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29/03/2024



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A percepção na prática

 A percepção na prática

Na semana passada, comentei a importância de se perceber o mundo como fonte de enriquecimento interior. Hoje, gostaria de apresentar algumas questões práticas que nos impedem de ver o mundo com melhor qualidade e, se assim desejarmos, até passar a representá-lo e compartilhá-lo usando o desenho como forma de expressão.

 

A maioria das pessoas não tem deficiência visual ou auditiva e por isso acha que ouvir e ver são capacidades naturais. Os olhos e ouvidos sadios o são, mas não as capacidades de ver e ouvir. Estas são aprendidas a partir do nascimento e vão sendo aprimoradas até um dado momento em nossas vidas quando, de certa forma, estacionamos, paramos de evoluir.

 

Exemplificarei, primeiro, a audição. Quando você enche uma garrafa de água, percebe que o barulho da água entrando nela vai se modificando à medida que vai ficando cheia, o que indica que, se você não quiser que ela transborde, deve tirar a garrafa de debaixo da torneira. Esse conhecimento sobre o som da água na garrafa foi aprendido pela experiência. Assim também aprendemos o barulho de um ônibus freando, o da porta batendo, do filho chamando. Reconhecemos esses sons porque fomos aos poucos estabelecendo uma relação entre a observação das ocorrências e os sons então percebidos. Se tivéssemos nascido e vivido numa floresta, sozinhos, não saberíamos identificar esses sons. Quando uma pessoa vai perdendo a audição e precisa usar um aparelho auditivo, passa a ter dificuldade de reconhecer os sons porque o aparelho os modifica ou amplia. Será, então, preciso reaprender a ouvir.

 

Assim acontece, também, com o olhar. Para que não precisemos olhar atentamente e reconhecer cada objeto ou elemento do mundo que nos rodeia toda vez que nos deparamos com ele, acabamos por criar símbolos para representá-los, criamos ideias das coisas e, no dia a dia, nos utilizamos desse entendimento. Vamos ao exemplo: pense no rosto do seu filho, da sua namorada, esposo, pai ou mãe, alguém com quem você convive ou até você mesmo, que se olha no espelho todos os dias. Saberia desenhar esse rosto de memória? Sem o olhar detalhadamente? Saberia exatamente a forma dos olhos, da boca, do nariz? Você poderia me dizer que não, porque não sabe desenhar, mas eu diria que não sabe desenhar, porque não sabe ver.

 

Lembra dos símbolos de que falei acima? Quando nos deixamos levar pelo pensamento, por aquilo que pensamos serem as coisas, ao invés de olharmos atentamente para elas, para seu formato, tamanho, inclinações das linhas das quais são formadas e que as distinguem dos outros objetos, acabamos nos utilizando desses símbolos que criamos mentalmente. Assim, quando desenhamos o rosto, costumamos desenhar os olhos em forma de folhas com um círculo no meio, a boca como um “M” na parte superior e uma curva na parte inferior etc. Mas, se olharmos detalhadamente o formato das linhas que compõe esse rosto e a relação de distância entre uma e outra, descobriremos como são ricas e bem diferentes dos símbolos que criamos.

 

Faça uma experiência! Olhe para alguma coisa ou alguém com esse olhar inquiridor, perceptivo. Desenhe!

 

A obra que ilustra esse texto foi criada por um jovem participante da oficina “Desenvolvendo o olhar” ministrada por mim (modelo) na FUNARTE S.P. por ocasião da mostra “MUIRAPIRANGA”, em 2019. Lamento não ter o nome do autor que realizou lindamente esse exercício – desenhando sem tirar o lápis do papel –, proposto por Betty Edwards em seu livro “Desenhando com o lado direito do cérebro”.

 

 

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