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Crônica de uma obsessão automotiva (Parte 2): um breve período em 2 rodas…

28/10/2024
sonho

Ainda nos meados dos anos setenta, eu, com meus nove ou dez anos, vivia em um mundo onde meus tios apareciam frequentemente com carrões e motocicletas de grandes cilindradas. Um dia, um deles trouxe uma Setentinha Sport da Honda. Pequena, sem embreagem, era fácil de pilotar e logo fui autorizado a dar as minhas primeiras voltas no grande jardim dos meus avós. Naquela noite, todos saíram para jantar e eu fiquei. Pedi antes permissão para dar mais algumas voltas, e foi concedido. A sensação de andar à noite, com o farol aceso, foi indescritível. Andei até perceber que o pessoal estava voltando, então estacionei rapidamente e fui feliz para casa.

Alguns anos depois, meu irmão mais velho ganhou uma Setentinha convencional, não era a Sport. A principal diferença ficava no formato e posição do escapamento. Para minha alegria, agora tínhamos uma moto em casa. Como caçula, em teoria, eu tinha que seguir as regras, disponibilidade e humores do meu irmão mais velho, que determinava quando e quanto tempo eu poderia andar. Isso durou pouco… Não achava justo que ele saísse de carro e deixasse a moto lá, parada, sem chave. Assim, tive a brilhante ideia de fazer uma cópia da chave. A primeira tentativa não funcionou, mas, persistente, voltei e pedi para refazer e fazer mais umas três cópias. Desta vez, funcionaram perfeitamente. Passei a usar a moto quando meu irmão saía, aventurando-me além do terreno, pelas ruas da quadra. Na garagem, havia um galão com gasolina azul para abastecer. Eu ia ao posto algumas vezes para completar e deixar menos pistas do meu uso. Até o cabo do velocímetro eu desconectava para não alterar a quilometragem. Como toda alegria dura pouco, uma hora ele descobriu e exigiu minha chave, que entreguei. Mal sabia que eu tinha mais cópias!

Algum tempo depois, ele foi presenteado novamente, desta vez com uma Yamaha DT250 Trail, motor de 2 tempos, que rivalizava na época com a Honda XL 250, que meu tio também possuía. Com treze ou quatorze anos, aprendi rapidamente a pilotar. As regras de uso permaneciam as mesmas, dependendo do humor e disponibilidade do meu irmão. Naturalmente, providenciei algumas cópias da chave para casos em que ele se esquecesse de deixar a original comigo.

Lembro-me de uma vez em que ele saiu e usei minha chave. Peguei um amigo que morava na mesma rua e ele foi na garupa. Como essa motocicleta era maior, estendi meu percurso, desbravando ruas e praças sem pavimentação, afinal, era uma moto Trail. Perdi a noção do tempo e meu irmão a esta altura já havia chegado em casa e percebido a ausência da moto. Ele pegou o carro e começou a me procurar nas redondezas. Lembro-me de cruzar com ele em uma esquina e entrar rapidamente na casa dos meus avós, cujo portão ficava aberto. Desci da moto e procurei abrigo, pois a bronca seria grande. Sobrevivi.

Ele tinha uma turma grande de amigos, e todos tinham motocicletas. Certa ocasião, com meu irmão na garupa, pilotei uma Yamaha RD350, a tal viúva negra que em segunda marcha passava dos 80 km/h.

O ano acabou, e a Setentinha ainda não havia sido vendida. Em janeiro, era temporada de praia, e o Mercadinho 608D da empresa foi utilizado para levar nossas motocicletas e as de toda a turma do meu irmão. Fiquei extremamente ansioso, pois motocicleta na praia era algo incrível. Antes da viagem, passaram um tipo de óleo nas motocicletas para protegê-las da maresia. Quando vi a Setentinha toda esfumaçada, perguntei o que havia acontecido e disseram que haviam fundido o motor. Maldade pura para me fazer chorar.

Passado o susto, alguns dias depois, chegamos à Vila Olga, casa da família em Caiobá, junto com o caminhão. Mal pude esperar a Setentinha ser desembarcada. Subi nela com destino à Ilha do Farol, mas uma cratera na rua, a apenas 150 metros de distância, abreviou o primeiro passeio. A moto acertou a cratera, eu caí, e lá se foi o paralama da roda dianteira e algumas escoriações no joelho e braços. Por sorte, bastou tirar o paralama e tudo ainda estava funcional. Foi uma temporada inesquecível. Eram vários tanques por dia e não havia fiscalização alguma. Ia para Matinhos e depois até o Ferry Boat, inúmeras vezes, sem capacete e de sandálias havaianas. Eram os anos 70.

Mas tudo um dia acaba. No final de 1978, meu irmão e meus primos bateram o carro, e para arcar com o conserto, as motocicletas foram vendidas.

Continua….

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