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Sem o agro, regulação de créditos de carbono entra no descrédito

16/11/2023

A ideia básica da existência de um mercado regulado de créditos de carbono é criar um mecanismo que ofereça a oportunidade para que grandes poluidores possam compensar suas emissões de gases que causam o efeito estufa com a compra de ativos sustentáveis.

 

O Brasil ainda discute a regulamentação desta política que estabelece parâmetros de emissões para os setores da economia, e que permite que as compensações sejam deduzidas nos compromissos assumidos pelos países signatários do Acordo de Paris para combater o aquecimento global.

 

Com a aprovação do projeto de lei 412/22 pelo Senado Federal, em outubro, a matéria agora está com a Câmara dos Deputados. Mas, mesmo antes de uma solução definitiva, a proposta é alvo de críticas, apesar de muitos elogios quanto à estruturação operacional da proposta.

 

No resto do mundo, a regulamentação dos créditos de carbono tem como alvo setores mais intensivos em emissões de CO2. A inovação brasileira foi deixar de fora o agronegócio, que é o segmento que mais emite gases poluentes no País, incluído aí o desmatamento – que muitas vezes ocorre para ampliar áreas das duas atividades agrícolas básicas: plantio e criação animal.

 

O Brasil é o quinto no ranking dos maiores emissores de gases de efeito estufa do mundo, atrás da China, Estados Unidos, Índia e Rússia. Nestes países, o problema é a queima de combustíveis fósseis. Por aqui, 75% das emissões estão relacionadas ao processo de uso da terra e ao extrativismo florestal – legal e ilegal.

 

Além da não inclusão da agropecuária nesta política, há questionamentos sobre o conceito da regulação do mercado de créditos de carbono. Como o Brasil abriga 60% da floresta amazônica, há uma corrente que defende que a premissa regulatória deveria ser a conservação e a captura do carbono, e não a lógica industrial, que trata unicamente do volume de emissões.

 

Crédito ruim

As recentes normas criadas pelo Conselho de Integridade para o Mercado Voluntário de Carbono (ICVCM, na sigla em inglês), com sede em Londres, exigem que os ativos tenham 40 anos de monitoramento e de relatórios de emissões para dar garantia de que os compradores dos títulos tenham segurança nos investimentos. A regra coloca em xeque muitos títulos já negociados, mas que não atendem aos requisitos. Segundo o banco suíço Lombard Odier, há no mercado internacional muitos créditos de baixa qualidade que tendem a perder valor ou serem abandonados porque não entregam os benefícios prometidos de remoção ou redução de emissões de carbono.

 

Crédito de plástico (I)

Alguns dos maiores fabricantes globais de produtos de consumo tentam demonstrar ações ambientais que possam agregar selos de sustentabilidade aos seus produtos. Um dos grandes desafios é o uso e destinação do plástico de embalagens, recipientes e componentes. Assim, a onda “net zero” ou “carbono neutro” ganhou um irmão, o “plástico neutro”. Mas como a substituição do produto é difícil, muitas empresas optaram pela compensação. Com isso, nasceu um mercado de crédito de plástico, nos moldes dos créditos de carbono, cuja métrica é a tonelada.

 

Crédito de plástico (II)

Apesar de pequeno e concentrado no sudeste asiático, o mercado de compensações de plástico pode crescer. O assunto frequentou debates da Convenção de Biodiversidade da ONU, realizada em outubro em Nairobi. Há um lobby para a inclusão de créditos de plástico em um tratado global. Uma das organizações interessadas é a Verra, que opera o principal programa de crédito de carbono do mundo e é a maior certificadora de ativos ambientais do planeta. A instituição já desenvolveu uma plataforma para crédito de plástico.

 

CO2 visto de cima (I)

O cálculo de emissões de gases de efeito estufa em cada país é feito por estimativas. A contagem é baseada no tamanho e desempenho da economia, na frota de veículos, nas fontes de geração de energia e no uso dela para a produção industrial e consumo doméstico, além de aspectos da agropecuária, como os rebanhos, área agricultável e o desmatamento. Agora, estas projeções poderão ser conferidas e validadas do espaço com o lançamento do primeiro satélite programado para detectar emissões de carbono.

 

CO2 visto de cima (II)

O Vanguard, da empresa canadense GHGSat, é capaz de ler e estabelecer o volume de gases emitidos individualmente por estruturas como usinas a carvão e gás, refinarias de petróleo, siderúrgicas e outras instalações industriais poluentes. A detecção é baseada na luz, já que cada tipo de gás tem um padrão único de absorção da luminosidade. Ao comparar os dados com imagens da área monitorada é possível identificar a fonte do CO2. Os clientes do satélite são agências reguladoras governamentais espalhadas pelo mundo.

 

CO2 visto de cima (III)

A GHGSat mantém em órbita, desde 2016, uma “frota” de satélites que monitoram as emissões de metano, outro gás que provoca o efeito estufa e o aquecimento da terra. Com esta tecnologia, a empresa detecta vazamentos em gasodutos, emissões furtivas de aterros sanitários e até mesmo volumes de gás do arroto das vacas. Os dados servem principalmente para empresas de petróleo e gás que querem prevenir desastres, evitar perda de produção e reduzir a pegada de carbono. O metano fica em camadas mais baixas da atmosfera enquanto o CO2 se concentra em uma faixa mais alta.

 

ESG em dólar

O Brasil foi captar dinheiro internacional com o lançamento do primeiro título da dívida pública classificado na categoria sustentável. A emissão do ativo Global 2031 ESG, com vencimento em 2031, ocorreu na segunda-feira (13) e resultou em negócios de US$ 2 bilhões, com taxa de juros de 6,5% ao ano. O valor arrecadado pelo Tesouro Nacional deverá financiar ações do governo brasileiro no tripé ambiental, social e governança (ESG).

 

(Foto: Juliana Amorim/Unsplash)

 

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