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EDITORIAL

Licitação do transporte coletivo: para ter sucesso, basta olhar para o passado

14/01/2025
ônibus

Um dos projetos de impacto que o então candidato à prefeitura de Curitiba, Eduardo Pimentel, estabeleceu durante a campanha eleitoral que o elegeu foi a nova licitação do transporte coletivo, prevista para ser realizada no segundo semestre deste ano.

Fruto de ignorância, desconhecimento e uma boa dose de estratégia eleitoral, a histórica licitação de 2010 foi extremamente demonizada e criticada durante a última campanha. Candidatos de oposição prestaram um desserviço ao eleitor curitibano alardeando, sem qualquer fundo de verdade ou amparo em documentos, que o modelo do edital usado naquele ano era ineficaz e direcionado para beneficiar as empresas de transporte público. Tanto não era que as empresas, por entender que os critérios adotados em relação a operação do sistema eram extremamente rigorosos, reclamaram do edital e tentaram, de várias formas, suspender a licitação.

Quinze anos depois, será a primeira vez que a Prefeitura de Curitiba vai mexer nesse vespeiro. A relação entre o poder público e as empresas de transporte coletivo nunca é tranquila. No entanto, se o grupo de trabalho que será montado pelo prefeito Eduardo Pimentel para preparar a licitação deste ano olhar para o passado, vai encontrar uma fórmula de sucesso na licitação de 2010 e um caminho de rigor e austeridade a seguir.

A comissão responsável pela formatação daquele modelo, até então inédito, de licitação foi formada em janeiro de 2005, bem antes da homologação e já no primeiro mês de mandato do recém-eleito prefeito Beto Richa. O grupo era formado por técnicos da Urbanização de Curitiba S/A (Urbs), servidores da Secretarias Municipais de Meio Ambiente e Finanças, técnicos do Ippuc, além de representantes das empresas de transporte coletivo.

Nessa época, a relação entre a Prefeitura e as empresas era pactual e, por essa razão, representantes das operadoras foram convidados a participar do grupo. No entanto, assim que ficaram claras as diretrizes que seriam seguidas pela comissão, principalmente a ideia de rever os procedimentos da metodologia do cálculo das tarifas, os representantes das empresas desistiram de colaborar e deixaram o grupo.

Além de um novo método para calcular as tarifas, as diretrizes previam: melhora na segurança e no conforto dos passageiros, agilidade do transporte, aumento da mobilidade e preço justo.

Definidas as diretrizes, a comissão deu toda a transparência ao processo de formação do edital. Entre 2005 e 2010 foram exaustivamente ouvidas, em várias reuniões, todas as partes que formavam o sistema.

O principal interessado – o usuário do transporte – foi atendido por meio de inúmeras audiências públicas, onde várias demandas foram recolhidas e, muitas delas, incorporadas ao edital.

O peso da importância da transparência na condução dos trabalhos era tão grande que, antes da publicação do edital, a Urbs encaminhou ofícios ao Ministério Público, ao Tribunal de Justiça do Paraná, à Câmara de Vereadores e ao Tribunal de Contas dando ciência da publicação do edital e solicitando a indicação de representantes para acompanhar os trabalhos da comissão. No entanto, nenhum nome foi indicado. Ainda assim, uma minuta do edital foi protocolada e entregue aos presidentes dessas entidades.

Ao longo do processo, e apesar de toda transparência e publicidade, uma ação popular pedindo a anulação da licitação foi impetrada. O processo, no entanto, não prosperou, seus autores foram considerados litigantes de má fé e a legitimidade do edital foi atestada pelo Tribunal de Contas.

A licitação de 2010 foi considerada um marco na relação entre a cidade e as empresas que operavam o transporte coletivo. Seu sucesso pode ser medido pelo mau humor e pela contrariedade das empresas na época. O modelo seguiu todos os ritos necessários e foi copiado por várias prefeituras de todo o Brasil.

Ainda assim, em 2013, com estímulo do então prefeito Gustavo Fruet, uma estapafúrdia CPI foi criada na Câmara de Vereadores para avaliar supostas irregularidades no processo licitatório. O despreparo dos vereadores que compunham a comissão era tão grande que chegaram a acusar a Urbs de direcionar a licitação para empresas que pudessem operar em canaletas. Seria risível se não fosse trágico já que a maior parte do transporte coletivo de Curitiba usa canaletas. Além disso, outras cidades do Brasil já adotavam o transporte coletivo em faixas exclusivas.

Ao fim e ao cabo, essa CPI revelou-se um dos maiores desperdícios de dinheiro público e de tempo que Curitiba já viu. Serviu apenas para que Fruet não cumprisse o contrato assinado em 2010, o que acabou deixando uma famigerada herança para a gestão que o sucedeu e danos ao sistema.

A qualidade da licitação, assim como sua lisura, foram confirmadas em 2017, pelo Ministério Público do Paraná, que deu parecer favorável pela legalidade do processo. Vale lembrar que as investigações do MP foram provocadas pela CPI dos Transportes, que não chegou a lugar algum. O MP confirmou que as exigências do edital atendiam as especificações técnicas da cidade e que, portanto, nenhuma empresa havia sido favorecida, desmoralizando aquela desnecessária CPI.

Também em 2017, apesar de não ter gostado do modelo adotado pela licitação, o Setransp, entidade que reúne as empresas de transporte de Curitiba e Região Metropolitana, criticou a CPI e admitiu que o certame foi feito com absoluta lisura.

Se a CPI dos Transportes serviu para alguma coisa, foi apenas para mostrar ao eleitor curitibano a incompetência de alguns dos seus representantes. Na eleição de 2016, tentando a reeleição, o prefeito Gustavo Fruet não conseguiu sequer passar para o segundo turno e o vereador Jorge Bernardi, presidente da CPI, deu adeus à Câmara ao disputar, e perder, a eleição como vice-prefeito pela Rede.

As lições estão aí. O sucesso da nova licitação vai depender da disposição da nova comissão em ouvir a população de Curitiba e dar toda a transparência necessária ao processo licitatório, sem buscar agradar as empresas e lembrando, sempre, que o principal interessado, e que deve ser atendido sob qualquer circunstância, é o curitibano.

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