Hoje pela manhã, procurando entre meus já amarelados livros um poema para compartilhar aqui, por ocasião dessa data em que se comemora o “dia dos namorados”, tive um pouco de dificuldade, pois segundo consta, esse dia é um dia alegre quando os casais comprometidos pelos mesmos sentimentos se encontram, comemoram e se presenteiam.
Qual não foi a minha surpresa, quando mergulhada nos conhecidos e aclamados poetas do amor, percebi serem, em sua grande maioria, levados por um sentimento de desconforto, usando para traduzir esse sentir, palavras e expressões de dor, de dúvida e de perda! Seria o amor fonte de sofrimento?
Segue aqui o que encontrei de menos doloroso, de Tagore, em “O jardineiro”:
O meu coração ave do deserto, encontrou o céu nos teus olhos.
Eles são o berço das madrugadas e o reino das estrelas.
Os seus abismos devoram os meus cânticos.
Deixa-me pairar nesse céu imenso e solitário. Deixa-me varar as suas nuvens e desdobrar as minhas asas ao sol.
Mesmo nesse pequeno poema, um pouco mais abstrato que carnal, encontramos a percepção da solidão dos abismos e do deserto.
Fiquei divagando entre os conceitos de namoro, amor e paixão. Como não sou filósofa, busquei algumas definições, sendo as mais comuns as de que o namoro é uma fase de curiosidade, de busca de conhecimento, cheia de “boa vontade” para com o outro. Já o amor, sempre com “A” maiúsculo, evoca entrega, doação, um sentimento mais perene e construído, que tenta manter a chama ardente da paixão enclausurada na redoma do equilíbrio. A paixão, no haicai de Alice Ruiz:
Paixão
Xama
Paixão
A paixão, esse sentimento livre e desvairado, ignora as regras dos bons costumes e da retidão. É nesse mar, enfurecido, de ondas gigantescas, de dualidades, euforia e dor que se encontram a maioria dos cantos de amor. Com essa breve descrição deixo aqui, para sua meditação, “Eu e Você” de Paul Géraldy, na obra “Expansões”:
Eu gosto de você!
Compreende? Eu tenho por você uma doidice…
Falo, falo, nem sei o quê,
mas gosto, gosto de você
Você ouviu bem o que eu disse?…
Você ri? Eu pareço um louco?
Mas que fazer para explicar isso direito, para que você sinta?… O que digo é tão oco!
Eu procuro, procuro um jeito…
Não é exato que o beijo só pode bastar.
Qualquer cousa que me afoga, entre soluços e ais.
É preciso exprimir, traduzir, explicar…
Ninguém sente senão o que soube falar.
Vive-se de palavra e nada mais.
Mas é preciso que eu consiga essas palavras e que eu diga, e você saiba… Mas, o quê?
Se eu soubesse falar como um poeta que sente, __diga! __diria eu mais do que quando tomo entre as mãos essa cabeça linda e cem, mil vezes, loucamente, digo e repito e torno a repetir ainda:
Você! Você! Você! Você!…
Depois de tanto amor e dor, tantos eu e você, o nós, pronome que expressa o encontro vai ficando para mais tarde, para muito tempo depois do dia dos namorados, “Para o tempo da delicadeza”, como propõe Chico Buarque.
(Imagem: Obra desta colunista “Prá esperar o amor”, 1997. – Fotografia de Sergio Sade)
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