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SAÚDE

Beber café durante a manhã ou ao longo do dia? Estudo tenta desvendar o que é melhor para a saúde

11/02/2025
café

estadão

Você é do time que prefere tomar um cafezinho apenas no período da manhã, depois de acordar? Ou acha melhor tomar umas xícaras ao longo do dia? Pois cientistas da Universidade Tulane, nos Estados Unidos, sugerem que o primeiro padrão está fortemente associado a um risco reduzido de mortalidade. Os resultados foram publicados no periódico European Heart Journal.

Para chegar à conclusão, os pesquisadores analisaram dados de mais de 40 mil adultos que participaram da pesquisa nacional de saúde e nutrição dos Estados Unidos, entre 1999 e 2018. No levantamento, os indivíduos informavam todos os alimentos e as bebidas consumidos em pelo menos um dia. Eles explicavam, por exemplo, se beberam café, quanto e quando.

Além disso, a análise inclui um subgrupo de 1.463 pessoas que foram solicitadas a preencher um diário detalhado sobre alimentos e bebidas por uma semana inteira.

Com esses dados em mãos, os pesquisadores descobriram que, entre os participantes, cerca de 36% das pessoas bebiam café pela manhã (principalmente antes do meio-dia), enquanto 16% tinham o hábito de tomá-lo ao longo do dia (manhã, tarde e noite). Eles também viram que 48% não bebiam café.

O passo seguinte do estudo foi vincular essas informações com os registros de óbitos e causas de morte ao longo de um período de nove a dez anos. Durante o acompanhamento, um total de 4295 óbitos foram registrados. Destes, 1.268 foram causados por doenças cardiovasculares e 934 por câncer.

Vale lembrar que há um tempo a literatura científica indica que o consumo moderado de café é associado a benefícios à saúde. Uma recente revisão, publicada no periódico GeroScience, por exemplo, relaciona o hábito à redução do risco de males cardiovasculares, diabetes tipo 2 e síndrome metabólica. Doenças renais também são destaques no artigo.

Agora, os cientistas queriam saber se a horário de consumo faria diferença.

Como resultado, então, o estudo indicou que os bebedores matinais tinham 16% menos probabilidade de morrer de qualquer causa e 31% menos probabilidade de morrer de doença cardiovascular quando comparados a quem não tomava café. No entanto, esse mesmo benefício não foi visto nas pessoas que degustavam o café o dia todo.

E tem mais: a pesquisa apontou ainda que os mais beneficiados foram os grandes fãs da bebida (que ingeriam mais de três xícaras por dia) e os consumidores moderados (de duas a três xícaras). A turma do consumo mais leve (uma xícara ou menos) não obteve tantas vantagens.

Hipóteses

O estudo não chegou a investigar o porquê das eventuais vantagens do consumo matinal. Mas há algumas teorias. Ao Estadão, o líder da pesquisa, o médico Lu Qi, professor na Universidade Tulane, explicou que a resposta pode estar nos ciclos circadianos, ou seja, no nosso famoso “relógio biológico”.

“Presumimos que beber café mais tarde pode perturbar o sono e os hormônios relacionados ao ritmo circadiano, como melatonina e cortisol. Em contraste, beber café pela manhã pode interferir menos nesses fatores”, explica.

Já o professor Thomas F. Lüscher, do Royal Brompton and Harefield Hospitals, não envolvido na investigação, comentou, em editorial também publicado pelo European Heart Journal, que nas primeiras horas da manhã, geralmente há um aumento acentuado na atividade simpática, um efeito que desaparece durante o dia e atinge seu nível mais baixo durante o sono.

O sistema simpático é responsável pelo gasto de energia, regulando o corpo para que ele a utilize de forma correta para responder a situações de estresse e emergências. Quando chega o período noturno, o ideal é que ele nos dê uma trégua, ajudando-nos a relaxar. Mas, segundo Lüscher, é possível que beber café à tarde desregule esse ritmo. Isto, por sua vez, pode levar a mudanças nos fatores de risco cardiovascular.

Ele comentou que muitos indivíduos que bebem café ao longo do dia sofrem de distúrbios do sono. “Nesse contexto, é interessante que o café pareça suprimir a melatonina, um importante mediador indutor do sono no cérebro”, afirma.

Especialistas contestam conclusões

Já para um dos maiores estudiosos sobre café e saúde do Brasil, o cardiologista Luiz Antonio Machado César, médico e pesquisador do Instituto (InCor) do Coração da Universidade de São Paulo (USP), a pesquisa “não faz sentido”.

“Eu não aconselharia as pessoas a tomarem café só de manhã”, afirma. Para o médico, poucas pessoas consomem a bebida somente nesse período e os estudos anteriores, que comprovaram os benefícios do café para a saúde, dificilmente chegaram à essa conclusão usando apenas participantes que o bebiam em um só horário.

“Se você é o tipo de pessoa que não dorme quando toma café depois das 15h ou 16h, então, de fato, é melhor não ingeri-lo depois desse horário. Mas, fora essa limitação, não faz sentido falar para alguém que só tome café pela manhã”, conclui.

Ele relembra que outras análises, como algumas que mostram que os consumidores de café são menos propensos a desenvolver diabetes tipo 2, englobaram pessoas que tomavam até sete xícaras por dia, segundo o cardiologista. “E ninguém conseguiria beber isso só pela manhã. Iria se intoxicar”, diz.

“Contra o diabetes, quanto mais café tomar, menos chance de desenvolver a doença”, reforça.

Já quando o assunto é reduzir o risco de doenças cardíacas e acidente vascular cerebral (AVC), principal foco do estudo americano, Machado César destaca que a dose recomendada é partir de duas xícaras – e não mais do que quatro por dia.

“Mas, se um copo americano tem 150 ml, estou falando de 600 a 700ml de café filtrado por dia”, calcula.

Segundo o médico, a afirmação sobre a atividade simpática também é inconsistente. Ele explica que o café, de fato, estimula essa ação, mas que tomá-lo apenas de manhã, quando o corpo já produz mais adrenalina para acordarmos, não deve ser visto como um ponto positivo.

“Estímulo simpático é ruim. O café faz isso, por meio da cafeína, mas tem outros componentes que são protetores”, explica.

Para Monica Pinto, nutricionista e gerente de projetos da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), o melhor horário para tomar café depende de vários fatores, como o seu ritmo de sono e o tempo que o seu corpo leva para metabolizar a cafeína.

“O café é uma bebida diurna, que ajuda nas atividades do dia, mas seu consumo deve ser reduzido no período da noite a fim de não afastar o sono. O Ideal é que a última xícara seja tomada seis horas antes de dormir para que os estimulantes não continuem no organismo na hora do descanso”, orienta.

A nutricionista recomenda que a primeira xícara seja tomada na primeira hora após o despertar e as demais com intervalos mínimos de duas horas.

Sobre as repostas do estudo de Lu QI e equipe, Monica aponta que são necessários mais estudos para avaliar como o horário da ingestão de café repercute na saúde do indivíduo.

Ela também reforça que tomar muito café de uma só vez pode causar efeitos adversos, como ansiedade, nervosismo, arritmias cardíacas e até mesmo overdose, já que a cafeína é um estimulante neuronal.

Considerando o café filtrado, o consumo recomendado para tirar proveito das propriedades benéficas seria de cerca de três a quatro xícaras grandes por dia.

Essa dose não ultrapassaria o limite indicado de 400 miligramas de cafeína ao dia. Embora a sensibilidade em relação à substância varie muito entre as pessoas, os especialistas recomendam não passar dessa quantidade.

(Imagem: FreePick)

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