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02/05/2024



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Vivências com a criança e sua arte

 Vivências com a criança e sua arte

Hoje, no último dia do mês de outubro, gostaria de permanecer no assunto da arte e a criança, já que acredito ser a infância um momento especialmente rico para a formação e o desenvolvimento humano.

 

Capturada pelo modus operandi da criança, no caso, meu neto, prestes a completar cinco anos, durante sua visita à minha casa na semana passada e algumas outras vivências recentes com crianças um pouco mais velhas nas oficinas de criação que ministrei em escolas públicas no interior do estado, por ocasião da itinerância de minha exposição Muirapiranga pelo Paraná (2022/23), pude observar bastante e ouso, aqui, fazer algumas análises leigas sobre essas experiências.

 

Pedro, meu neto, que não mora em Curitiba, chegou com a novidade das dobraduras em papel. Queria mostrar seus novos talentos, fazendo seu próprio avião. Ao fazê-lo, ia explicando e ensinado o processo ao espectador. O que mais me surpreendeu foi que, ao passar para outra dobradura, explicou que teríamos que partir de um papel quadrado e mostrou como se faz para transformar um formato A4 em quadrado. Depois disso, foram dias brincado com os veleiros feitos de fita crepe e palitos de churrasco, com a incansável ajuda do pai, ficando o resto totalmente por conta de sua imaginação inspirada no filme “A fera do mar”.

 

Criança participante do Projeto Muirapiranga no Paraná. (Foto de Celso Margraf)

 

Outro momento que me surpreendeu foi que, ao brincar com os barcos ao som da música do referido filme, que tocava no celular do pai, Pedro narrava, reproduzia e corrigia a entrada dos personagens na história, de acordo com a sequência musical. Concluí que, vivendo num ambiente musical, já que seu pai é violinista, e ele, embora não tenha aulas de instrumento, mas com acesso a vários instrumentos musicais desde que nasceu, consegue perceber na música uma linguagem familiar, com significados claros, como se estivesse lendo um livro, onde os personagens e as situações são criados pela narrativa do autor.

 

Uma experiência distinta foi vivida nas escolas de Cascavel, Toledo e Ponta Grossa, com turmas de aproximadamente trinta alunos cada, de origem familiar heterogênea, quando tive a alegria de vivenciar a curiosidade, a atenção e a participação dos seis diferentes grupos de alunos com os quais tive a feliz oportunidade de trabalhar na ocasião.

 

A proposta era o processo de criação, baseado em três momentos: a observação, a transformação e a imaginação. O ponto alto dos encontros se dava no momento em que o objeto de cerâmica, oferecido como modelo para observação e representação em desenho livre, usando grafite e lápis de cor sobre papel branco, era atirado ao chão, por mim, rompendo a peça e a concentração das crianças, causando-lhes enorme surpresa, já que estão habituadas a não quebrar coisas. Passado o susto, comentários divertidos e movimentação pelo espaço, mostro-lhes que podemos criar uma nova obra com os cacos da cerâmica. A partir daí as crianças são chamadas a uma nova aventura: rasgar os desenhos que produziram com o maior esmero! Isso sim causava um susto e um estado de indagação. Olhavam uns para os outros, comentavam, mas logo em seguida, com enorme desprendimento, a meu ver, rasgavam, rindo, seus desenhos, prontos para o passo seguinte. Apenas um menino, dentre os cento e oitenta participantes pediu para não rasgar o seu. Era um desenho bem pequeno, como seu autor. Desenho em grafite com sombreado, sem cor, colocado bem no centro da folha de papel. Nesse caso, pedi a sugestão da turma para resolver a questão. O colega ao lado imediatamente se ofereceu para resolver o problema rasgando, ele mesmo, o desenho do amigo. Expliquei que essa não era a questão e solicitei outras soluções. Surgiram várias. O pequeno autor, então, se levanta de sua carteira e pergunta: “Posso recortar a folha, retirando só o desenho para eu guardar e rasgar o resto da folha de papel?” Perguntei aos colegas o que achavam da proposta e todos concordaram alegremente, prontos para seguir com o trabalho, que seria o de criar outra obra com os pedaços rasgados sobre uma cartolina colorida, podendo usar tesoura, cola e todos os recursos de lápis e canetinhas disponíveis. Antes de retomar o trabalho, o pequeno menino se levanta, pega o desenho e vai até a sua mochila, onde guarda seu “tesouro”, enquanto seus colegas, totalmente alheios à sua movimentação e suas emoções, seguem na produção de suas próximas criações. Alguns optaram pela restauração do desenho original sobre a folha colorida, acrescentando textos, cores e outras intervenções. Já o menino, com a sua obra sã e salva, volta quietinho para a carteira, dedicando-se a fazer em pedaços o que restou daquela folha de papel, agora sem o desenho, e se preparando, de coração e mente abertos, para a nova criação.

 

Grande lição de paixão, generosidade e desprendimento me deram aquelas crianças! Viva a infância!

 

Turma com o livro que receberam pelo projeto Muirapiranga no Paraná . (Foto Celso Margraf)

 

Leia outras colunas da Elizabeth Titton aqui.

 

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