HojePR

Um verdadeiro chato não tem preço

18/10/2022
chato

O escritor Guilherme Figueiredo, irmão do último general-presidente, foi autor do Tratado Geral dos Chatos, obra clássica sobre a personalidade dessas pessoas especializadas em aborrecer a paciência alheia. Deveria estar disponível em todos os locais, públicos e privados, apto a ser consultado a qualquer tempo. Talvez funcionasse como uma espécie de vacina, mas já me dou conta que um sujeito é considerado chato por não possuir o instrumento chamado desconfiômetro. Logo, não iria surtir efeito.

Esta figura imorredoura, eis que o chato é parte integrante da humanidade desde os primórdios, assume os mais variados tipos. Começo por aquele que puxa o interlocutor pela manga, como se o argumento que desfia necessite do braço alheio. Ele tem um irmão gêmeo, que fala limpando a lapela do pobre ouvinte, a deixar claro que você não passa de uma pessoa sem higiene, circulando em público com vestígios desabonadores.

Ambos podem também atacá-lo pelas costas, cutucando suas espáduas e, pior, cobrindo seus olhos com mãos gordurentas – uma característica do chato é a mão engordurada. Tais gestos são complementados pela pergunta inevitável: “Adivinhe quem é”?

Outro tipo é o que vai perguntando:

– Você não lembra de mim, não é?

Fica claro que você não lembra, mas o chato também não facilita:

– São Paulo, 1998, diz algo para você?

Dá vontade de responder: “Não me diz nada, rapaz. Felizmente, nada”.

Outra característica dos chatos é o enorme volume de perdigotos que expelem. Aconselha-se aos incautos o uso de máscara ou até de guarda-chuva, dependendo da vazão daquele chuveiro salival.

Chato é o sujeito que liga de um telefone desconhecido, não diz quem é e vai logo afirmando:

– Se soubesse que era eu, você nem tinha atendido. Hahaha!

Eles incorporam dezenas de formas. Quem nunca teve pela frente um chato catedrático, que tudo sabe e tudo explica:

– Sabe quem foram os Voluntários da Pátria?

Coitado de você se disser não. Mas se disser sim, também não estará livre do chato enciclopédico. Ele corrige a informação, acrescenta detalhes e, não raro, pergunta se você entendeu. A propósito, esse é outro tipo muito comum, o que termina todas as frases querendo saber se você não é um idiota e foi capaz de captar as verdades ditas por ele. Alguns, mais verborrágicos, estendem a pergunta:

– Você está me entendendo? – com as sílabas escandidas para ter certeza da sua parca inteligência.

Um dicionário próprio a essa categoria de pessoas incluiria o chato abraçador e o beijador, ambos parte do tipo genérico “pretenso pegador”.

Há ainda o egocêntrico, cujos argumentos são sempre baseados na própria experiência. O numerólogo, que corrige até as casas decimais e acusa você de imprecisão:

– Não é 34,25%. O correto é 34,26%.

Também não esqueçamos do que faz pegadinhas verbais. E o repetitivo, tipo já tomado pela senilidade, sempre apto a contar diversas vezes a mesma história. Se ele disser “não sei se já te contei”, pode ficar certo que já, e não foi uma vez só.

Chatos exigem dose redobrada de paciência e resignação. Fique certo que ninguém está a salvo deles, porque um verdadeiro chato tem o dom da ubiquidade: está em todos os lugares, vo-cê es-tá me en-ten-den-do?

Deixe seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *