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O rock’ n’ roll de final de festa em ‘Isto É Spinal Tap’

11/10/2024

Não existe nada mais legal que o rock’ n’ roll. A atitude, os cortes de cabelo, a estampa de oncinha e a surdez temporária combinada com o torcicolo depois de passar duas horas no meio de uma multidão enlouquecida e entorpecida. Afinal, o rock foi a primeira expressão da cultura jovem, e desde os anos 1950, nos ofereceu desde Erasmo Carlos até System of a Down, passando por Jimi Hendrix, Black Sabbath e Ratos de Porão. Na era de ouro do vinil e da contracultura, o gênero dominou a indústria por muito tempo, e como não poderia ser diferente, surgiram os mitos e os clichês sobre o que rolava no backstage, entre as festas, groupies, golpes das gravadoras e acidentes de avião. É neste universo quase mágico – e em momento um pouco decadente – que o mockumentary (documentário de ficção) Isto É Spinal Tap (1984) é produzido.

O longa conta a história da banda britânica Spinal Tap, que faz uma turnê desastrosa pelos Estados Unidos para promover seu novo álbum “Smell The Glove”, acompanhada pelo diretor Marty DiBergi (Rob Reiner, o diretor real do longa), que está filmando o grupo para um documentário. Spinal Tap é formada pelo frontman David St Hubbins (Michael McKean), pelo guitarrista Nigel Tufnel (Christopher Guest) e pelo baixista Derek Smalls (Harry Shearer). Na bateria, é impossível se manter atualizado de quem está na função, já que todos os músicos que ocuparam o cargo ao longo dos anos acabaram morrendo de formas absurdas, de engasgar em vômito (mas não no próprio vômito) até combustão espontânea. Há 20 anos na estrada, desde os tempos de “iê, iê, iê”, Spinal Tap enfrenta os típicos problemas da banda de rock requentada: fracasso de vendas de discos e ingressos, brigas entre os integrantes e disputas entre namoradas e gerentes.

 

 

Os anos 80 intensificaram a onda das bandas falidas e às intermináveis turnês de despedida dos artistas que juram que desta vez é para valer. Era como se o rock’ n’ roll estivesse doente e o maior sintoma era a quantidade de laquê per capita e a bateria pirotécnica que gira do Tommy Lee. Nesse cenário de terra arrasada, o mock-doc foi uma ótima saída para representar a parada. Feito quase inteiramente na base do improviso, inspirado em documentários de rock reais, como The Song Remains the Same (1976), do Led Zeppelin, e com aquele humor pastelão característico da década, Isto É Spinal Tap é uma das coisas mais esquisitas que eu já assisti. E pensar que o diretor faria When Harry Met Sally (1989) uns aninhos depois…

Tão cômico quanto o filme foi o que rolou quando essa obra exímia da sétima arte foi lançada. Quando Ozzy Osbourne assistiu ao filme no cinema, o cantor não riu nenhuma vez. Ele pensou que se tratava de um documentário real, sobre uma banda real, e disse que a cena com a qual ele mais se identificou foi a que os personagens se perdem nos corredores atrás do palco. Steven Tyler, do Aerosmith, e Glenn Danzig, do Misfits, também se identificaram com o longa, apesar de estarem em um estado mental um pouquinho menos pior que o Ozzy para reconhecer que aquilo não era real. Já a atriz Jamie Lee Curtis teve uma reação um pouco diferente: ao ver Christopher Guest caracterizado como guitarrista do Spinal Tap, achou o cara irresistível e decidiu se casar com ele, mesmo sem conhecê-lo. O casório aconteceu no mesmo ano e o casal está junto até hoje.

 

 

O filme é bem burro, não vou mentir. Mas falo isso com todo o carinho do mundo, até porque me rendeu algumas boas risadas. Com aquele gosto de salgadinho frio e refrigerante quente e no maior clima de final de festa, Isto É Spinal Tap coloca a mão no seu ombro e te diz algo que muitos vão sentir dor ao ouvir (inclusive eu): o rock já estava velho em 1984. Isto é, 18 anos antes de eu nascer, e 32 anos antes de eu comprar meu primeiro CD do The Doors. Mas não vamos desanimar e deixar de ligar os amplificadores no 11. O importante é continuar fazendo barulho. E claro, o filme termina com uma turnê no Japão: onde as bandas de rock vão para morrer.

 

 

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