O ministro das Comunicações, Juscelino Filho, entregou sua carta de demissão após ser denunciado pela Procuradoria-Geral da República ao Supremo Tribunal Federal (STF), sob acusação de desvio de emendas parlamentares. O caso foi revelado pelo Estadão em 2023.
Em uma série de reportagens, o jornal mostrou que Juscelino destinou emendas do Orçamento da União à cidade de Vitorino Freire (MA) para asfaltar uma estrada que passava pela fazenda da sua família. À época, o município era administrado por Luanna Rezende, irmã do titular das Comunicações. Ela chegou a ser afastada da prefeitura no curso das investigações.
Juscelino disse que não quer criar constrangimento ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sai antes de o STF apreciar a acusação contra ele para se defender fora do governo.
“Hoje tomei uma das decisões mais difíceis da minha trajetória pública. Solicitei ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva meu desligamento do cargo de ministro das Comunicações. Não o fiz por falta de compromisso, muito pelo contrário. Saio por acreditar que, neste momento, o mais importante é proteger o projeto de país que ajudamos a construir e em que sigo acreditando”, disse ele na carta.
Juscelino afirmou, ainda, acreditar que será feita justiça ao final do processo que tramita no Supremo Tribunal Federal. “A decisão de sair agora também é um gesto de respeito ao governo e ao povo brasileiro. Preciso me dedicar à minha defesa, com serenidade e firmeza, porque sei que a verdade há de prevalecer. As acusações que me atingem são infundadas, e confio plenamente nas instituições do nosso país, especialmente no Supremo Tribunal Federal, para que isso fique claro. A justiça virá!”, escreveu o ministro demissionário.
Antes de viajar para Tegucigalpa, capital de Honduras, onde participará nesta quarta-feira da 9ª Cúpula de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), Lula conversou com Juscelino por telefone. Disse que gostaria de falar com ele pessoalmente na volta da viagem.
No início da tarde, porém, Lula falou de novo com Juscelino e, na ligação, pediu que ele apresentasse a carta de demissão. O presidente afirmou que era melhor o ministro se concentrar na sua defesa.
O União Brasil indicou o líder do partido na Câmara, deputado Pedro Lucas Fernandes Ribeiro (MA), para o lugar de Juscelino. Pelo acordo de Lula com o União Brasil, a vaga pertencia à bancada da Câmara.
Antes mesmo do anúncio oficial da saída de Juscelino, o ministro do Turismo, Celso Sabino, também do União Brasil, usou a rede social para se solidarizar com o colega. “Total solidariedade ao amigo Juscelino, que pediu afastamento do Ministério das Comunicações, onde exerceu um excelente trabalho. Espero que tenha a oportunidade de se defender com serenidade, provar sua inocência e seguir com sua trajetória na vida pública”, destacou Sabino.
O impacto da denúncia da Procuradoria-Geral da República sobre o governo foi tratado durante almoço, nesta terça-feira, 8, entre Juscelino, Pedro Lucas, Celso Sabino, a ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, e os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre, e do União Brasil, Antônio Rueda. Alcolumbre e o deputado Elmar Nascimento (BA) eram os padrinhos políticos de Juscelino.
Desde cedo, em conversas reservadas, interlocutores de Lula já afirmavam que a situação do ministro era insustentável e aguardavam sua demissão.
Lula queria conversar com Juscelino em Brasília, após retornar de Honduras, mas foi aconselhado a agir rápido para evitar mais desgaste ao governo, que não poderia ficar “sangrando” com mais um escândalo. Até hoje, apesar das investigações, o presidente havia segurado o ministro por alegar que ele defendia sua gestão.
A nova crise atinge o Palácio do Planalto justamente em um momento de queda de popularidade do presidente. Há no PT a expectativa de que Lula aproveite a saída de Juscelino para promover, nos próximos dias, mais uma etapa da reforma ministerial.
Até agora as trocas se resumiram a ministérios comandados pelo PT. O publicitário Sidônio Palmeira entrou na Secretaria de Comunicação Social (Secom) no lugar de Paulo Pimenta e Gleisi Hoffmann, então presidente do partido, assumiu a cadeira antes ocupada por Alexandre Padilha na Secretaria de Relações Institucionais, que cuida da articulação política do Planalto com o Congresso. Padilha, por sua vez, substituiu Nísia Trindade no Ministério da Saúde. É possível que a dança das cadeiras, agora, também atinja o PSD de Gilberto Kassab, secretário de Governo na gestão de Tarcísio de Freitas em São Paulo, além de mais quadros do próprio PT.
Juscelino é o primeiro nome a ser denunciado por suspeita de corrupção no governo. Nesta terça-feira, o ministro se queixou a aliados do que chamou de “perseguição política”. Em nota, os advogados de Juscelino destacaram que ele “reafirma sua total inocência e destaca que o oferecimento de uma denúncia não implica em culpa, nem pode servir de instrumento para o MP (Ministério Público) pautar o país”. O STF ainda vai analisar se aceita ou não a peça da acusação.
Em junho do ano passado, Lula afirmou que o ministro precisava provar sua inocência depois de ser indiciado pela Policia Federal pelos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção passiva.
“O que eu disse para ele: só você sabe a verdade. Se o procurador indiciar (denunciar), você sabe que tem que mudar de posição. Enquanto não houve indiciamento (denúncia), ele fica como ministro. Se houver indiciamento, ele será afastado”, assegurou o presidente na ocasião.
Nesta terça-feira, 8, Juscelino observou que se limitou a “indicar emendas parlamentares para custear a realização de obras em benefício da população”. Disse, ainda, que os processos de licitação, execução e fiscalização de obras “são de competência exclusiva do Poder Executivo, não sendo responsabilidade do parlamentar que indicou os recursos”.
O novo escândalo bate à porta do União Brasil no momento em que o partido, apesar de dividido, negocia uma federação com o PP do senador Ciro Nogueira (PI). O arranjo pode dar mais musculatura para o Centrão no Congresso, mas o casamento não está certo porque Ciro quer ser candidato a vice em uma chapa liderada por algum nome apoiado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro na disputa de 2026. Embora Bolsonaro diga que vai concorrer, ele está inelegível até 2030 e a tendência é que apoie a candidatura do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), à sucessão de Lula.
Mesmo com o União Brasil rachado e em crise, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, expoente do partido, lançou sua candidatura ao Planalto.
Nos últimos tempos, denúncias também atingiram o empresário baiano José Marcos de Moura, que integra a cúpula do União Brasil e ficou conhecido como “Rei do Lixo”.
Moura foi alvo de mais uma etapa da Operação Overclean, da Polícia Federal, na última quinta-feira, 3. O empresário tem ligações com o Congresso e o caso entrou no rol das diligências sobre desvio de emendas parlamentares.
O deputado Elmar Nascimento (BA), ex-líder do União Brasil, foi citado no inquérito da Polícia Federal e por isso a investigação acabou sendo enviada ao STF. O vereador de Campo Formoso (BA) Francisco Nascimento, primo de Elmar e também do União Brasil, chegou a ser preso.
Pouco antes de ser detido, Francisco jogou pela janela do apartamento em Salvador uma mala com R$ 220 mil. A polícia recuperou o dinheiro depois. Elmar nega envolvimento com o episódio. O prefeito de Campo Formoso, Elmo é irmão do deputado e foi reeleito no ano passado.
(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
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