Esse é um tema literalmente infinito! Já que tudo, mas tudo mesmo, é passível de transformação. Quando olhamos para o céu, por exemplo, e vemos as estrelas, lembramos que elas, lá, tão distantes em tempo e espaço, o são também em conhecimento. Conhecemos muito pouco das “nossas” estrelas, mas sabemos o suficiente para ter consciência de que estão em constante transformação.
Nas artes, que é o nosso tema, a transformação está na própria essência. Os sentimentos e as criações, que são em princípio abstratos, passam a existir por meio das técnicas e dos materiais que os representam e que, ao serem colocadas em sua materialidade, vão se transformando e recebendo novas roupagens, próprias daquelas técnicas e meios escolhidos pelos artistas em seus processos de realização. As próprias linguagens escolhidas, de tempos em tempos, podem variar, fruto das mais diversas razões, tais como a invenção de novas ferramentas, evolução dos materiais e novas tecnologias, bem como o próprio pensamento de uma época, influenciados por questões políticas, sociológicas e ambientais, por exemplo. E por falar em ambiente, a natureza da Terra, nosso planeta, é um exemplo de constante transformação e a arte, que reflete a vida do artista em seu meio, acompanha as belezas e as tragédias que a natureza nos apresenta, usando dos mais ricos elementos e técnicas a seu dispor em um determinado período.
Essa semana tomei emprestado à minha amiga, Diana Carneiro, ilustradora botânica, um livro que é o catálogo de uma coleção de flores feitas em vidro, que pertencem à Universidade de Harvard. “The Glass Flowers at Harvard” é a bela documentação histórica e fotográfica da coleção criada por Leopold Blaschka e Rudolf Blaschka (pai e filho), que viveram em Dresden, na Alemanha, nos anos finais de 1800 e início dos 1900, encomendadas e doados para o museu botânico da universidade. É a mais incrível e inacreditável representação realista de espécies vegetais feitas em vidro. Os modelos de plantas, criados entre 1887 e 1936, são de uma beleza indescritível! As técnicas, conhecimento e habilidade desses dois artistas – que com a finalidade de manter vivas as cores, formas e a beleza das flores, congelaram no tempo, por meio da transformação em vidro, a natureza perecível – criaram em torno de 780 espécies de plantas, em seu tamanho natural, nos mínimos detalhes, de pequenos espinhos a extraordinárias texturas e cores, com precisão científica admirável.
Transformar para eternizar. No caso, a perecibilidade das flores. Eternizar é o desejo e sonho do ser humano, que compreende o quão curta é a sua passagem por esse nosso planeta e quão fugazes são a juventude, pensamentos e suas criações. Por isso, a importância dos museus e das bibliotecas, entidades tão respeitadas. Quanto mais civilizados são os povos, tanto mais respeitados são esses templos destinados a salvaguardar as transformações acontecidas no trajeto do homem pela Terra. Mesmo durante as guerras, é convencionado que os monumentos históricos e esses lugares “sagrados” devem ser respeitados. Os seres podem morrer, mas sua trajetória deve ser resguardada!
Temos imensa dificuldade em aceitar as transformações e as instabilidades. Cada geração afirma, em tom de lamentação, que “bons eram os seus tempos!”. Tempos de juventude, de realização que, ao envelhecermos, dá lugar à irremediável transformação e substituição por novos olhares, novas percepções, fruto de experiências forjadas no fogo de novas eras.
O céu, que apesar das mudanças dos tempos nos parece ser sempre igual, nem mesmo ele é capaz de tal feito, pois elas, as magníficas estrelas, não estão a salvo de mortes e nascimentos, girando na eterna dança da transformação do firmamento.
(Imagem de abertura: Brownea rosa-de-monte (Berg)-foto de Hillel Burger)
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