Um rapaz de 26 anos, de cabelos revoltos, calça jeans e camiseta Hering, vai à Delegacia de Ordem Política e Social, o temível DOPS, solicitar um visto de saída para a Argentina. Era o documento necessário para viagens aos países do Cone Sul.
A burocracia demonstrou toda a sua má vontade, exigiu certificado do serviço militar, declaração da justiça eleitoral, comprovante de residência, diploma de conclusão de sabe-se lá qual curso.
O jovem rebelde consultou sua namorada, ela também pouco afeita às formalidades do governo fardado, e resolveram viajar para a lua de mel sem os papéis exigidos.
Cruzaram de balsa a fronteira em Foz do Iguaçu para tomar um avião direto ao Aeroparque, quase no centro da capital argentina.
Visitas aos locais turísticos, deslocamentos de metrô, noite de tangos e vinhos, tudo o que se recomenda a uma primeira visita a Buenos Aires fez parte da agenda.
Então chegou o dia 1º de maio, com aglomeração monstro em torno da Plaza de Mayo. Tambores peronistas davam o tom para as palavras de ordem. E deu-se que a segurança determinou a separação do casal:
– Los hombres por la calle, las damas por la vereda.
Por alguns minutos perderam-se um do outro, até ele vislumbrar a moça baixinha de roupa colorida em meio a um mar de damas. Resgatou-a, assistiram uma parte do pronunciamento da presidente da República e voltaram ao hotel.
A tensão deve ter sido grande, porque ela queixou-se de cólicas: era uma menstruação não programada, tanto que a moça imprevidente se viu sem absorventes. E ordenou a seu recente marido, sem a menor experiência no ramo, que procurasse o produto em alguma farmácia ou loja, fosse em Buenos Aires ou na Patagônia, mas que não voltasse sem o artigo salvador.
Sua timidez não o deixou perguntar a ninguém. O, digamos assim, remédio foi andar um bom tempo até encontrar uma velha farmácia:
– Señor, yo necesito uno de esos absorvientes para las damas…
– Si, Moddess, ele interrompeu, evitando a sequência tenebrosa daquele portunhol de analfabeto. “Que tipo quieres?”
– Uno de tipo general.
– Qué, general, hombre! General es tu presidente, tenemos Moddess largos, medios o pequeños, pero no generales.
– Entonces uno de los medios.
Todo faceiro, o pacote embaixo do braço, ele voltou ao hotel. Pelo menos o Modess não era clandestino, a generala com quem havia casado não teria razões para reclamar.
PS: Quando o Moddess foi lançado no Brasil, a propaganda trazia a atriz Marília Pêra demonstrando como usar o produto. Houve, nos meios conservadores, quem considerasse aquilo uma demonstração das táticas comunistas para destruir a família brasileira, ao retirar a mulher do pedestal em que deveria ficar, como símbolo maior da união familiar. Como se vê, a idiotice é mestra em garimpar argumentos em qualquer plano.