Em um grupo de psicologia de uma Universidade em Salvador, universitários questionam as notícias dos ataques que aconteceram nas escolas nos últimos dias e alertam uns aos outros sobre os perigos que os cercam, sobretudo um possível ataque que poderia acontecer no dia 20 de abril de 2023, data em que se completam 24 anos do massacre em Columbine, Colorado, nos Estados Unidos. Recrutados através das redes sociais, adolescentes com comportamentos agressivos, incitam a violência utilizando discursos de ódio extremistas como justificativa para tais atitudes.
Segundo o jornal Estado de Minas, “O TikTok retirou do ar, nesta segunda-feira (10/04), o vídeo publicado neste fim de semana por um usuário do aplicativo com ameaça de ataques a diversas escolas do país, 35 só em Minas Gerais.” Relatos como este se espalharam na última semana, anunciando supostos ataques que aconteceriam nas escolas, e em alguns estados – como o exemplo do Paraná – notícias falsas foram desmentidas a esse respeito. Em menos de um mês, o ataque de Realengo que antes era um acontecimento isolado em nosso território nacional, tornou-se um entre vários casos que geram extrema preocupação para nossa sociedade.
O pedagogo francês especialista em violência nas escolas Éric Debarbieux, diz em um dos seus livros que “pequenos grandes atos de violência simbólica e física, como a intimidação de alunos e professores, o desrespeito à diversidade e a força de estereótipos e preconceitos, tornam insuportável a vida de muitos membros das escolas, cotidianamente, num processo surdo, que não chega a ser captado pela comunicação da massa”. Isso nos faz refletir sobre a violência que acontece desde sempre nas escolas, envolvendo racismo, discursos misóginos e outras formas de preconceito, e que nossa educação não prepara o sujeito para viver em sociedade e respeitar as diferenças. O psicólogo Peter Langman, especialista nos estudos de massacres nos Estados Unidos, discorre em um dos seus livros sobre o “efeito de contágio” e o “efeito de imitação”, explicando como um ataque tem influência sobre o outro, podendo ser idêntico ou não e nem sempre utilizando a mesma motivação. Isso poderia explicar os ataques recorrentes e as manifestações violentas nas redes sociais que tem acontecido em nosso país nos últimos dias. Telma Vinha, coordenadora de uma pesquisa recente realizada pela Unicamp, verificou que é comum entre os autores dos ataques, a existência de transtornos mentais não diagnosticados ou sem devido acompanhamento. Essa perspectiva nos leva a considerar que a violência reproduzida por estes jovens, foi gerada a partir dos seus universos psicológicos, utilizando seu sofrimento da maneira mais cruel possível.
Considerando a violência reproduzida por jovens e adolescentes, um relatório recente da Associação Americana de Psicologia, afirmou que videogames violentos estão relacionados ao aumento do seu comportamento agressivo. No entanto, não há provas que associam os jogos à violência criminal. Este assunto ainda é controverso, mas relevante e provoca um alerta, visto que o videogame pode ser um espaço de fuga muitas vezes sem ética, onde os adolescentes criam relações. Muitos destes jovens não são populares na escola, vivem processos violentos em casa, têm baixa autoestima e ao se conectarem com um grupo no ambiente virtual, passam a sentir-se pertencentes a algo. O Mestre em Linguagem e Tecnologias Luiz de Lima, comenta “que videogames são símbolos das novas relações sociais e de poder mundial a partir das quais se estabelece a noção hegemônica de globalização”.
Vivenciamos a era da inteligência artificial, seus avatares, ChatGTP e outros, no pós pandemia. Associar esse cenário a lares instáveis, violência doméstica, pressões para se encaixar em um grupo, bullying e problemas relacionados à saúde mental, pode gerar em nossos jovens uma ruptura com a realidade? Antes de fazerem vítimas, será que esses adolescentes também foram vítimas da sociedade? Independente destas respostas, diante do cenário que vivenciamos atualmente, é imprescindível a construção de uma Psicologia Social nas escolas, discutindo em sala de aula assuntos como este, com o objetivo de conscientizar os estudantes sobre situações de violência, implementando políticas anti-bullying, disponibilizando profissionais da saúde mental para desenvolver autoestima positiva nos alunos em sofrimento, além de mediar conflitos entre os mesmos, para que suas questões sejam resolvidas e não evoluam para um comportamento agressivo.
Os pais devem ficar atentos e conversar com os filhos sobre as consequências de atos como incitação à violência, disseminação de notícias falsas e permitir que haja participação ativa dos filhos em discussões relacionadas ao preconceito. Deve-se observar mudanças no comportamento dos jovens e fornecer alternativas de entretenimento mais saudáveis, incluindo atividades culturais e físicas. Ao desconfiar de algo, utilize o canal de denúncias que o Ministério da Justiça criou para o recebimento de informações de ameaças e ataques contra as escolas: https://www.gov.br/mj/pt-br/escolasegura. A negligência pode acabar com o futuro dos jovens!
Referências:
Ministério da Justiça e Segurança Pública. Canal de denúncias Escola Segura. Gov.br, 07 abr 2023. Disponível aqui. Acesso em 11 abr 2023.
Langman, Peter. School Shooters: Understanding High School, College, and Adult Perpetrators. Estados Unidos: Rowman & Littlefield Publishers, 2017.
TikTok tira do ar vídeo da ‘Lista do Massacre’ nas escolas. Estado de Minas Gerais, 10 abr 2023. Disponível aqui. Acesso em 11 abr 2023.
Derbarbieux, Éric. Desafios e Alternativas: Violência nas Escolas. Brasília: UNESCO, 2003.
Games violentos podem estimular a agressividade. Revista Veja, 20 ago 2015. Disponível aqui. Acesso em 11 abr 2023.
Lima, L.H.M.X. Virando o jogo: uma análise de videogames através de um olhar discursivo crítico. Dissertação. Campinas, Universidade Estadual de Campinas, 2008.
Vilalba, Théssie N. B. Violência simbólica, educação e psicologia sócio-histórica em movimento aos massacres escolares. UFGD, 24 mar 2020. Disponível aqui. Acesso em 11 abr 2023.
Rodrigues, Léo. Crescem casos de ataques em escolas: especialistas dizem o que fazer. Agência Brasil, 07 abr 2023. Disponível aqui. <> Acesso em 11 abr 2023.
Leia outras colunas da Hag Schultz aqui.