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25/04/2024

POLÍTICA

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Em 13 anos, Lei da Ficha Limpa levou à perda de apenas 7 mandatos

 Em 13 anos, Lei da Ficha Limpa levou à perda de apenas 7 mandatos

O indeferimento de uma candidatura e a consequente perda de mandato com base na Lei da Ficha Limpa alcançam um universo restrito de políticos. O caso mais recente de aplicação da legislação após o resultado das urnas deu-se com a cassação do cargo de deputado federal de Deltan Dallagnol (Podemos). Ao longo das últimas quatro eleições, apenas sete eleitos tiveram de deixar as cadeiras conquistadas em razão de uma decisão da Justiça Eleitoral.

 

O número que ilustra a excepcionalidade da situação de Dallagnol deriva de levantamento feito pelo jornal O Estado de S.Paulo, a partir do cruzamento de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com o DivulgaCand, plataforma que também pertence à Corte. Em essência, a Lei da Ficha Limpa proíbe que políticos com condenações em órgãos colegiados possam disputar uma eleição.

 

Ao considerar os pleitos de 2016, 2018, 2020 e 2022 – dados disponíveis –, apenas 0,0006% dos 1.113.070 pedidos de registros de candidaturas foram barrados após um pleito. O impacto da Lei da Ficha Limpa, porém, é maior antes da disputa. No período, 4.603 candidatos foram impedidos de chegar às urnas com fundamento na legislação. Em termos percentuais, pode-se dizer que as regras vetaram 0,41% dos candidatos.

 

A atuação profilática da Lei da Ficha Limpa, em vigor desde 2010, é elogiada por especialistas. “Hoje, em todas as campanhas eleitorais, os candidatos afirmam que são ‘ficha limpa’. A lei promoveu um debate na sociedade, no sentido de analisar a vida pregressa do candidato, para saber o que ele fez”, diz Luciano Santos, advogado e coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE). Santos também participou da construção da legislação, que se originou de um projeto de lei de iniciativa popular.

 

Márlon Reis, ex-juiz eleitoral, advogado e principal idealizador da Lei da Ficha Limpa, avalia que “o número de pessoas que se lançam como candidatas no Brasil é muito alto”. Para ele, a lei tem cumprido com o propósito de retirar do jogo político os chamados “fichas sujas”. “A legislação anterior era muito permeável. Esses números são maiúsculos, se comparados com o que nós tínhamos antes”, afirma.

 

A cassação de Dallagnol, no entanto, é um ponto fora da curva. Ele é o único deputado federal que integra a lista de políticos eleitos que perderam o mandato após assumir o posto. Além do ex-procurador que coordenou a Operação Lava Jato em Curitiba, os outros seis casos são de prefeitos e vereadores distribuídos pelos Estados do Paraná, Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Ceará e Amazonas.

 

Em 2016, dois prefeitos, do Rio de Janeiro e São Paulo, foram enquadrados na Lei da Ficha Limpa enquanto ainda eram candidatos. Os dois, no entanto, foram eleitos e conseguiram assumir o mandato por meio de decisões liminares (provisórias) concedidas pela Justiça. Nas quatro eleições, ao todo 66 candidatos foram substituídos antes mesmo da eleição e as chapas pelas quais se lançaram saíram vitoriosas das urnas.

 

Críticas

Os números compilados pelo Estadão também ensejam críticas. O advogado e presidente da Comissão de Direito Eleitoral do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), Fernando Neisser, diz que o levantamento mostra que o endurecimento das punições não muda a realidade político-eleitoral.

 

“É uma tentativa, bem intencionada, sem dúvida, da sociedade e de alguns atores sociais, de encontrar respostas para problemas da política por meio da lei. É uma visão ingênua de achar que, aumentando penas e restrições, vamos ter uma política conduzida por pessoas que vão agir bem. Essa correlação não existe na prática”, afirma Neisser, que é doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP).

 

Para Neisser, a Lei da Ficha Limpa não mudou o perfil dos candidatos. “Não me parece que temos tido políticos melhores ou piores”, diz o advogado. No entanto, ele afirma respeitar a aplicação da legislação pela Justiça Eleitoral. “O Judiciário está cumprindo a lei e não tem outra opção. A responsabilidade é do Congresso Nacional, que aprovou a legislação.”

 

‘Tribunal político’

O nó do caso de Dallagnol, cuja candidatura foi indeferida por decisão unânime no TSE, é o fato de que, quando ele saiu do Ministério Público, não respondia a qualquer processo administrativo disciplinar (PAD), mas a sindicâncias e reclamações que poderiam ou não se transformar, mais tarde, em um PAD. O deputado defende a legalidade do registro, enquanto o TSE entendeu que ele fez uma “manobra capciosa” para se esquivar de acusações no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

 

Em reação, o deputado disse que foi cassado por “vingança”. “Hoje o sistema de corrupção está em festa”, disse ele, na quarta-feira (16), um dia depois da tomada de decisão do TSE. “Perdi o meu mandato porque combati a corrupção. Hoje é um dia de festa para os corruptos e um dia de festa para Lula”, afirmou.

 

O jurista Walter Maierovitch, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo, vê uma “interpretação extensiva” da lei no caso de Dallagnol. “Reclamações e representações são uma mera expectativa de processo disciplinar, não uma situação consolidada. A lei exige um processo administrativo. Então, se fez uma interpretação extensiva, em que se rasgou a Constituição”, afirma.

 

Apesar de se posicionar como crítico do trabalho de Dallagnol, Maierovitch diz que a decisão do TSE teve “odor de vingança”. Para ele, o tribunal “não foi técnico, mas político”.

 

Casos emblemáticos

Há outros casos de aplicação da Lei da Ficha Limpa com repercussão – um deles mesmo envolve o atual presidente. Em 2018, quando estava preso e condenado em duas instâncias, Luiz Inácio Lula da Silva não pôde concorrer. Na ocasião, foi substituído por Fernando Haddad, então candidato a vice, que assumiu a cabeça de chapa do PT.

 

Eduardo Cunha, que presidiu a Câmara durante o impeachment de Dilma Rousseff (PT), voltou a uma disputa eleitoral no ano passado, quando concorreu a uma cadeira da Casa pelo PTB de São Paulo. Ele enfrentou empecilhos por causa da Lei da Ficha Limpa. O registro da candidatura foi indeferido na primeira instância, mas o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) permitiu que ele disputasse, em uma votação na qual Cunha venceu por 4 a 2. Contudo, o ex-deputado foi derrotado nas urnas e não conseguiu se eleger.

(Estadão Conteúdo)

 

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