Nunca me interessei por câmeras fotográficas ou filmadoras; as “Instamatic” serviam muito bem ao meu propósito, nada de ajustar lentes ou velocidade, coisas que hoje, com o advento do celular, para nós os leigos, ficou bem mais simples. As pessoas, ao saber do fato, sempre se admiravam, dizendo não compreender, já que, como artista, eu deveria, naturalmente, “ter bom olho” para fotografia. Hoje entendo que a fotografia para mim importava mais para registrar as cenas que viriam as ser as memórias do futuro, congelar o momento, e não pela beleza das imagens ou as cores, em si. O olhar que se dirigia ao mundo, trazia para meu interior – às vezes, selecionando cuidadosamente o objeto foco da atenção consciente, outras vezes invadido pela percepção inconsciente – um universo muito rico, não só através desse olhar mas, de todos os sentidos. Essa é uma constatação recente, que explica muita coisa em minha vida, mas, ainda dessa vez, esse assunto fica para uma outra oportunidade.
A arte me veio pelas mãos, pelo toque da argila e não pelo desenho; ou seja, pelo olhar. Minha, inata, boa compreensão do espaço, aliada ao aprendizado tardio das relações entre as linhas e ele, se deu por meio de Betty Edwards em seu método “Desenhando com o lado direito do cérebro” tornando, a partir de então, muito mais fácil o domínio de expressar, artisticamente, desejos e poesias interiores. Minha criação, inicialmente muito intuitiva, interessava-se mais fortemente pelas histórias do que pela maneira de contá-las.
Essas análises me vieram à mente, no final de semana, por causa de dois filmes que assisti sobre Steven Spielberg: um sobre sua vida em família na infância e adolescência e outro sobre sua carreira como cineasta onde se discutia, entre outros temas, seus processos criativos. Fiquei a pensar em como as formas podem levar aos conteúdos que se deseja e como cada ser escolhe ou se deixa escolher pelas ferramentas que o levarão a expressar a sua arte. Acho esse tema fascinante, dada a quantidade de variáveis que levam a diferentes caminhos e meios a serem percorridos na busca de cada indivíduo que visa traduzir suas únicas e ricas formas de estar no mundo.

Na mesma semana, havia sido fortemente impactada pela qualidade e singularidade da magnífica arte que pude fruir da generosa produção de Poty Lazzarotto (1924-1998), em minha visita às exposições que acontecem nos espaços do MON (Museu Oscar Niemeyer) nesse momento. A de Poty, por ocasião do centenário do artista, denominada “Trilhos e Traços – Poty 100 anos” (curadoria de Maria José Justino e Fabricio Vaz Nunes) com aproximadamente quinhentas obras, parte das quatro mil doadas pela família ao museu.
Por que a admiração? Poderiam perguntar alguns, já que a sua arte e qualidade são sobejamente conhecidas por nós, paranaenses. O fato é que fiquei surpresa com a naturalidade do artista ao se manifestar com extrema beleza de linhas e soluções plásticas em toda e qualquer das muitas peças de sua produção ali expostas, fosse qual fosse a técnica por ele, ali, utilizada, desde o desenho, passando pela gravura, as ilustrações, os vitrais e os poucos tridimensionais (presentes na mostra). Tudo esplêndido, vindo da alma, jorrando com uma caligrafia que não demanda nenhum esforço, nenhum subterfúgio ou sofisticação. Verdade e coerência, originalidade, forma e fundo, ali, tramadas com tamanha naturalidade, sem “lombadas” ou tropeços, tudo apenas ARTE! Me encantou! Fiquei feliz!
Seja qual for o tipo de olhar ou a forma de expressão escolhidos pelo criador e percebidos pelo observador, o que não se pode negar é o fato de que A ARTE IMPORTA!
(Ilustração de abertura: “Sem título ” – Poty Lazzarotto – auto-retrato – bico de pena- 1973 – Mostra “Trilhos e Traços – Poty 100 anos/ MON)
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