Por Marcos Traad
Não é por falta de grandes eventos realizados com os maiores líderes mundiais que estamos hoje em uma situação quase que inercial em relação a várias questões realmente importantes para o futuro do planeta. Da fome à desnutrição, moradia digna, mudanças climáticas, escassez de água potável, saneamento básico, o nível de disparidade social quanto à renda, entre outros, são assuntos de suma importância, tratados há décadas e mantidos na maior parte das vezes como recorrentes.
É preciso admitir que o mundo gira em função de interesses econômico-financeiros, e que qualquer passo seguro para avanços socioambientais deve ser tratado sem causar grande abalo à expectativa de desenvolvimento das nações. Portanto, a emissão de gases de efeito estufa e a redução da pobreza existente no planeta, por exemplo, não podem ser conduzidos com medidas assistencialistas, populistas, descontinuadas ou de caráter puramente ideológico.
Há um antigo ditado que resume bem o que está por trás dos discursos e das práticas propriamente ditas: “façam o que eu digo e não façam o que eu faço”!
Imaginemos as nações mais populosas do mundo como a Índia e a China, com 1,44 e 1,42 bilhão de habitantes, respectivamente, buscando mantê-los vivos e supostamente saudáveis, sendo chamadas a cumprir metas de redução de emissões que podem colocar em risco o seu bem-estar. Mas, dirão alguns: há pactos e acordos assinados em reuniões importantes com os maiores líderes do planeta que devem ser seguidos. Na realidade, entre a assinatura de um compromisso e o seu cumprimento efetivo, há uma grande distância e tudo passa pelo econômico-financeiro. É como você assumir um compromisso de crédito sem falar com o seu gestor financeiro. Se não há capacidade de endividamento, a captação do dinheiro não ocorrerá, mesmo que tenha havido o tradicional “aperto de mão”.
Que tipo de ameaça pode haver para um país como os EUA, em cumprir com os acordos que assina? Quando deixam de assinar significa apenas que não concordam, ou indica que assumir determinados compromissos pode ir de encontro ao que está estabelecido como meta de crescimento do país e, assim sendo, o custo ambiental e social para o planeta são desconsiderados?
Por óbvio que devemos buscar todos os meios para debates sobre as questões comprovadas cientificamente, que podem abalar a sobrevivência em longo prazo. Ocorre que a comprovação científica de um fenômeno qualquer nem sempre é permanente. Novas teses, questões metodológicas, descobertas mais recentes, podem mudar radicalmente a evidência do comprovado mudando também a condução do assunto, trazendo uma ruptura do que já estava postulado com o achado mais recente.
Os últimos acontecimentos no âmbito do atual governo dos EUA têm abalado a muitos, e há o receio de retrocessos na questão ambiental. Há uma clara sinalização de que, de forma isolada, o que interessa a América “dos e para os americanos” torna os acordos anteriores muito frágeis. Demonstra ainda que o mundo continua caminhando para um isolamento das nações, em função dos seus próprios problemas, e não da visão geral sobre o planeta. O curso da história é alterado pela simples edição de atos governamentais, nem sempre tidos como constitucionais ou em consonância com as normas do direito internacional.
Nesta mesma toada, começam as manifestações de outros países com o dito alinhamento ideológico, gerando um efeito cascata difícil de ser contido. Sejam apenas estratégias muito bem traçadas para que, através de “um disparo num alvo”, outros tantos sejam atingidos, e, num ciclo contínuo, sejam provocações para que todos voltem a discutir e a negociar: PREOCUPA!
A Conferência das Partes (COP), criada em 21 de março de 1994, já sinalizando sobre as interferências humanas e as suas previstas consequências sobre o sistema climático do planeta, é um desses eventos importantes típicos. Imprensa mundial com holofotes sobre os encontros, manifestantes eloquentes buscando fazer pressão sobre os governantes, sempre chamam a atenção de muitos. Passados 31 anos: há concretamente o que comemorar em linhas gerais? Os avanços obtidos estão dentro daquilo que foi pactuado? Com que expectativa de resultados, pactos e metas não cumpridos continuarão sendo cobradas dos signatários dos acordos?
Existem relatos que procuram evidenciar que a situação do planeta, em relação ao aumento da temperatura, estaria muito pior, se alguns países não seguissem as recomendações de redução de emissões de gases de efeito estufa. Será que os prognósticos feitos à época eram tão precisos para que tal constatação seja verdadeira? Na dúvida, é melhor confiar na ciência, mesmo que haja a antítese que deixa de lado as preocupações com o clima da forma como se tem alardeado.
As provocações aqui apresentadas não têm o propósito de trazer qualquer desestímulo à continuidade das negociações e das reuniões, que com certeza continuarão buscando resultados. No entanto, é necessário tentar encontrar o meio termo, que possibilite o cumprimento de metas, segundo a capacidade de cada parte, e que resulte num menor abalo possível à estabilidade econômica e financeira dos pactuantes. É claro que é praticamente impossível o isolamento da variável de humor e de perfil pessoal dos governantes do momento, que muitas vezes geram retrocessos incalculáveis. Mas, havendo uma boa dose de bom senso (atitude muito rara atualmente), quem sabe conseguiremos obter avanços concretos com os grandes eventos de cúpula, evidenciando a sua real importância para a vida no nosso maravilhoso planeta.
Marcos Traad – Diretor Técnico do Grupo Cataratas. Graduado em Zootecnia pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Mestre e Doutor pela Universidade Federal do Paraná. Foi Pesquisador do Instituto Agronômico do Paraná e Professor Titular da PUCPR.