“As flores são a marca da Primavera. Não há no mundo melhor sinal de renovação, despertar e renascimento. Os recentes rebentos em botão, sejam eles de violeta, campânula ou açafrão, forçam o caminho para cima, mesmo através da terra compacta e das neves tardias do final do Inverno”. (“O livro dos símbolos: reflexões sobre imagens arquetípicas”, Ed.Taschen, 2012.) E da fecunda terra da poesia, brota Tagore, com “O Jardineiro” (tradução de Guilherme de Almeida, Ed. José Olímpio, 1950) e sua simbólica flor do mundo trazendo a dor:
“Eu colhi a tua flor, ó Mundo!
Cheguei-a muito ao meu coração: e o seu espinho feriu-me.
Quando o dia declinou, sombrio, a flor murchou: mas a dor ficou.
Muitas flores terás ainda, perfumadas e gloriosas, ó Mundo!
Mas para mim já passou a hora de colher flores. E já não tenho a minha rosa, na noite profunda que vem: tenho apenas a dor que ficou”.
(foto: Haygraphiks)
Nas artes visuais, as flores, muito presentes, além de seus significados, cores e formas, foram sinônimo de beleza e tiveram lugar de prestígio. Na arte ingênua, muitas vezes conhecida como primitiva, apresentam-se majestosas como em “Paisagem”, de Ivan Rabuzin, 1960, e em Rousseau, sempre fantásticas. Chagall, um de meus artistas favoritos, desde a infância, elas muitas vezes aparecem nas laterais das obras, nas roupas e, outras vezes, como assunto principal – vasos e buquês sempre brilharam. No impressionismo, Monet usou e abusou delas! Já os modernos e contemporâneos andaram “de nariz virado” para as flores. O abstracionismo ocupou um lugar importante nas artes e, assim como as flores, a beleza em sua forma mais anatômica esteve em baixa. Os temas sociais e de denúncia, a verdade nua e crua foram ganhando mais espaço (não que não tivessem estado presentes em tempos anteriores).
De minha parte, as flores estiveram sempre presentes. Quer nos jardins, nos bordados de minha mãe, nos vasos dentro de casa – uma mesa sem flores parece sempre incompleta. Nas minhas esculturas, a começar pelas máscaras, tiveram lugar de grande relevância. Na mostra individual “Estrela da Terra”, realizada na Casa João Turim, em 2001, foram as estrelas: moldadas em bronze com bases de granito formaram um jardim de flores inventadas. Em “Prá esperar o amor”, coleção lançada em 1997 no Museu da PUC, foram feitas em resina vermelha e alumínio e falaram do amor. Mais tarde, em 2007, nos jardins do Museu Oscar Niemeyer, a coleção “In Natura” apresentava flores de vidro, nas “Árvores das estações”, em 2019, nos espaços abertos e galerias da Funarte, em São Paulo, na companhia de pássaros, peixes e estrelas marcaram presença na “Árvore das flores”, na “Ponte” e no “Portal da primavera”, dessa vez, todas em puro aço.
Painel em alumínio fundido (Elizabeth Titton)
Para fertilizar as flores, as verdadeiras, e eternizá-las são necessários, às vezes, pássaros, ventos e insetos. Para desfrutar de sua beleza e dar a elas nossos próprios significados, nós.
“Borboleta parece flor
Que o vento tirou pra dançar
Flor parece gente
Pois somos semente do que ainda virá”
(“Sonho de uma Flauta” de “O teatro mágico”, “Segundo ato” de Fernando Anitelli)
(foto: Haygraphiks)
(Imagem de abertura o vaso de flores: Óleo sobre tela de Paulo Dias)
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