A liminar que devolveu ao Governo do Paraná o direito de construir a tão esperada ponte que vai ligar Matinhos a Guaratuba, no nosso Litoral, pode ser considerada uma aula da magistratura paranaense.
De uma canetada só, o Desembargador José Laurindo de Souza Netto (foto), presidente do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), colocou os “pingos nos is” e estabeleceu, com exímia competência, os limites que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) deve respeitar.
Tal qual a anciã expressão “a César o que é de César”, o desembargador lembrou que cabem, aos Tribunais de Contas, “exercer a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial” da administração pública e que, portanto, não são permitidos aos Tribunais de Contas, sustar contratos.
Vale lembrar que foi justamente o que fez o TCE quando, no dia 15 de dezembro, por meio de medida cautelar, suspendeu a execução do contrato firmado pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER-PR) com o consórcio de empresas licitado para a construção da Ponte de Guaratuba.
“O ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, isto é, depois de instada a Administração Pública, se não houver a correção da irregularidade, o Tribunal de Contas comunicará o fato à casa legislativa, a qual caberá, direta e privativamente, adotar o ato de sustação e solicitar ao Poder Executivo as medidas cabíveis”, ensina o Desembargador José Laurindo.
O Desembargador prossegue na “aula” lembrando que a Constituição atribui aos Tribunais de Contas a competência para sustar atos administrativos, sendo o procedimento licitatório uma sucessão de atos administrativos. No entanto, frisa o Desembargador, “em matéria de contratos, a Constituição não atribui aos Tribunais de Contas essa mesma competência, de modo que, estando formalizado o contrato, o ato de sustação cautelar competirá ao Poder Legislativo”. Trocando em miúdos, cada macaco no seu galho.
Em outro trecho, o Desembargador pulveriza definitivamente a inexistente competência do TCE para sustar o contrato entre o Governo do Paraná e a empresa vencedora da licitação, citando que a Constituição Estadual prevê que “no caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pela Assembleia Legislativa, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis”.
Nesse ponto, já é possível citar que a apressada decisão de sustar o contrato partiu do gabinete do Conselheiro Maurício Requião, que acabou de tomar posse no conceituado órgão de fiscalização paranaense.
Dessa forma, talvez seja possível atribuir à inexperiência do novato Conselheiro o didatismo empregado pelo Desembargador José Laurindo em sua decisão.
Tal qual um mestre ensina a um aluno a escrever, o desembargador lembra que o próprio Regimento Interno do Tribunal de Contas da União estabelece, como não poderia deixar de ser, que, “no caso de contrato, o Tribunal comunicará a ilegalidade ao Congresso Nacional, a quem compete adotar o ato de sustação e solicitar ao Poder Executivo as medidas cabíveis”. Bastaria uma simples consulta, portanto, para não incorrer em erro.
A importância da obra para o Litoral do Paraná não foi deixada de lado pelo Desembargador. “O periculum in mora, além disso, é evidente, tendo em vista que, se persistir o ato coator, haverá atraso no cronograma global de execução da obra de construção da Ponte de Guaratuba, que consiste em antiga demanda da população paranaense e está prevista na Constituição do Estado”.
Por fim, o magistrado leva em conta a necessidade de se considerar o perigo na demora da obra, caso mantida a decisão do TCE e a consequente sustação da execução do contrato, “tendo em conta a segurança da população, os danos ambientais e o aumento dos valores da obra”.
E dá tempo, ainda, de mais uma aula, ao citar a importância de se considerar as consequências práticas de uma decisão: “Na perspectiva do consequencialismo jurídico, é mister que o julgador tenha atenção aos resultados práticos advindos dos comandos emanados, guiando-se, também, a partir de um referencial de responsabilidade socioeconômica”.
Sem dúvida uma aula de direito, parabéns Desembargador José Laurindo. Os paranaenses agradecem.
Parabéns ao Desembargador José Laurindo, não pela sua relevante presidência no TJPR, mas sim, por tão importante decisão emanada, o que além de “destravar” a já atrasada infraestrutura do estado, deixa um alerta jurídico de grande importância à um estado eivado pelo marasmo de seus governantes