Há 9 anos acompanhávamos o trágico acidente com o avião que transportava a equipe da Chapecoense além de jornalistas, matando 71 pessoas, tendo sobrevivido apenas 6, dando uma proporção sem precedentes a essa tragédia. A razão deste meu artigo é relembrar o porquê daquela tragédia . Para os que não lembram vamos reavivar a memória. O piloto, também sócio da empresa, o que explica melhor o ocorrido, para evitar uma parada para reabastecimento, o que encareceria mais a viajem , e, lhe sobraria menos lucro ,arriscou tudo em um vôo sem escala.
Existem jogadores que são contumazes em arriscar tudo em cassinos, loterias e diversos outros jogos de azar, mas esse arriscar tudo para eles é relativo a arriscar dinheiro. No caso do personagem central dessa tragédia, por ganância, para ganhar um pouco mais, arriscou a própria vida. Tivesse sido somente a sua vida. Ainda vá lá. Um ganancioso inconseqüente a menos neste mundo.
A questão é que, além da vida dele, esse mentecapto, sem dar a mínima chance de opção para outros 77 passageiros, decidiu por eles. Sim, sua moeda de troca por um punhado de dinheiro a mais foi a sua própria vida e de outros 66 passageiros.
A que ponto chega a ganância ser humano! Somos ditos racionais, pelo simples fato de nosso universo mental, permitir que existam pensamentos sobre outros pensamentos, e é nesse momento que nos colocamos acima dos chimpanzés e golfinhos.
A consciência humana é única no mundo animal, diz o neurocientista indiano “Vilayanur Ramachandran”.
Que consciência tinha esse infeliz? Imaginem seu diálogo mental consigo mesmo, tentando negociar essa possibilidade insana de voar aquele trecho com combustível no limite. – “Vou usar toda a minha experiência e fazer esta viagem sem reabastecer, e se Deus quiser nada vai acontecer”. Se Deus quiser? Teria ele consultado Deus sobre seu plano de vôo? Teria Deus dito “Vai que Eu garanto” ?
A ideia deste artigo é fazer uma reflexão ,usando esse exemplo emblemático desse infeliz piloto, da possibilidade de nós, latinos, talvez por questões culturais, termos a sensação da proteção divina nas nossas ações irresponsáveis. Fechamos os olhos e dizemos “Seja o que Deus quiser”. Essa transferência de responsabilidade, dando à Deus, sem consultá-lo, a decisão pelo resultado final, mostra o nível de nossa negligência.
E por que digo latinos? Por puro achismo . Mas me parece que os europeus, americanos do norte e asiáticos, para ficar apenas nesses três exemplos, são educados dentro de um padrão de comportamento que não lhes permitem a negligência, ou melhor, lhes imputam tamanha responsabilidade por seus atos, em termos jurídicos, que eles crescem olhando para as leis com olhos mais temerários. Parece-me que para eles o certo é certo e o errado é errado. Muitas vezes para nós, o certo é certo e o errado pode não ser tão errado assim, se der pra “dar um jeito”. Somos mais benevolentes, mais condescendentes. Acolhemos o mal feito com certa paternalidade.
Que as lições tiradas desse fatídico episódio, tragam as revisões devidas, para que novas tragédias possam ser evitadas, principalmente como as desse tipo, totalmente evitáveis. Em outras situações estaremos sempre rezando para que Deus nos ajude.
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