Never Mind the Bollocks… e aqui está a série do Sex Pistols. Quem fez parte da cena punk de Londres em 1977 talvez não imaginasse que a FX um dia se interessaria na história dos cinco jovens que faziam, com apenas três acordes, o “sexo, drogas e rock n’ roll” não passar de uma terça-feira normal – e talvez uma ideia dessas só poderia passar pela cabeça de Malcom McLaren, empresário do grupo e figura controversa. Os 6 episódios acabam quase tão rápido quanto o Sex Pistols. Mas diferentemente da tendência autodestrutiva da banda, a série se constrói de forma muito constante, e não tem medo de lidar com os absurdos que fazem na biografia do Pistols. Tão original quanto o som dos caras, Pistol (2022) dá vontade de ser adolescente e pendurar um poster do Sex Pistols na parede do quarto. Nada mais perfeito para inaugurar essa coluna.
A história começa com Steve Jones (Toby Wallace). O garoto que, perturbado por seu passado familiar abusivo e pela falta de grana, comete pequenos furtos e anda por aí no estilo “there’s no future”. Quando seu caminho se cruza com McLaren (Thomas Brodie-Sangster) e a estilista Vivienne Westwood (Talulah Riley), da loja de roupas e sex-shop Sex, Jones passa de caso perdido ao novo projeto do empresário. Não demorou muito para encontrar outros músicos que combinassem com a energia e o visual que McLaren queria para a banda. A cena cultural efervescente dos anos 1970 felizmente tinha espaço para muito maluco com pouco talento.
A série apresenta o baterista Paul Cook (Jacob Slater) e o baixista original e bom moço fã de Beatles, Glen Matlock (Christian Lees) – que mais tarde seria substituído pelo problema em pessoa, Sid Vicious (Louis Partridge). Vale um destaque para o ator Anson Boon na pele do vocalista Johnny Rotten – a cena da audição, com os trejeitos de Rotten no palco é tão realista que vira comédia. É o tosco e o tragicômico.
A direção é de Danny Boyle. O cineasta ganhou o Oscar e é responsável pelo longa Trainspotting (1996) – e esse filme aí é só piração. Confesso que tive um certo receio quando me disseram que a história do Sex Pistols virou uma superprodução para a TV, mas dei uma chance, afinal, como diria Rotten, “I wanna see some history”. Contar tudo o que rolou entre 1975 a 1979, principalmente quando o assunto são os Sex Pistols, é um desafio para qualquer roteirista, mas Craig Pearce, de Moulin Rouge! (2001) e Romeo + Juliet (2006), mandou bem. Conseguiu mesclar os acontecimentos que não podiam ficar de fora com curiosidades e momentos cômicos, e amarrar tudo com uma boa dose de drama (o relacionamento de Sid e Nancy que o diga). Alguns problemas surgem no caminho, como alguns diálogos exageradamente óbvios e as cenas em que as músicas são compostas de forma quase mágica. Nada que atrapalhe a experiência, mas tá aí.
Pistol tem seu charme. Além do sotaque londrino e do colete de oncinha de Sid Vicious. A série se compromete com a ambientação, usando montagens com shots originais e aleatórios da vida cotidiana da época – uma boa forma de capturar o espírito dos primeiros dias do punk, completamente na contramão da sociedade inglesa tradicional. Falando nisso, a polêmica das suásticas estampadas nas camisetas dos membros da banda é tratada de forma inteligente, satirizando a explicação de Vivienne Westwood e sua revolta burguesa contra a velha geração. Nada de tentar esconder o símbolo com uma foice e martelo como o filme Sid & Nancy (1986).
Já a trilha sonora é um caso à parte. Ganha qualquer um. A cena entre Steve Jones e Chrissie Hynde (Sydney Chandler) ao som de Moonage Daydream, do Bowie, na jukebox é sensacional. A sequência com Wish You Were Here que termina com Rotten e sua camiseta estampando “I Hate Pink Floyd”. Tudo isso no primeiro episódio. The Kiks, Stooges, New York Dolls, e claro, as autorais do Sex Pistols. Inclusive foi com o terceiro episódio que me apaixonei pela faixa Bodies, segunda do disco do Pistols. Sem spoilers.
Seja punk, seja burro. Os Replicantes que me desculpem. Apesar das letras geniais de Johnny Rotten sobre a monarquia decadente, a crise econômica e a revolta contra o conservadorismo e a religião, a banda era despolitizada, nada daquela ideologia punk que conhecemos hoje. A anarquia no Reino Unido era uma jaqueta de couro cheia de alfinetes. Entre assinar contratos duvidosos e ser um dos fundadores do movimento que revolucionou a música, Jones, Rotten, Cook, Matlock e Vicious estavam mais a fim de tirar uma onda de rockstar, e não dá para culpá-los. Pistol não tem medo de mostrar isso. Aliás, a série é sincera com o espectador. No final, você deixa tudo isso de lado e aproveita a viagem. Todo mundo curte um punk de boutique.
1 Comentário
Tiraram do catálogo da Star+ , não consigo achar em lugar nenhum 🙁