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12/05/2024

Alfinete salvador

No tempo das vacas de muitas arrobas, Hermann Sheffield reuniu a família e determinou que se preparassem para um cruzeiro marítimo. Iriam a Buenos Aires, cidade que trazia lembranças diversas e controversas ao protagonista.

Lá ele havia passado uma lua de mel conturbada, em que foi lesado por um taxista, a ponto de ficar sem dinheiro até para comprar absorventes para a desprevenida Rosita.

Houve a excitação inicial, resumida nas preocupações femininas com os trajes, as dos meninos com as diversões e a do financiador da viagem com os gastos.

Eis que se levantam as âncoras. O transatlântico deixa Santos e se dirige ao sul. Na manhã seguinte, veem-se ancorados na acanhada, pero bucólica, São Francisco do Sul. Sem estação de passageiros, os turistas desceram a rampa para sair direto no centro da cidade.

Talvez não seja possível imaginar duas mil pessoas despejadas ao mesmo tempo em uma cidade do tamanho de São Chico. Não havia táxis em número suficiente, os bares e restaurantes lotaram, as lojas ficaram abarrotadas de pessoas regateando preços de bugigangas. Os locais se quedaram sem rumo, pasmados com aquela turba semelhante a uma enxurrada de verão, a levar tudo de cambulhada.

A família Sheffield, por sua vez, passeou pelas velhas ruas da cidade, visitou a igreja matriz e o cineteatro, esquadrinhou o mercado e, por volta do meio-dia, tomou o rumo de um restaurante bem recomendado na praia de Paulas, a bordo de uma vetusta Vemaguete, já com décadas a serviço do dono, naquele dia fazendo bico no transporte de passageiros.

O tal restaurante ostentava uma fila quilométrica. A pizzaria ao lado só abria à noite. Botecos adjacentes serviam camarão abraçadinho na varanda, onde abraçadinhos também estavam os fregueses, por falta de espaço.

Depois de muito procurar, encontraram um lugar em que a espera estava estimada em uma hora. Hermann calculou: a rampa do navio iria subir às 16h. Daria tempo. Aquela uma hora transformou-se em quase duas, antes de surgir a mesa necessária. Outros 30 minutos até um garçom dignar-se a anotar os pedidos. Então bastaria engolir a comida e voltar ao navio.

Voltar ao navio, Hermann? Providenciou um táxi, a propósito? Não os havia. A Vemaguete da ida estava, àquela hora, na praia de Itaguaçu, aguardando uma família do Mato Grosso do Sul terminar seu banho de mar e areia para voltar ao buque.

Outra família, esta do norte paranaense e sem ligação com o navio, estava a sair do restaurante. Aceitaram embarcar os componentes dos Sheffield, à exceção do chefe. Restava saber como ele iria se safar.

15h45. Foi quando o velho astuto vislumbrou um motoqueiro entregador de pizza, passando em direção ao centro da cidade, ao porto, ao navio e ao paraíso. Hermann fez sinal e ofereceu 50 pratas por uma carona. Proposta aceita, subiu na pequena moto de 125 cilindradas e mandou tocar a toda velocidade.

O motoqueiro envergava uma camisa do JEC, o Joinville Esporte Clube, com número 2 pregado às costas, usada na origem por um lateral direito chamado Alfinete.

Assim, agarrado naquela surrada camiseta, sentindo no nariz o azedo suor alheio, a orelha encostada na omoplata do condutor, Hermann Sheffield chegou ao navio quando a buzina dava seu terceiro aviso. Não se sabe o que ocorreria sem o Alfinete salvador.

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