rússia. Em cada cidade, a polícia local gostava de testá-lo e prendia-o em suas celas. Houdini sempre conseguia escapar.

No começo do século 20, fez grande sucesso na América. Saía de jaulas, causando enorme empolgação na plateia. Em 1912, Houdini chegou ao seu ápice. Conseguiu superar todos seus concorrentes com um ato chamado “Chinese Water Torture Cell”, na qual ele era suspenso pelas pernas dentro de um “aquário” de vidro cheio de água, preso, amarrado e imobilizado. E em instantes deveria soltar-se, o que fazia com grande êxito. Na verdade, Houdini tinha três minutos para sair, se não conseguisse, sua esposa-assistente deveria quebrar o aquário e retirá-lo.

Em 1909, Houdini ficou fascinado com a aviação. Ele comprou um biplano francês Voisin por US$ 5 000 (equivalente a US$ 138 875 em 2020) e contratou um mecânico em tempo integral. Depois de cair uma vez, ele fez seu primeiro voo bem-sucedido em 26 de novembro, em Hamburgo, Alemanha. No ano seguinte, Houdini excursionou pela Austrália. Ele levou seu biplano Voisin com a intenção de ser a primeira pessoa neste país a voar.

Uma demonstração de suas habilidades – a “incrível resistência abdominal” – causou sua morte. Após apresentar o número para uma plateia de estudantes em Montreal, no Canadá, um dos rapazes invadiu os bastidores e sem dar tempo para que Houdini preparasse os músculos, golpeou-lhe o abdômen com três socos. Os violentos golpes romperam-lhe o apêndice e embora com sérias dores, Houdini continuou a viajar sem procurar ajuda médica. Quando Houdini chegou ao Teatro Garrick em Detroit, Michigan, em 24 de outubro de 1926, para o que seria sua última performance pública, estava com febre de 40º C. Ele não se importou e entrou em cena. Durante a apresentação do “Chinese Water Torture”, Houdini não saiu em 3 minutos. Bess Houdini quebrou o vidro e ele estava desacordado. Levado para um hospital, Houdini morreu no Dia das Bruxas, de peritonite, devido à ruptura do apêndice.

Seu funeral realizou-se em 4 de novembro de 1926 em Nova York, com mais de 2 mil pessoas presentes. Membros da sociedade de mágicos americanos compareceram a seu enterro no Cemitério Judaico de Machpelah, no bairro do Queens. Em sua lápide foi afixada a insígnia da sociedade dos mágicos. No dia do aniversário de Houdini, essa sociedade mágica realiza a Cerimônia da Varinha Mágica Quebrada, em sua lembrança. A esposa Bess morreu em 1943 e não pôde ser enterrada com ele por não ser de origem judaica.

Uma de suas facetas mais interessantes foi no papel de desmistificador. Enquanto muitos suspeitavam que suas fugas eram falsas, Houdini se apresentava como o flagelo dos falsos espíritas. Como presidente da Society of American Magicians, ele estava empenhado em manter os padrões profissionais e expor artistas fraudulentos. Ele também foi rápido em processar qualquer um que imitasse suas manobras de fuga.

Numa matéria para National Geographic, escrita por Parissa Djangi e publicada em 27 de outubro de 2023, ficamos sabendo que:

“Como ilusionista, Harry Houdini acreditava que todo truque tinha uma explicação. E sua experiência no show business lhe ensinou que a maioria dos médiuns, especialmente os que usavam adereços, não passava de trapaceiros. No entanto, ele flertava com a ideia de que poderia haver forças místicas invisíveis no mundo.

“Após a morte de seu pai, em 1892, ele acompanhou a mãe indo a médiuns. Embora ela esperasse fervorosamente que eles entrassem em contato com seu falecido marido, isso nunca aconteceu. Decepcionado, Houdini não se impressionou com todos eles.

“Em 1913, Houdini experimentou a pior dor de sua vida quando sua mãe morreu. Mais tarde, ele escreveria: “Eu também teria me separado de bom grado de uma grande parte de minhas posses terrenas pelo consolo de uma palavra de minha amada falecida”. Infelizmente, ele nunca encontrou o consolo que buscava e lamentou a morte dela pelo resto da vida.

“Logo depois que Houdini mergulhou no luto, o mundo mergulhou na guerra. Quando a Primeira Guerra Mundial terminou, em 1918, milhões de pessoas haviam se voltado para o espiritismo – uma religião que acredita que os espíritos são acessíveis – como um bálsamo para a perda em massa.

“O amigo de Houdini, Sir Arthur Conan Doyle, criador de Sherlock Holmes, foi um deles. O espiritismo o confortou após a perda de seu filho Kingsley, que morreu poucas semanas antes do fim da guerra.

“Embora fascinado pelo espiritismo, Houdini não compartilhava da fé de seu amigo. Mesmo assim, Doyle convenceu Houdini a se sentar com médiuns, mas essas sessões apenas fizeram com que o ilusionista duvidasse ainda mais de que tais pessoas tinham dons extraordinários.

“E assim Houdini encontrou uma nova linha de trabalho: expor médiuns fraudulentos. Afinal de contas, Harry Houdini conhecia todos os truques. Como mágico profissional, ele conseguia detectar truques de mágica que outros não percebiam.

“Houdini começou a desmascarar os médiuns que usavam truques, um após o outro. Em 1923, ele demonstrou que George Valiantine usava fiação elétrica para dar a ilusão de que um trompete flutuava durante as sessões. Outro médium, Nino Pecoraro, não conseguiu produzir nenhum dos fenômenos estranhos pelos quais era conhecido depois que Houdini o amarrou antes de uma sessão.

“Ele até atacou fotógrafos de espíritos como Alexander Martin, cujas fotos supostamente mostravam fantasmas que o olho nu não conseguia ver. Houdini se sentou para tirar uma foto e ficou cético quando a foto de Martin incluía uma aparição surpresa: Theodore Roosevelt, que havia morrido quatro anos antes. Houdini apontou que a fotografia provavelmente não passava de uma exposição dupla.

“Em 1922, a revista científica norte-americana Scientific American lançou o desafio. Qualquer médium que demonstrasse habilidades paranormais sob rigoroso exame poderia ganhar um prêmio de US$2.500. Entre aqueles que disputaram o prêmio em 1924 estava a socialite de Boston Mina Crandon.

“Crandon alegava canalizar o espírito de seu falecido irmão Walter, cujo comportamento grosseiro e agressivo contrastava com o charme de Crandon. As mesas pareciam levitar durante suas sessões, e um sino em uma caixa tocava mesmo quando ninguém mexia nele. Suas habilidades aparentes conquistaram admiradores, inclusive pesquisadores que acreditavam que ela falava a verdade.

“Houdini permaneceu cético. Quando participou de uma sessão como parte do exame da Scientific American, o mágico afirmou ter desvendado o mistério do sino de Crandon. Ela simplesmente o tocava com os pés, disse ele, depois de senti-los roçar em suas pernas. No final das contas, Houdini encontrou muitas evidências de truques e nenhuma de habilidades fantasmagóricas. A Scientific American acabou concordando, e Crandon ficou de mãos vazias.

“A cruzada de Houdini contra a mediunidade fraudulenta lhe rendeu muitos inimigos, inclusive seu antigo amigo Sir Arthur Conan Doyle. Os médiuns e seus associados também foram à imprensa para condenar o ilusionista. Alguns até previram sua morte.

“É verdade que o mestre do escapismo não conseguiu escapar da morte. No entanto, Harry Houdini não morreu de uma maldição mágica. Em vez disso, um apêndice estourado o matou em 31 de outubro de 1926.

“Enquanto Bess sofria, ela esperava testemunhar o último truque do marido: um contato de além-túmulo. Antes da morte de Houdini, eles haviam decidido fazer um teste final para os médiuns, escolhendo um código secreto que um médium precisaria dizer para ser considerado legítimo. Ele se traduzia em “Rosabelle, believe” (“Rosabela, acredite”), fazendo referência a uma música da juventude do mágico.

“Durante dez anos, Bess Houdini visitou médiuns na esperança de que um deles entregasse o código. O médium Arthur Ford o decifrou em 1929, mas provavelmente não por meios paranormais. Ele provavelmente descobriu a frase em uma biografia de Houdini.

“E assim, na noite de Halloween de 1936, Bess organizou o que seria a última sessão espírita. De forma apropriada, ela teve o ar de um espetáculo, com convites, música e uma gravação para registrar o evento. Mas, após uma hora de invocação do fantasma do ilusionista, houve apenas silêncio. Harry Houdini havia perdido sua última deixa.”

Esta biografia impressionante inspirou minha banda Orquestra Sem Fim a compor uma música chamada justamente de “Houdini”:

HOUDINI

(Rodrigo Barros, Marcelo Sandmann e Sérgio Viralobos)

Se você quer saber

Aqui não tem mais nada

Eu quero ir além

Pra lá do fim da estrada

Eu vou fugir de mim

Talvez desapareça

Tá tudo tão ruim

Quem sabe até mereça

Amarrado pelas pernas

Hei, Houdini!

Aqui num cofre no fundo do mar

Hei, Houdini!

É o destino que me resta

Hei, Houdini!

Se eu fosse Houdini eu iria escapar

 

Veja o vídeo da música aqui.

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