O punk californiano sempre foi uma incógnita. As vezes empolga, as vezes incomoda. Mas sejamos honestos. Quando se trata do Offspring, a coisa muda. Seu terceiro álbum, Smash, lançado em abril de 1994, marcou uma geração com hits sensacionais, com um hardcore/punk avassalador e coeso. Dexter Holland (vocais e guitarra), Noodles (guitarra), Greg K (baixo) e Ron Welty (bateria) lançaram um petardo que vendeu mais de 11 milhões de cópias.
Time To Relax, um spoken word introdutório, parodia aqueles álbuns de autoajuda ou sessões de relaxamento. A trilha calma e o narrador sereno contrastam completamente com o que vem a seguir, criando um efeito irônico e sarcástico. “You are now ready to begin your journey through the world of music…”. E aí o caos começa.
Nitro (Youth Energy) começa com um riff explosivo e já dá o tom do álbum. É uma ode à adrenalina da juventude e à sensação de imortalidade típica da adolescência. A bateria acelerada e os vocais de Dexter Holland exaltam essa energia, quase como um chamado à ação. O refrão é daqueles que gruda: “Our time has come, We’re gonna break out the rules”.
Bad Habit é uma das faixas mais polêmicas do álbum. Fala sobre “road rage” (raiva no trânsito), com uma letra carregada de xingamentos e violência. O clima tenso cresce até explodir no famoso trecho em que Dexter grita: “You stupid, dumbshit, goddamn motherfucker!”. Aqui, a banda satiriza comportamentos impulsivos e agressivos, numa crítica ácida mas envolta em sarcasmo.
Gotta Get Away, mais introspectiva, essa faixa trata de ansiedade e a sensação de estar sendo pressionado por forças externas, algo que muitos jovens se identificam. A linha de baixo e os riffs marcantes criam uma atmosfera opressiva que combina com a temática da canção. O refrão, “I gotta get away from me”, diz muito sobre crises internas.
Genocide é uma crítica feroz ao conformismo social e à alienação. A banda questiona o papel da sociedade em produzir violência e destruição em massa, mesmo em tempos de paz. Musicalmente, é uma pancada, rápida, agressiva e com vocais alternando entre melódicos e gritados. É uma faixa que remete às raízes hardcore da banda.
Something To Believe In tem riffs cortantes e uma linha de bateria intensa. Fala sobre desilusão com figuras de autoridade e a constante busca por algo em que se possa acreditar, seja religião, política ou ideologia. O vocal vem em um tom quase desesperado, refletindo o vazio de confiar e ser traído.
Come Out and Play (Keep ‘Em Separated) é o grande hit do álbum e um dos maiores sucessos da carreira da banda. Mistura punk com um certo groove oriental no riff de guitarra. A música fala sobre violência nas escolas e gangues juvenis, com o icônico refrão falado: “You gotta keep ’em separated!”. Crítica social feita com inteligência e ritmo viciante.
Self Esteem é outro clássico, com um tom mais melódico e letra confessional. Fala de um relacionamento abusivo e da baixa autoestima, que sabe que está sendo manipulado, mas não consegue sair. A honestidade crua da letra é sensacional.
It’ll Be A Long Time traz de volta a velocidade e agressividade. Questiona o futuro da humanidade com um senso de urgência: “When will we laugh again? When will we dance again?”. A faixa toca em temas como destruição ambiental, corrupção e guerra, tudo embalado em um instrumental acelerado e visceral.
Killboy Powerhead é um cover do grupo The Didjits. Cover curto e direto, com pegada punk/hardcore pura. A banda injeta energia na canção original, mostrando seu apreço pelas influências do underground e pelo espírito “faça você mesmo”. Não traz a profundidade lírica das demais, mas funciona bem como descarga de adrenalina.
What Happened To You? é um ska/punk. Tem um ritmo mais leve, quase dançante, mas ainda carrega crítica. Fala sobre autodestruição, vícios e mudanças negativas de personalidade, com ironia: “You used to be such a sweet, sweet thing, But now you seem so sincere”. Funciona como um respiro antes do final arrasador.
So Alone tem um pouco mais de 1 minuto, mas com impacto. Hardcore clássico, rápido e furioso, quase uma explosão de angústia e alienação. Serve como uma transição caótica para o encerramento.
Not The One aborda o sentimento de não se encaixar, de não ser aquele que os outros esperam que você seja. Tem um ritmo mais cadenciado, mas ainda energético, e questiona valores impostos socialmente. A sonoridade acompanha essa tensão, com guitarras mais abertas e refrão que contrasta com os versos.
Smash, a faixa-título, é a mais longa e funciona como um fecho reflexivo. Dexter canta sobre se libertar de amarras e reconhecer seu próprio valor. O instrumental cresce aos poucos, alternando peso e melodia. A frase “I just want to smash it up for everyone” sintetiza a atitude do álbum: destruir convenções e se afirmar no caos.
Time To Relax (Reprise) encerra o álbum retomando a narração da faixa 1. A mesma voz tranquila agradece por ouvir o álbum, encerrando com um tom sarcástico. Um toque final que reforça o senso de humor ácido do disco.
Smash é um álbum coeso, crítico, energético e sincero. Consegue unir velocidade, atitude punk, letras afiadas e momentos melódicos sem perder a força. É um trabalho que capturou o espírito de uma geração desencantada e mostrou que bandas independentes podiam alcançar o topo das paradas com integridade. Um verdadeiro marco dos anos 90. Um marco no rock’n’roll. Do bom e velho rock’n’roll.
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