O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira (26), para receber a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) que atribui ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a outros sete acusados terem integrado o “núcleo crucial” do plano de golpe.
Como relator, Moraes abriu os votos – outros quatro ministros da Primeira Turma vão votar. Ele antecipou que considera as provas reunidas como “indícios fortes de autoria”. O voto robusto foi além da análise dos critérios obrigatórios para a admissibilidade da denúncia e avançou sobre as evidências colhidas pela Polícia Federal.
Moraes chega ao segundo dia de julgamento respaldado pelos colegas. Na sessão de terça, 25, ao analisar questionamentos processuais das defesas, os ministros demostraram alinhamento irrestrito ao relator. O ministro Luiz Fux foi o único que apresentou ressalvas pontuais, mas acompanhou os colegas nos pontos cruciais para legitimar a investigação e esteve longe de rivalizar com a corrente majoritária.
Em seguida, votam os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
Vídeos do 8 de Janeiro
Em uma estratégia pouco convencional, Alexandre de Moraes exibiu no plenário da Primeira Turma recortes de vídeos dos atos violentos do 8 de Janeiro de 2023 (assista abaixo). “Aqueles que se esqueceram, de boa ou má fé, que houve gravíssima violência, vão se recordar agora”, indicou.
Ele inseriu a denúncia contra Bolsonaro e seus aliados no contexto do 8 de Janeiro, que segundo a Procuradoria-Geral da República foi o ápice do movimento golpista liderado pelo ex-presidente. Moraes afirmou que houve uma “verdadeira guerra campal”, uma “tentativa de golpe de estado violentíssimo”.
“Nenhuma bíblia é vista e nenhum batom é visto neste momento, agora a depredação ao patrimônio público, o ataque à polícia, é visto”, criticou em um dos momentos mais duros do voto. “Uma violência selvagem, uma incivilidade total, com pedido de intervenção militar, de golpe de estado.”
Materialidade
A Primeira Turma do STF analisa se há elementos suficientes para receber a denúncia – o que se chama no jargão jurídico de “justa causa da ação penal” – e abrir um processo criminal.
Alexandre de Moraes defendeu que a denúncia cumpre os requisitos formais para o seu recebimento. Segundo o ministro, a peça é “detalhada, compreensível e coerente”.
“A PGR descreveu satisfatoriamente os fatos típicos ilícitos, com todas as suas circunstâncias, dando aos acusados o amplo conhecimento dos motivos e das razões pelas quais foram denunciados. Isso também é absolutamente essencial neste momento para que possam exercer o seu direito de defesa”, defendeu Moraes.
O ministro explicou que, neste momento, o STF precisa verificar se a denúncia comprovou a materialidade dos crimes, ou seja, demonstrou que eles aconteceram e e descreveu o contexto. A autoria e a participação ou não de cada denunciado só será analisada no julgamento do mérito das acusações.
“O que se exige da denúncia, em um primeiro momento, é a comprovação da materialidade dos delitos imputados aos denunciados. E a materialidade dos delitos já foi reconhecida por este STF em 474 denúncias (do 8 de Janeiro), que têm idêntica materialidade. Em que pese a participação diversa de vários denunciados, mas os crimes narrados são os mesmos.”
Provas
Além dos vídeos do 8 de Janeiro, o ministro exibiu no telão do STF provas reunidas na investigação, como mensagens trocadas entre os denunciados, registros de entrada e saída no Palácio do Planalto e documentos apreendidos. Um dos arquivos projetados durante o julgamento foi o manuscrito “operação 142″, encontrado na sede do Partido Liberal.
Moraes também leu diversos trechos de diálogos obtidos pela Polícia Federal, inclusive conversas com ataques e xingamentos aos ministros do Supremo Tribunal Federal.
O ministro concentrou a manifestação nas provas consideradas mais contundentes, como os depoimentos do general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército, e do brigadeiro Carlos Almeida Baptista Júnior, ex-comandante da Aeronáutica, que confirmaram ter recebido do ex-presidente Jair Bolsonaro a proposta de golpe.
Em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro, o ministro citou a minuta golpista para anular o resultado das eleições e o rascunho de discurso que seria lido por Bolsonaro após a deposição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“Não há nenhuma dúvida que o denunciado Jair Messias Bolsonaro conhecia, manuseava e discutiu sobre a minuta do golpe. Isso não há dúvida”, cravou Moraes.
O ministro leu trechos de discursos e transmissões ao vivo com ataques ao STF e às urnas eletrônicas. Moraes mencionou, por exemplo, a reunião de Bolsonaro com embaixadores para descredibilizar o sistema de votação, em julho de 2022, o que levou a Justiça Eleitoral a decretar a inelegibilidade do ex-presidente. Citou também o discurso de Bolsonaro no dia 7 de Setembro de 2021, em São Paulo, quando o ex-presidente ameaçou descumprir decisões do Supremo Tribunal Federal.
O ministro disse ainda que Bolsonaro pressionou o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, para mudar um relatório em que o Exército não identificou falhas nas urnas eletrônicas. A iniciativa foi classificada como “patética” por Moraes. O ministro afirmou que houve “esforços ilícitos” do ex-presidente para atacar o sistema eleitoral.
O voto também fez referência ao acordo de colaboração do tenente-coronel Mauro Cid. A delação premiada do ex-braço direito de Bolsonaro deu uma guinada na investigação do golpe. Por lei, a palavra do delator não pode ser usada para justificar denúncias ou condenações, mas as informações prestadas servem como meio de prova. No primeiro dia de julgamento, os ministros rejeitaram pedidos das defesas dos denunciados para anular o acordo de colaboração. Moraes afirmou que todos os depoimentos de Mauro Cid foram corroborados por provas autônomas.
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