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A arte de recortar papel

23/07/2024
"Scherenschnitt" de Maria Luiza de Almeida Scheleder.

O papel, geralmente, é usado como suporte, tanto na escrita diária quanto nas artes. Escrita diária que está ficando cada vez mais rara, devido ao uso dos novos meios eletrônicos. O papel foi inventado pelos chineses, no ano 105 d.C., tendo sido precedido por diversas formas de suporte como o papiro e o pergaminho e, desde então, tem sido a forma mais usada para a comunicação escrita, entre outros usos.

Hoje, gostaria de falar aqui do papel como elemento para a criação, tendo como essência suas próprias qualidades estruturais. Na linguagem arquitetônica, na moda, nas dobraduras do tão conhecido e importante origami, na escultura com o papier mâché (papel machê) e nos recortes que tanto fascinam as crianças quando já conseguem usar uma tesoura. Vamos ver alguns dos tantos exemplos da rica arte em papel.

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Convite para o espetáculo “Alma do Papel”- Ilustração de Isabela de Carvalho Viana e poema de Almir Tovar Filho.

No meu atelier para crianças, o Pró-Criar, montamos o espetáculo intitulado “Alma do Papel” apresentado ao público no Teatro Paiol, em 1990, sob a direção de Eliane Karas, texto de Martha Schlemm, iluminação de Leonel M. Jr., entre outros valiosos colaboradores, dentre eles, a professora Kazuko Horiuchi, que orientou a parte do origami. Foram construídos, desde o cenário, que utilizou a técnica de arquitetura em papel, técnica essa originalmente criada por Masahiro Chatani; máscaras em papel machê, pipas e elementos ornamentais como origamis e globos com flores de papel, usados nas festas orientais. Na arena do Teatro Paiol, as trinta crianças encenaram o espetáculo, que criaram com suas próprias mãos e ideias. Linda experiência!

Já Henri Matisse (1869-1954), sentiu-se liberto ao se expressar por meio de recortes de papel. Durante sua doença, quando preso ao leito, passou a criá-los e a colá-los nas paredes de seu quarto. Muito coloridas essas colagens, entre elas as famosas “The Blue Nudes” (1952), recortes de mulheres, em papel pintado em guache azul, em diversas posições que, a partir de então, tornaram-se sua linguagem de características muito próprias, que também foram usadas em impressões litográficas. A capela do Rosário de Vence, situada num vilarejo no Sul da França, é um tesouro, inteiramente planejada por Matisse entre os anos de 1949 e 1951.

O papel machê, uma massa de papel desenvolvida também na China, é usada entre outras coisas, para fazer as máscaras que, além das de couro, fazem parte dos ricos personagens do tradicional Carnaval de Veneza. Na Noruega, construiu-se uma igreja inteira nessa técnica, que durou 37 anos. No Brasil, a técnica é muito usada em peças de decoração, esculturas e personagens de festas populares como o “Bumba meu Boi” e os “Bonecos de Olinda”.

"Nu Azul II" Henri Matisse (1869-1954) - Gouache sobre papel recortado. Museu Nacional de Arte Moderna/Centro de Criação Georges Pompidou, Paris.
“Nu Azul II” Henri Matisse (1869-1954) – Gouache sobre papel recortado. Museu Nacional de Arte Moderna/Centro de Criação Georges Pompidou, Paris.

O papel e a tesoura fazem parte da nossa infância, desde que aprendemos a recortar com as difíceis tesouras de ponta redonda. Círculos, com coraçõezinhos vazados, a partir de dobraduras recortadas são denominados simetria assim como aqueles mágicos bonequinhos de mãos dadas: as cirandas de papel estão gravadas para sempre nas nossas lembranças.

Tenho especial apreço pelo trabalho de recorte da curitibana Maria Luiza de Almeida Scheleder, pessoa encantadora, que trabalha com a técnica chamada Scherenschnitt que significa corte com tesoura também conhecida como Silhueta. Malu, que cursou a Escola de Belas Artes, cria, a partir de relatos e histórias de pessoas, empresas ou famílias, uma arte impecável e muito rica, baseada em pesquisa e em sua própria criação. Busca as melhores formas de expressar os sentimentos envolvidos em cada relato. Com papel negro, tesoura e mãos treinadas, ela recorta o papel, como quem desenha sobre ele, criando caminhos de beleza e carinho, gravando vidas que, contraditoriamente, são tiradas das sombras das memórias através de silhuetas trazidas à luz para reconhecimento. Ilustrações de livros e teatro de sombras, assim como grandes painéis narrativos, estão no rol de suas produções. A natureza, como não poderia deixar de ser, é um dos focos da sua arte.

É o papel, inicialmente criado para dar suporte à escrita, transformando-se numa arte própria, magnífica!

(Ilustração de abertura: “Scherenschnitt” de Maria Luiza de Almeida Scheleder.)

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