Antônio passou a se reconhecer como Manoela e frequentemente era vítima de transfobia e racismo. Trabalhava como cabeleireira e era muito querida pela família. Quando precisava sair para a rua para realizar atividades cotidianas, era insultada e xingada. Certo dia, foi hospitalizada ao fraturar um dos braços, depois de sofrer violência por ser transexual. A intolerância com relação ao seu gênero e sua cor, resultou no homicídio de Manoela.
O transfeminicídio é o assassinato de mulheres transexuais e travestis, em que o desprezo por essas pessoas se torna a principal motivação. Este conceito deriva do feminicídio, mas difere pelo fato de que quem comete o ato compreende o feminino e o masculino diferentemente. No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), de 1994 a 2013, a pessoa trans era considerada um indivíduo com Transtorno de Identidade de Gênero. Sujeitos portadores de transtornos são frequentemente marginalizados pela sociedade e experienciam situações de extremo preconceito. Infelizmente, somente em 2019 o Transtorno de Identidade de Gênero foi retirado do DSM. Tal situação pode ter contribuído para a disseminação da transfobia, visto que a cada 23 horas uma pessoa trans sofre preconceito. Acrescentar o racismo a essa discriminação é o que gera o transfeminicídio negro, que pode levar ao homicídio. O Brasil é o país líder de transfeminicídio sendo que 82% das vítimas são pretas e pardas, e mais de 80% dos casos aconteceram com extrema crueldade.
Considerando os fatos expostos na mídia, é possível encontrar notícias que trazem o mínimo de esperança para uma sociedade cada vez mais intolerante, como o caso da professora Doutora Dodi Leal que é trans e leciona pela primeira vez na escola de comunicações da USP, ou como o de Yasmin Vitória, uma mulher trans negra periférica que conquistou uma vaga no mundo corporativo e hoje trabalha frente a frente com clientes de uma empresa de tecnologia em São Paulo. Para que possamos encontrar mais notícias de conquistas e menos violência, precisamos compreender a importância de discutirmos cada vez mais sobre o assunto. Um dia, alguém que amamos como um irmão ou um filho, podem ser vítimas da crueldade de uma sociedade que se cala diante do que ainda não é moralmente aceito.
Referências:
CRUZ, MT Misoginia, transfobia e falta de dados: a aprovação do transfeminicídio . Disponível aqui. Acesso em: 3 maio. 2023.
LIMA, L. 10 empresas que fazem diferença e a lição de casa para a inclusão de LGBTs . Disponível aqui. Acesso em: 3 maio. 2023.
Escola de Comunicações da USP terá professor trans pela 1ª vez: “Inversão da lógica do lugar que uma travesti pode ocupar”. Acesso em: 3 maio. 2023.
Mulher trans é assassinada com tiro no Recife e família acredita em crime motivado por transfobia. Acesso em: 3 maio. 2023.
RAMOS, EE DE A. Transfeminicídio: genealogia e potencialidades de um conceito. Revista Direito e Práxis , v. 13, n. 2, pág. 1074–1096, 2022.
Leia outras colunas da Hag Schultz aqui.