Não fingimos instabilidade emocional, mas podemos sim, fingir estar bem. “Essa é uma verdade verdadeira”. Quem não consegue pensar em alguém, ou algumas pessoas que estão passando por situações particulares muito delicadas, mas por alguns fatores, precisam seguir a vida como se nada estivesse acontecido?
Um grande exemplo disso é o clássico filme italiano, “A vida é bela”, em que pai e filho (criança), judeus, são separados da mulher/mãe e levados a um campo de concentração nazista. Esse pai, utilizando de uma grande imaginação, consegue conviver nesse campo nazista com seu filho, “fingindo” ser tudo uma grande brincadeira, em que todos estão envolvidos.
Com o intuito de protegê-lo de todo o terror e violência daquela situação, esse pai, representado pelo ator Roberto Benigni, faz de tudo para que seu filho possa viver uma realidade paralela daquela que de fato estava acontecendo.
Enfim, o filme demonstrou com maestria o que a mente humana é capaz de fazer para tentar não trazer os impactos da realidade para determinados aspectos de nossa vida. O filme foi indicado para 7 prêmios de Oscar, e venceu, o de Melhor Ator. Desde já fica minha recomendação para vocês, desse clássico do cinema italiano.
Imaginem, em uma situação real, o que esse pai estava passando com o filho dentro de um campo de concentração, em que a qualquer momento poderiam ser executados pelos nazistas, simplesmente por ser quem eram. A mente desse pai, afastado da família e em risco constante, vivendo em condições sub-humanas, e precisando manter uma ilusão para que seu filho fosse poupado ao máximo possível do terror orquestrado pelos nazistas, com certeza estava destruída, mas ele não podia passar essa mensagem.
Trazendo para a nossa realidade, tenho certeza de que muitos de nós tem um pouco de “A vida é bela”.
Eu mesmo, especialista e estudioso da área, trabalhando e analisando mentes durante muitos anos, sou constantemente surpreendido. Tenho um grande case em minha vida particular, que até hoje eu cito quando o assunto é saúde mental.
É um caso real, que foi amplamente divulgado. Conheci em um grande evento, um profissional referência na área de atuação, com uma condição financeira extremamente sólida e com uma família maravilhosa. Nesse evento, conversamos por toda a noite, tomando vinho, dando risada e nos divertindo. Foi sensacional. Que pessoa fantástica. Aqui vou chamá-lo de Sr. P.
Encurtando a história, 10 dias depois desse evento, por meio de alguns canais de comunicação, recebi a notícia de que o Sr. P, havia cometido suicídio.
Essa notícia foi um choque para toda a comunidade, mas especialmente para mim. Eu sou o especialista, eu estudo mentes e sou muito bom nisso, mas como que eu não percebi essa situação com o Sr. P? Afinal, tinha tudo para ser um homem feliz e realizado. Família maravilhosa, dinheiro, reconhecimento, tudo que uma pessoa poderia sonhar ele tinha. Mas então, por quê?
O fato é que nunca vamos saber o real motivo que levou o Sr. P a realizar um ato como esse. Pode ser que estivesse performando “A vida é bela”, há muito tempo, não sei. O que é fato, é que esse caso foi outro exemplo evidente de que as pessoas não fingem uma instabilidade emocional, mas elas podem sim, fingir estar bem.
Citei essa frase em minha primeira interação com vocês aqui, mas gostaria de debater mais sobre isso. Trazendo essa situação para o mundo empresarial, é muito comum, por meio de um trabalho organizacional, liderado por psicólogos experientes, identificar inúmeros casos de “A vida é bela” dentro das empresas.
Familiares doentes, problemas com relacionamentos, dificuldades financeiras, vergonha de alguma situação particular, são constantemente “escondidas”, “disfarçadas”, durante a jornada de trabalho… “Ah Da Silva, mas os problemas pessoais de cada um, não é problema da empresa. É preciso separar as coisas.”
Impossível. Temos apenas uma personalidade. Não vamos deixar nossos problemas para fora do portão da empresa. Não acontece assim. Óbvio que nossos problemas não devem impactar no trabalho, essa é a teoria e o mundo ideal, mas claro que ficamos vulneráveis quando estamos passando por situações relevantes em nossa vida pessoal.
Se meu companheiro, filho, mãe, pai, está internado em uma situação grave/delicada, qual a chance de eu manter minha produção elevada, motivado? É aí que entra o papel dos líderes/gestores. O Fulano produz em média 100 peças por mês. Por dois meses seguidos, produziu 70, depois 55 peças. Se todo o processo é o mesmo e a estrutura dele não mudou, é um indício claro de que esse colaborador precisa de atenção. Algo aconteceu.
Além do cuidado com o ser humano, é claro que pessoas com problemas pessoais importantes, ficam mais suscetíveis a acidentes, erros, retrabalhos, ou seja, se você empresário, ou se você gestor, não detectar os sinais de “A vida é bela” dentro de sua empresa ou setor, é bem provável que enfrente situações custosas dentro da organização.
Vamos nos atentar aos sinais, vamos investir no capital humano. É aquele clichê que faz muito sentido: 100% de seus clientes são pessoas, 100% de seus colaboradores são pessoas. Se você não entende de pessoas, não entende do seu negócio. Aquele óbvio que muitas vezes precisa ser dito. Pessoas debilitadas e desamparadas não vão agregar os resultados esperados.
Esse é o recado que gostaria de deixar para vocês. Não só para o trabalho, mas também para a vida pessoal. Observe seus filhos, perceba os sinais das pessoas que você convive, que você conhece. Fique atento, afinal, assim como o Sr. P, os sinais ignorados podem gerar uma tragédia irreversível.
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