Miriam Karam
Especial para HOJEPR
O deputado estadual Jorge Brand, o Goura (PDT), enviou ofício à Procuradoria Geral do Estado questionando a manobra que o governo do Estado está fazendo para usar cerca de R$ 36 milhões que deveriam ter sido usados para auxiliar trabalhadores da cultura desde 2020. Os recursos, previstos pela Lei Aldir Blanc como auxílio emergencial para artistas que ficaram sem renda por causa da pandemia, não chegaram a quem de direito por “incompetência deliberada ou explícita”, segundo Goura.
A lei Aldir Blanc destinou R$ 72 milhões ao Paraná. Mas a Superintendência de Cultura, órgão da Secretaria de Comunicação e Cultura, só conseguiu distribuir a metade, apesar dos alertas da Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa e do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões (Sated-PR).
“Mesmo a parte distribuída não chegou a quem mais necessitava, por causa da burocracia imposta pelo governo”, diz o presidente do Sated, Adriano Esturilho. O sindicato sugeriu que o Estado contratasse profissionais para agilizar o processo, mas a proposta não foi aceita
“O processo não andou e a lei é bastante clara”, diz Goura. “Os recursos que não fossem usados até 31 de dezembro de 2021 teriam de ser devolvidos ao Tesouro Nacional. “Para contornar o problema e usar o dinheiro em 2022, a Superintendência de Cultura terceirizou os recursos levantando questionamentos sobre a legalidade da manobra”. Diferenças de opinião sorbe o uso dos recursos levaram à exoneração da diretora do Teatro Guaíra, Monica Rischbieter.
Nos últimos meses de 2021, quando se falou na terceirização dos recursos para algumas universidades estaduais e para o Teatro Guaíra, Monica fez uma consulta à PGE sobre a legalidade do uso da verba em 2022.
Consultada, a procuradora geral Letícia Ferreira da Silva disse, por meio de sua assessoria, que não se pronunciaria a respeito. Encaminhou o questionamento à Superintendência de Cultura, mas Luciana Pereira só poderia falar a respeito nesta sexta-feira, 11, segundo a assessoria.
Nesta semana, Goura, que integra a Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa, também enviou ofício pedindo que a procuradora geral se manifeste sobre a legalidade da utilização do saldo remanescente dos repasses feitos pela União, mas ainda não recebeu resposta.
De acordo com Esturilho, presidente do Sated, os recursos deveriam ter sido distribuidos de forma emergencial a artistas que ficaram sem trabalho e, portanto, sem renda. “Mas o Paraná resolveu complicar as coisas. Em vez de fazer um cadastro e incluir artesãos de rua, quilombolas, indígenas e pequenos trabalhadores sem qualquer renda, inventou editais que previam, por exemplo, cursos de qualificação e aprendizado sobre editais com uso intensivo de internet, o que estava completamente fora da realidade desses trabalhadores”, conta ele. “Assim, a primeira metade dos recursos chegou a artistas mais qualificados concentrados na região de Curitiba e municípios vizinhos”.
“Quem mais precisou não viu os recursos”
Diante da possibilidade de haver problemas legais, o deputado Goura também vai enviar representação ao Ministério Público Federal, já que os recursos são da União, porque considera que a lei é clara e houve incompetência desde a primeira fase em 2020; segundo ele, várias vezes o governo do Paraná foi alertado sobre a lentidão do processo e das dificuldades pelas quais passavam os artistas. “Quem mais precisou não viu os recursos”.
Goura também enviou ofício ao secretário de Comunicação e Cultura, João Evaristo Debiasi, ainda em setembro de 2021, pedindo um posicionamento público. “Os trabalhadores da cultura têm o direito de saber o que se passa com os recursos que deveriam ser usados para sua sobrevivência. Mas resposta, nenhuma.”
“Por que deixaram para última hora?”, questiona Adriano Esturilho. O tempo passou e diante da possibilidade de o Ministério Público Federal tomar providências contra o uso dos recursos, Goura diz que mesmo que isso, em princípio, possa prejudicar os artistas, não se pode prevaricar. Para ele, é até surreal a falta de capacidade de distribuir socorro aos trabalhadores.
A revolta, porém, terá de ser direcionada aos agentes do Paraná. “Se tenho essa informação, como deputado não posso me calar”. A pandemia apenas revelou a precariedade e a injustiça que existem, e “a revolta tem de ser dirigida ao governo do Estado, que foi incompetente”, argumenta o deputado, lembrando a forma intensa com que a Comissão de Cultura da Assembleia alertou o governo.
À espera da análise dos órgãos competentes, o deputado avalia, inclusive, que o governo do Paraná poderia ter usado recursos próprios para socorrer os artistas. “Mas esperou pelo dinheiro federal e, ao recebê-lo, não foi competente para usá-lo”.