O dólar à vista fechou perto da estabilidade nesta segunda-feira (22), com leve indicação de baixa, depois de um dia quase inteiro em alta. O fluxo positivo foi novamente apontado como o motivo da virada, que já havia sido ensaiada no período da manhã. À tarde, nem mesmo a aceleração das perdas das bolsas de Nova York foi suficiente para trazer as cotações de volta ao terreno positivo.
No mercado à vista, o dólar fechou cotado a R$ 5,1665, em baixa de 0,03%. No mercado futuro, a divisa com vencimento em setembro era negociada a R$ 5,1840 às 17h21, em baixa de 0,09%. O Dollar Index (DXY), que mede a variação do dólar ante uma cesta de seis divisas fortes, avançava 0,72% no mesmo horário.
No centro das atenções no mercado internacional estiveram ainda as dúvidas sobre a condução da política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano). A questão é saber se no importante seminário de Jackson Hole os dirigentes do Fed e o presidente da Instituição, Jerome Powell, vão imprimir um tom mais ‘hawkish’ aos seus discursos.
Para Mauriciano Cavalcanti, diretor da corretora Ourominas, a atratividade do mercado brasileiro se assenta na combinação entre deflação e juros altos no Brasil, que leva o investidor estrangeiro a buscar o Brasil. “Com os juros elevados e a deflação que estamos tendo por aqui, o investidor estrangeiro arrisca um pouco mais com o Brasil do que com outros países. O país está bem cotado para investimentos externos”, afirma.
Na avaliação de André Rolha, diretor de Produtos da Venice Investimentos, o real tem se mostrado mais “protegido” das intempéries do cenário internacional por conta de fatores domésticos.
Entre esses fatores, ele cita o aperto monetário antes de outros países, a redução da dívida pública e o bom desempenho da balança comercial. “Como o nosso BC foi assertivo na política monetária, há maior confiança por parte do investidor e é possível que o Brasil comece a reduzir juros quando outros países estiverem ainda elevando”, afirmou.
Taxas de juros
Os juros terminaram a sessão regular perto da estabilidade, confirmando no fechamento o que foi a tônica da segunda-feira, alternando viés de alta e de baixa sempre ao redor dos ajustes anteriores. O ambiente externo trouxe alguma cautela para o mercado brasileiro, mas tanto juros quanto câmbio estiveram relativamente bem comportados.
Lá fora, o risco dos apertos monetários em curso deprimir a atividade global continuou penalizando ações e fortalecendo o dólar, embora no Brasil o real tenha sido protegido pela entrada de fluxo, o que ajudou a ancorar a curva, considerando que os retornos dos Treasuries subiram.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2023 fechou em 13,73%, estável ante o ajuste de sexta-feira, e a do DI para janeiro de 2024 encerrou em 13,15%, também a mesma taxa do ajuste anterior. O DI para janeiro de 2025 terminou com taxa de 12,09%, de 12,12%, e a do DI para janeiro de 2027 passou de 11,82% para 11,83%.
Antes de se estabilizarem nesta segunda-feira, as taxas vinham de uma sequência de quatro altas, pressionadas basicamente pelo risco externo, uma vez que uma ação excessiva dos bancos centrais pode resultar em recessão nas economias principais, o que afetaria a saúde também dos emergentes. Há que se considerar ainda o movimento de baixa forte nos DIs nas primeiras semanas de agosto, que deixou o caminho livre para a recomposição dos prêmios. Mas, como a agenda desta segunda nem aqui nem no exterior trouxe gatilhos para os negócios, a trajetória altista acabou perdendo fôlego.
Os mercados lá fora continuaram tentando antecipar uma mensagem mais hawkish vinda de Jackson Hole, onde o simpósio dos banqueiros centrais começa na quinta-feira, com o discurso do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, previsto para sexta.
“Hoje foi mais do mesmo: uma correção dos padrões de preços que vinham sendo praticados depois dos discursos de dirigentes do Fed terem ajustado a percepção dovish dos mercados sobre a política monetária”, resumiu o operador de renda fixa da Nova Futura Investimentos André Alírio. Ele ressalta o desafio das autoridades monetárias em causar o menor dano possível às economias no combate à inflação. “Estão caminhando por uma linha bastante tênue”, disse.
Diante da ênfase que o Fed vem dando à necessidade de recolocar a inflação na meta de 2% e que os EUA têm condições de suportar o nível de ajuste pretendido no juro, os yields dos Treasuries avançaram. A probabilidade de aumento de 75 pontos-base nos juros básicos voltou a ser majoritária para a reunião de setembro, segundo a CME FedWatch Tool.
Não à toa, na reunião da manhã entre diretores do Banco Central e economistas, o ponto central foi cenário internacional, com os analistas destacando a perspectiva de recessão nos Estados Unidos e os seus efeitos sobre preços de commodities, além da inflação e da atividade econômica no Brasil, especialmente em 2023.
A mediana das expectativas para o IPCA do ano que vem caiu pela primeira vez no Boletim Focus desta segunda depois de 19 semanas em alta, de 5,38% para 5,33%. Mas, como segue bem acima do teto da meta de 4,75%, não teve grande impacto na curva nesta segunda-feira.
Bolsa
Acompanhando mais uma vez o mau humor externo, o Ibovespa estendeu correção pelo segundo dia, após ter fechado a sexta-feira com perda de 2,04% na sessão. Nesta segunda-feira, a referência da B3 cedeu 0,89%, aos 110.500,53 pontos, entre mínima de 109.858,38 e máxima de 111.486,78 pontos, correspondente à abertura. O giro financeiro ficou em R$ 25,8 bilhões nesta segunda-feira. Após ter chegado a subir mais de 10% no mês, o Ibovespa apara os ganhos de agosto a 7,11%, ainda avançando 5,42% no ano.
“Começamos a semana de Jackson Hole e os mercados estão bastante cautelosos, para não dizer que desfazendo o grande rali de julho e agosto, de recuperação, onde o S&P 500 voltou para o patamar da média móvel de 200 dias nesses últimos dois meses. Fica sempre a dúvida se foi um ‘bear market rally’ recuperação ante um grau acentuado de correção que o distanciou do nível recorde mais recente, se o índice vai desfazer tudo ou se vai consolidar e continuar subindo”, diz Paulo Gala, economista-chefe do Banco Master, chamando atenção também para dados importantes na semana, como o PCE, métrica preferida do Federal Reserve para a inflação ao consumidor nos EUA, e o IPCA-15, no Brasil.
Em Nova York, uma série de ações participou da recente recuperação do mercado, tipicamente um sinal encorajador quanto à durabilidade de um rali. O S&P 500 subiu 15% em relação à mínima de 2022 em meados de junho, com todos os 11 setores do benchmark avançando na passagem para o terceiro trimestre. Dezenas de ações estabeleceram novas máximas de 52 semanas na semana passada, de acordo com relato da Dow Jones Newswires.
Na B3, vindo de um rali desde as mínimas de meados de julho, o ajuste, como na sexta-feira, espalhou-se pelos setores e ações de maior liquidez, mas desta vez Petrobras fez uma pausa na correção, após ter fechado a sessão anterior em queda de 4,07% (ON) e 5,06% (PN) – nesta segunda, subiram respectivamente 1,59% e 2,14%. Vale ON cedeu 1,46% nesta segunda-feira e as perdas entre as ações de grandes bancos chegaram a 1,38% (Bradesco PN), à exceção de BB ON (+1,02%), que esteve entre as maiores realizações de lucro no setor na sexta-feira.
“Houve uma recuperação forte, dos 96 aos 113 mil pontos, e é natural vir uma realização, que já era esperada para a semana passada. Considerando a mínima de onde saiu em julho, se corrigir uns 5% agora é uma realização natural. Está dentro do preço”, diz José Simão, sócio e head de renda variável da Legend Investimentos, antecipando mais algumas sessões de realização ou lateralização do Ibovespa, antes de o índice retomar a trajetória ascendente.
“Com o grau de desconto que havia e a temporada de resultados trimestrais – números, em geral, em linha ou acima do esperado – não está tão fácil para o Ibovespa cair muito. Mas Estados Unidos, China, Europa estão crescendo menos, diferente da situação aqui, em que as projeções de PIB tiveram recuperação. Ainda assim, não há como caminhar sozinho, indiferente ao que está acontecendo fora”, observa Simão.
Ele espera “tom duro” do Federal Reserve no evento anual de Jackson Hole, no fim desta semana, sinalizando novo aumento de 75 pontos-base para a taxa de juros de referência dos Estados Unidos em setembro. “Tem que remar para trazer a inflação de 8,5% para 4% e depois 2% ao ano”, acrescenta o gestor, apontando que o Fed ainda tem trabalho adiante para desfazer a percepção de que continua “atrás da curva”.
“Houve otimismo no mercado desde recentes leituras sobre a inflação ao consumidor e ao produtor nos Estados Unidos, mais baixas, e agora vem uma certa correção de expectativas, na medida em que os problemas estão longe de se dissiparem”, diz o sócio da Legend, destacando também outras questões que têm emergido, com efeito sobre a economia global, como a seca na China.
Preocupações com a demanda no gigante asiático e interrupções de produção em siderúrgicas devido a fortes ondas de calor por lá pressionaram em especial as commodities metálicas nesta segunda-feira, aponta Pedro Galdi, analista da Mirae Asset. “As altas temperaturas tendem a atrapalhar a economia do país. Além de hoje ser sell-off global em renda variável”, acrescenta. Destaque para queda de 3,32% em CSN ON e de 2,49% para Gerdau PN
Na ponta perdedora do Ibovespa nesta segunda-feira, Petz (-7,07%), Méliuz (-4,84%), Embraer (-4,66%) e Hapvida (-4,57%), com Americanas (+22,49%), Petrobras PN (+2,14%), Positivo (+2,12%) e Cielo (+2,01%) no lado oposto.
(Estadão Conteúdo)