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GENNARO-CABECA-COLUNA

Antonina (PR)

21/02/2025

Lá vem o trem. Lá vem o trem! Aos berros , o encarregado dos serviços da RVPRSC chama a atenção de todos na plataforma da estação ferroviária.

Quepe e uniforme azulados, inspiram respeito da população presente.

Ele ajeita o quepe e a gravatinha. Olha galantemente para o público feminino. Sorri.

Apinhada de gente, a plataforma está ainda mais quente sob o sol do meio dia.

Com suas esposas e familiares o prefeito, vereadores, delegado de Polícia, o Juiz de Direito, cartorários e serventuários da Justiça acotovelam-se pelo melhor lugar.

Abrem caminho para o Monsenhor Pároco da Matriz. Este aproxima-se, paramentado e ladeado por seus dois coroinhas. Dezenas de jovens estudantes das escolas primárias e secundárias ali estão perfilados e agitando bandeirinhas de papel em suas mãos.

Todos os presentes com os rostos brilhantes e suarentos. Sob intenso calor.

A locomotiva parou. Os viajantes emergem dos vagões. Espoucam rojões e foguetórios.

O governador do Estado chegou a cidade!

Sua comitiva perfila-se para os cumprimentos de praxe. A famosa banda inicia a execução do Hino Estadual. Apupos e júbilos dos recepcionistas oficiais.

O som alegre da banda chega ao final.

Entrecortado por vaias e gritos de protestos vindo dos trabalhadores do Porto.

Ali do lado oposto da plataforma da estação.

Exibem seus cartazes e faixas de protestos.

Organizados pelo Sindicato dos Portuários de Antonina e Paranaguá, filiado ao Partido Comunista Brasileiro.

Pedem melhores salários para os trabalhadores da Matarazzo e demais categorias. Ameaçam a não desembarcar o trigo argentino dos navios.

Logo uma guarnição da Polícia Militar os dispersará com alguns feridos a cassetadas.

Os portuários não reagem e se retirarão doloridos e lamuriosos.

E a comitiva do governador estará a salvo dentro dos carros oficiais da Prefeitura e alguns carros de praça. O governador e a comitiva seguem para o hotel.

Precisa fazer sua higiene pessoal. Esticar as pernas após um banho refrescante.

Em meia hora virão lhe buscar para o almoço no clube mais importante da cidade. Sua agenda do dia seguinte lhe impõe o pernoite em Antonina.

Discursos, réplicas e tréplicas lhe aguardam. O governador seria o ilustre forasteiro nesta cidade histórica do litoral paranaense.

Na cidade, uma brisa leve se transforma em vento mais intenso. Talvez chova a tarde.

As crianças já dispensadas das solenidades cívicas. Trocam seus uniformes e, após rápida refeição familiar, vão brincar na praça principal.

Ali, na declividade próxima a Igreja Matriz, erguem-se frondosas árvores.

Jardins e curvas em pedras oferecem rosas, jasmins e outras belas flores e cores ao entorno.

Com o vento soprando as crianças lembram-se de buscar em suas casas suas pipas, pandorgas, ou papagaios…feitos de papel e cola.

Envergados nos filetes de bambus.

Amarrados com linhas de corte e costura, as chamadas 24, as mais fortes enroladas em carreteis de madeira. São distanciadas e soltas dos carretéis e com o empuxo do vento e as hábeis mãos das crianças, as pipas vão subindo. Empinadas. Ganhando altura.

Para esses corações que saltitam, pulam e gritam de alegria primaveril.

Ali está o menino Sylvio Back e seu amigo. Livres e saudáveis nesta Praça de Antonina. Crianças paranaenses no pós-guerra. Final dos anos 40. Empinando pipas.

Defronte ao edificio art noveau na esquina da praça. Minha humilde ficção em traços e aquarela.

Ao longo das décadas Sylvio Back deixará fisicamente Antonina.

Percorrerá o Brasil. O mundo. Com suas artes.

O requintado hotel de seus familiares não será preservado e ou tombado pelo Patrimônio Histórico Paranaense.

O IPHAN estará também alheio. Porém a memória de Antonina permanecerá.

Em sua monumental obra. Composta por literatura. Poesia. E documental.

Sua obra cinematográfica que manterá em alta qualidade e primor ao longo de décadas.

Todos nós paranaenses algo especial devemos ao Sylvio Back. Hoje com 87 anos.

Bem humorado, já a nos convidar para seu centésimo aniversário. Talvez a ser comemorado no “Caçarola do Joca”.

Um menino talentoso, nascido em Blumenau (SC), mas também de Antonina e de Curitiba. Jóia rara do Paraná e de Santa Catarina!

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