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A ofensiva ucraniana em Kursk e a Terceira Guerra Mundial

27/08/2024

No dia seis de agosto as forças armadas ucranianas desfecharam um ataque à província russa de Kursk. A surpresa obtida foi total. Nem os russos nem os aliados ocidentais da Ucrânia reunidos na OTAN anteciparam qualquer possibilidade de que este tipo de ação ofensiva ainda pudesse vir a ocorrer. Afinal, os ucranianos já experimentavam perdas e recuos em todos demais setores da linha de frente. Cabe examinar os efeitos desta ofensiva sobre o desfecho da guerra e o futuro da raça humana.

No momento em que este texto é escrito o avanço ucraniano em terras russas se encontra estagnado. Depois de obtida a surpresa inicial as tropas ucranianas avançaram em poucos dias entre 15 e 30 Km sobre a Província de Kursk. Mas, desde então, a defesa russa se organizou e reforçou esse setor até então inativo da linha de frente. E, para frustração dos ucranianos, sua ofensiva foi contida sem implicar em qualquer transferência para Kursk de tropas russas de outros setores do front, onde os avanços inimigos se sucedem.

Os russos seguem avançando em praticamente toda linha de frente. Nas províncias ucranianas de Zaporizhzhia, Donetsk, Luhansk e Kharkiv as tropas russas continuam a ganhar terreno a cada dia. Nas províncias de Sumy e Kherson os combates são posicionais, mas, como nos demais fronts, caracterizados pela ampla superioridade de fogo, efetivos e meios de combate dos russos.

Originalmente a Ofensiva Ucraniana em Kursk foi pensada para atender diferentes objetivos políticos. Contudo, a possibilidade de alcançar quaisquer destes objetivos diminui à medida em que a presença militar ucraniana em Kursk se torna cada vez mais difícil e custosa. A questão crítica é por quanto tempo mais tal esforço pode ser sustentado.

Ao desfechar a ofensiva os ucranianos empregaram seis brigadas de diferentes tipos. Em duas semanas estes efetivos cresceram para 12 brigadas. Atualmente já foram identificadas 17 brigadas ucranianas atuando em Kursk. Mas, mesmo assim, a ofensiva perdeu impulso e se encontra estagnada.

Se levarmos em conta a atual taxa de perdas que os russos vêm infringindo aos ucranianos em Kursk, fica claro que o esforço ofensivo não poderá ser sustentado por muito mais tempo. Pior ainda, a insistência na manutenção da ofensiva já ameaça esgotar as reservas ucranianas de potencial humano, material bélico e munições. Nesse cenário, longe de melhorar as condições políticas para retomar as negociações de paz, a ofensiva ucraniana pode estar levando a uma derrota militar que pode ser definitiva.

Confrontados com a imposição de uma derrota restará às lideranças ucranianas poucas opções. Uma delas seria negociar um tratado de paz em condições absolutamente desvantajosas. Neste caso todas as exigências russas que levaram à guerra seriam atendidas. A independência nacional ucraniana poderia, no limite, ser extinta.

Uma outra opção seria expandir a guerra para evitar a derrota. Neste caso poderia ser cogitado pelos ucranianos um ataque às centrais nucleares de Zaporizhzhia, atualmente em território ocupado pelos russos, ou de Kursk, próxima à cidade russa de mesmo nome. Em ambos os casos extensas áreas de terra, recursos hídricos e uma enorme população predominantemente russa seriam expostas à radiação, numa repetição em escala muitíssimo pior do que a do desastre nuclear de Chernobyl em 1986.

Neste episódio foram afetadas 350 mil pessoas, das quais 135 mil tiveram de ser removidas permanentemente de suas casas. Entre nove mil e 16 mil pessoas teriam morrido precocemente por conta dos efeitos da radiação liberada pelo acidente nuclear. Um evento desta magnitude – ou ainda pior, por se tratar de destruição deliberada – teria consequências imprevisíveis, não só para o desfecho da Guerra da Ucrânia, mas para o futuro de toda Humanidade. Seria altamente provável, no caso de haver represálias nucleares equivalentes por parte da Rússia que, afinal, eclodisse a Terceira Guerra Mundial.


Dennison de Oliveira é professor de História na UFPR e autor do livro “História Contemporânea” (IESDE, 2007)

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