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ENTREVISTA ESPECIAL

HojePR Exclusivo: o neoparanismo pop de Simon Taylor

28/03/2025
SIMON TAILOR HOJEPR

Desenhista curitibano fala das comparações com Poty, o sucesso de “Curitiba em Figurinhas”, o viver de arte sem medo de ser popular e o possível álbum sobre o Paraná

Por Anderson de Souza

Em quase três meses, o álbum “Curitiba em Figurinhas” virou uma febre entre os curitibanos e trouxe uma visibilidade nunca antes vista pelo artista plástico e desenhista Simon Taylor. O curitibano de 51 anos vive sua melhor fase e é considerado por muitos o novo Poty Lazarotto, frase que ouviu do próprio ex-prefeito Rafael Greca. Exagero? Hoje esse ex-chargista e ex-designer gráfico é um operário da arte valorizado por suas telas, com o livro “Curitiba em Traços” em sua terceira edição e que pode se dizer o artista mais proeminente do que podemos chamar de neoparanismo – um nome surgido durante essa conversa com o HojePR.

HojePR – Chargista, ilustrador, músico, designer gráfico, diagramador, pintor, artista, dono de empresa de comunicação visual e já foi proprietário de loja de discos. Falta alguma coisa?

Simon Taylor – Falta plantar uma árvore (risos). Já tenho filha, lancei vários livros e nunca plantei uma árvore. Na verdade, está tudo na área artística. Claro, cada uma tem a sua característica mas eu não vejo uma tão diferente da outra. Eu comecei a diagramar porque entrei em redação de jornal. Eu não fui o único, conheço vários outros chargistas que até por uma questão econômica e não conseguiram viver só da ilustração foram por esse caminho. Eu nunca planejei muito, a única coisa que eu planejei foi desenhar. As coisas foram acontecendo e essa parte gráfica eu meio que fui gostando e gosto até hoje. Atualmente, eu praticamente posso me dizer ex-designer gráfico e ex-chargista político. Agora se eu tiver que preencher a profissão em uma ficha eu coloco: desenhista ou artista plástico. Não falta mais nada e atualmente estou fazendo um curso de fotografia, vai quê?

HojePR – Quais os veículos de comunicação que você já passou?

Simon – Folha da Imprensa, hora H, Agência Conesul de Notícias-Jornal A Cidade, Tribuna do Estado e Jornale/Blog do Zé Beto. Esse último foi onde encerrei a carreira como chargista. Confesso que nessa época eu já estava meio enjoado e senti que aquilo já não era mais pra mim.

 

O quadro “Largo da Ordem, 360º” já é considerado uma obra-prima da arte paranaense
O quadro “Largo da Ordem, 360º” já é considerado uma obra-prima da arte paranaense

 

HojePR – A ideia do projeto “Curitiba em Figurinhas” nasceu em 2012 e como foi a concepção? Afinal de contas são 400 cromos distribuídos em 60 páginas.

Simon – Depois da pandemia de 2021, eu estava de saco cheio do design gráfico, buscando a minha origem e me dedicar somente a arte. Como eu não tive nenhuma formação, a única coisa que sempre pesou pra mim foi a falta de direcionamento. Eu achava que não era possível viver da arte, mas é. É difícil, você tem que entender o mundo. Você tem que compreender que existem pessoas lá em cima que consomem arte e eu não sabia nada disso. Veja como é a vida: no momento que eu perdi uns contratos de serviços como designer, o Robson Krieger [artista plástico, galerista à frente do Studio R Krieger] veio atrás de mim e me disse: “Essa obra você está vendendo? Como que é? Chega aí, vamos bater um papo”. Ele é um cara especializado em arte paranaense e depois me falou: “Cara, você é um artista moderno, mas você faz arte paranaense. Você está fazendo o que o Poty fazia. Que é retratar a tua cidade, o teu momento, teu lugar.”

O Robson me incentivou a ir para a tela para aumentar o meu patamar de ganho, respeitabilidade e que o papel tinha uma limitação, principalmente em Curitiba com um clima úmido. A migração foi simples, comecei a usar a mesma caneta para desenhar e substituí a aquarela por tinta acrílica. Tudo começou a ir bem e na sequência pensei em fazer um livro sobre centrado em Curitiba. Lançamos o “Curitiba em Traço” que já chegou a duas mil cópias vendidas e uma terceira edição – um fenômeno para um livro de arte. Baseado no sucesso dessa publicação, o Robson me perguntou: “Você já pensou em fazer um álbum de figurinhas?” e respondi: “Não só pensei, como a Kelly [Sumeck – designer e esposa do Simon] fez um projeto de álbum”. Ele me disse para esperar e terminar o projeto para levar para a Urbs em outubro de 2024. O presidente da Urbs, Ogeny Maia Neto, levou para o prefeito Rafael Greca que topou a ideia na hora. E isso só foi possível porque fazem 13 anos que eu desenho um lugar diferente de Curitiba todo final de semana. (…)

HojePR – O USK é uma atividade que mudou o seu traço e o jeito que você vê as cidades. Pode falar um pouco sobre isso?

Simon – Há 13 anos percebi que a gente não conhece a cidade, nós passamos por ela. Quando praticamos a atividade de sentar duas horas, desenhar todos os detalhes e outros aspectos, você enxerga com outros olhos. Eu vejo Curitiba como um turista. O USK mudou da água para o vinho. Ele é um movimento muito rico. As pessoas acham que é sobre desenho, mas ele tem um tripé: amor pelo desenho, amizade e preocupação com patrimônio histórico da cidade. Era a primeira vez que eu via pessoas desenhando na minha frente. Outra coisa, você acaba desenvolvendo soluções em condições não favoráveis como o clima, o tempo e o desconforto. Você começa a valorizar o que é importante e o que não é no desenho. O desenhista não para de aprender nunca. (…) O meu traço tem distorções, um suingue, um humor e musicalidade.

A obra “Café para Dois” mostra um traço com a identidade do artista
A obra “Café para Dois” mostra um traço com a identidade do artista

 

HojePR – Falando nisso, o “Curitiba em Figurinhas” é um produto da cultura pop curitibana. O melhor é que esse tipo de coisa sempre influenciou o que você fez.

Simon – Um artista deve ter influências de cinema, literatura e outras atividades. No meu caso a música é vital, e não é porque eu sou músico. O meu traço é musical, a coisa da psicodelia dos Beatles. Ultimamente, o que tem me batido é que eu sou mais comercial e gosto de coisas mais acessíveis. Eu gosto de arte mais acessível e com profundidade. A coisa do pop vem por aí. Eu entendo o artista mais fechado e hermético, ele está fazendo a expressão dele. Eu gosto que arte sempre se comunique com o maior número de pessoas possíveis. Eu gosto de gente.

HojePR – Você já disse um dia que o álbum deve ter adiantado a sua carreira artística em uns 15 anos? Como está sendo o retorno e o reconhecimento?

Simon – Isso é tudo para permitir que eu viva de arte. Não é para me tornar milionário, mas acima de tudo fazendo o que eu quero. O alcance é impressionante. Desde o lançamento, todo o dia eu recebo mensagem e até encomenda.

HojePR – Atualmente é um dos maiores projetos da sua vida?

Simon – Neste momento com certeza. Eu não sou o artista que vê com maus olhos o comércio da arte. Pra mim o fato das pessoas comprarem minha arte é de uma felicidade tremenda. Eu quero produzir o dia inteiro. Um dia desses eu estava desenhando para um livro sob encomenda e no final do dia eu estava estressado e pensei no que iria fazer: “Vou desenhar um pouquinho!”. Eu durmo pensando em desenho.

HojePR – Você sofre uma influência direta do Poty Lazzarotto? Sei que é um grande admirador da obra dele.

Simon – Os artistas que mais me influenciam graficamente são os do traço – como o pessoal das histórias em quadrinho, que ainda leio. Desde pequeno ele é uma influência pra mim. Ao contrário de Theodoro De Bona, Alfredo Andersen e Guido Viaro, todos pintores maravilhosos, qual é o único cara do traço? O Poty.

Desenho da “Casa Erbo Stenzel”
Desenho da “Casa Erbo Stenzel”

HojePR – Mas e o paranismo no que você faz?

Simon – Sim. Modestamente eu me considero um novo paranista.

HojePR – Seria um neoparanismo?

Simon – É exatamente isso, um neoparanismo ou paranismo contemporâneo. O próprio Rafael Greca me disse: “Você é o novo Poty”. Muita gente já me disse isso, essa frase tem me acompanhado. Desde que ele morreu é uma lacuna que ficou aberta, ninguém veio para pegar esse nicho específico de desenhar Curitiba e ter uma identidade grande. Claro que tenho influência dele no traço, mas o que ficou mesmo é de registrar a cidade com a minha verdade e visão artística. Nesse movimento tem o Rafael Sartori (escultor), Patricia Ono (mosaicista), André Caliman (quadrinista, ilustrador e escritor) e Vinicius Prates (ilustrador). Eu vejo muitos perfis dedicados a capital paranaense e historiadores que fazem visitas guiadas sobre a capital paranaense. Isso tudo não tinha há cinco anos atrás. Eu sinto que tem alguma coisa aí. Alguns movimentos não vingaram muito na história da arte, porque talvez ninguém fez um release, deu um nome ou um golpe publicitário, no melhor sentido. A Semana Moderna de 22, a Tropicália, o Mangue Beat, o Paranismo, todos tiveram o seu manifesto.

HojePR – Depois do “Curitiba em Figurinhas” e quatro livros, algum projeto para o futuro que pode ser revelado? Um “Paraná em Figurinhas”?

Simon – Exatamente! Tenho uma reunião marcada sobre esse assunto. Na minha cabeça o “Paraná em Figurinhas” é uma extensão natural. Primeiro, é uma intenção e estamos começando um trabalho para fazer isso. Segundo, o primeiro álbum tem 13 anos de desenhos feitos, o “Paraná em Figurinhas” seria um trabalho de uns dois anos. Vou ter que viajar e desenhar in loco. Na minha cabeça, ele começa daqui a pouco com as próprias viagens. Em dezembro deste ano, eu quero fazer um próximo livro mais autoral sobre as nossas três joias do Litoral: Morretes, Antonina e Paranaguá. É uma parte mais histórica do Estado que eu gosto muito. Já tenho desenhos prontos.

Imagens: Simon Taylor (reprodução autorizada pelo artista)
Foto: Anderson de Souza

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