O publicitário Washington Olivetto costumava dizer que falava cinco línguas, todas perfeitamente mal. É uma verdade para a maioria dos brasileiros, de resto monoglotas de carteirinha, a começar pelo pai do chapeiro.
Certa noite, em Paris, fomos jantar na casa de um fotógrafo que havia morado no Brasil. A mãe dele falava apenas francês. Entre os outros convidados estava um casal suíço de cantão italiano e um executivo sueco.
Foi uma noite memorável, em que derrubamos incontáveis garrafas de variados vinhos, dos espumantes, passando pelos brancos e tintos até encerrar com um porto. Na trôpega caminhada de volta ao hotel, perguntei para a Tânia:
– Que língua falamos?
– Todas, ela respondeu com inegável sarcasmo.
A preponderância da língua inglesa nas viagens pelo mundo leva muita gente a cometer antológicas barbaridades. Já ouvi um sujeito dizer ao garçom “I am a salad” para expressar sua vontade de mastigar umas folhas. Outro esclareceu que seu resfriado era resultado da mudança do tempo: “Changed the time here”, explicou.
Quem tem um mínimo de conhecimento das línguas latinas é capaz de se comunicar em castelhano, italiano e francês, ainda que às custas de muitos vexames. Uma vez meu amigo Hermann atrapalhou-se com a pergunta de um garçom em Nice, interessado em saber que tipo de vinho ele iria beber. “Mouche”, respondeu. O rapaz escangalhou-se de rir. Mouche é mosca – como o idiota do Hermann deveria saber antes de pedir o inseto para beber. O vinho tinto é rouge, et pour cause.
A proximidade dos idiomas com o português permite até que nos arrisquemos em dialetos. O papiamento falado no Caribe, parece um português acaipirado. O humorista Marcelo Adnet fala papiamento com perfeição. Em Curaçao é possível entender o que dizem até em programas de TV. Bon bini a você, portanto. Ou seja, bem-vindo.
Durante uma viagem pela Itália, liguei para o Hotel Europa em Veneza, procurando um apartamento para dali a alguns dias. Do outro lado atendeu um simpático senhor, Aldo, especialista em esticar conversa, como logo descobri.
Enquanto vasculhava a relação de reservas para ver se havia o quarto vago, ele me perguntou se eu era executivo de alguma empresa.
– No, io sono solo un povero turista brasiliano – arrisquei no meu perfeito italiano da periferia de Curitiba.
O veneziano respondeu da forma adequada, com aquela ironia típica dos seus conterrâneos:
– Non bisogna parlare, signore. Io lo sento.
Por baixo do falso verniz que procurei vender, ele sentia o farsante que eu era, poliglota da escola de Washington Olivetto.
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