Os episódios são antigos, da entrada dos anos 1970, tempo em que dois radialistas dividiam um apartamento na Visconde de Guarapuava. Um deles, bem apessoado, voz possante, tornou-se uma espécie de Cid Moreira paranaense, como apresentador de televisão e mestre de cerimonias em múltiplos eventos. O outro, o Carequínea, vindo do interior do nordeste, fez carreira em rádios e jornais, antes de se tornar autor de diversos livros sobre personagens de esportes, com sucesso.
Deu-se que outro jornalista, vivendo na Europa como repórter e locutor da Rádio Suíça, ao voltar para o Brasil, em férias, trazia com ele rolos de filmes pornográficos em 16mm. Ou enviava algum novo lançamento pelo correio. Eram produções suecas ou dinamarquesas, comuns por lá, mas proibidíssimas aqui, nesta terra voltada aos costumes bentos e militares.
Na época, o jornalista Arthur José Poerner, correspondente de O Pasquim na Alemanha, enviava textos saborosos sobre a vida naquelas paragens. Um deles contava sua experiência no set de filmagem de um filme do gênero. Eis que a atriz chega com seu bebê. Despede-se do marido, acomoda o neném e se prepara para entrar em cena – ou seja, se põe pelada. Ao chamado da produção, deita-se na cama e dá início às funções, desempenhadas com dedicação e eficiência. No “corta” do diretor, volta suas atenções para a criança. Dá o peito, puxa lã e agulhas da bolsa e passa a fazer tricô. Tudo muito normal, naturalmente. E assim se passavam as horas, até o marido voltar para pegar a família e seguirem para casa. À noite, bem não vamos exagerar, talvez a esposa estivesse cansada, com dor de cabeça.
Já no apartamento da Visconde, as coisas corriam diferentes. Os patrocinadores das sessões eram assessorados por um, digamos, produtor, também radialista, o Soneca. Nada sonolento, Soneca alugava o projetor e fazia a relação dos convidados. Eram no máximo seis ou oito por sessão, já que a plateia se via obrigada a sentar no alto da escada em L, com o filme exibido na parede.
Era um espanto para aqueles marmanjos, cuja experiência nesse tipo de entretenimento não passava de filmes italianos do tipo Sodoma e Gomorra, e outros com títulos apelativos, estilo Seduzida e Abandonada ou A Monja de Monza, castos para os padrões da cinematografia explícita dos nórdicos.
Na escada imperava o silêncio. Atenção total às cenas daqueles roteiros simplórios, nos quais o que importava era o tchaca-tchaca. Como se tratava de curtas metragens, em 15 minutos a sessão estava terminada. Então o único banheiro do apartamento ficava congestionado. Problema sério, como se vê, até que os promotores decidiram interditá-lo.
Foi medida profilática, visto que os espectadores passaram a sair sem demora, assim que o “The End” surgia na parede, disfarçando suas protuberâncias embaixo dos casacos, a procurar consolo em outras bandas. Dava tempo apenas de reservar lugar no lançamento da próxima atração, rezando para o Suíço não esquecer de seus carentes colegas de microfone.
Cid Moreira, Carequínea, Suíço e Soneca seguem firmes, vivendo vidas de aposentados. Todos com famílias bem constituídas, cujos netos nem fazem ideia do que foram aqueles tempos de sexo solitário de seus respeitáveis avôs.