De um ponto a outro, a linha caminha, reta, para chegar primeiro. Essa personagem apressada, ou lenta, é rainha no reino da criação! Contorna rostos, determina caminhos, separa culturas diversas nos mapas coloridos. Quem é essa criatura poderosa? Dizem que é apenas uma sucessão de pontos colocados uns ao lado dos outros. Nesse caso, poderosos seriam os pontos?
O que seria da música sem o pentagrama! Cinco linhas inseparáveis que guardam entre si a mesma distância e sustentam, como pássaros nos fios de luz, as bolinhas, com perna e sem perna, brancas e pretas que dão voz à música, mediam a paixão dos compositores por distâncias inimagináveis que permeiam e encantam as almas dos seres viventes.
“El Toro”- Pablo Picasso-1945
O que seria da escrita sem os símbolos tão diversos criados por culturas tão antigas! As linhas longas e curtas, fechadas e abertas, soltas ou ligadas que conferem ao homem a capacidade de comunicar seu pensamento por distâncias igualmente inimagináveis! Elas, as linhas tão finas, poderiam dizer como a serpente do Pequeno Príncipe “sou mais poderosa que o dedo de um rei”.
E os desenhos? O que seria deles sem as linhas? Vagariam como almas penadas pelo universo sem poder se realizar! Os pobres artistas teriam que se contentar com manchas e pinceladas, “esses seres sem muita definição”, diriam elas, as poderosas linhas! Imagina Guernica de Picasso, e o seu estudo do touro? O que seria deles? Shel Silverstein, autor e ilustrador de “The Missing Piece Meets the Big O” (Harper Collins Publishers), nos leva a acompanhar seu encantador personagem triangular, composto de linhas e um único ponto, em sua busca por complementação geométrica de maneira a poder rolar. O autor consegue com linhas, pontos e pequenas frases, lindamente interdependentes, nos guiar por sua linha filosófica “direto ao ponto”.
“Retrato do João” – Elizabeth Titton – 1981
O que seria da matemática? Os algarismos romanos, feitos de “pauzinhos”, assim como os arábicos, nos permitiram a abstração, salvando-nos de carregar pedras, moedas ou outros elementos para fazermos as contas que fazem nosso mundo girar e ser compreendido, aos poucos, por nós, seres de lento aprendizado. O que seria das ciências, da economia, sem os gráficos com suas poderosas curvas?
Até mesmo as linhas de bordado e costura permitiram aos humanos se proteger do frio e das intempéries!
Da prática, até os mais altos pensamentos e abstrações, temos sido dependentes dela. “Desde que o mundo é mundo”, muito antes de termos tomado consciência de sua existência e poder, a linha, e por que não o ponto, já se apresentavam como elementos fundamentais da criação e sua expressão!
(Imagem de abertura: “Cabeça de Cavalo”- Cândido Portinari-1955)
Leia outras colunas da Elizabeth Titton aqui.