Você já viu uma empresa familiar desmoronar sem que ninguém conseguisse, de fato, explicar o motivo? As vendas iam bem, o mercado seguia aquecido, a marca era forte… mas, nos bastidores, o que ruía não era visível: confiança, diálogo, pertencimento. O que caía, no fundo, era o elo emocional que sustentava aquele negócio desde a sua origem.
A sucessão em empresas familiares é um tema tratado com solenidade, mas raramente com coragem. Quase sempre surge tarde demais quando o tempo já joga contra. E aí, o que poderia ser uma transição estratégica vira um movimento às pressas, marcado por improviso, ressentimentos e conversas engolidas.
Em muitas famílias, sucessão não é plano. É tabu. E tabus não se resolvem com atas ou organogramas. Eles se arrastam em silêncios, se escondem nos almoços de domingo e explodem em reuniões tensas, onde o que está em jogo não é só o futuro da empresa mas o peso de toda uma história.
Fundadores, via de regra, carregam uma narrativa heroica. Criaram o negócio do nada, atravessaram crises, abriram mão da vida pessoal para “fazer dar certo”. E agora, mesmo cansados, sentem-se insubstituíveis. Afinal, quem cuidaria da empresa com o mesmo zelo? Do outro lado, filhos e herdeiros se veem diante de uma encruzilhada ingrata: provar que são dignos de continuar algo que talvez nem tenham escolhido ou carregar a culpa por “não querer dar continuidade ao legado da família”.
Essa é a parte que ninguém gosta de encarar: nem todo filho quer ser sucessor. Nem todo herdeiro nasceu para empresário. Nem todo fundador está pronto para se afastar. E tudo bem. O problema é que isso quase nunca é discutido com maturidade. Costuma ser imposto, velado ou adiado até que o negócio vire palco de disputas, mágoas mal resolvidas e tentativas frustradas de controle.
É doloroso para o fundador perceber que sua empresa seu “terceiro filho” pode seguir por um caminho diferente daquele que ele sonhou. É desconfortável para o sucessor viver à sombra de alguém que, mesmo fora da operação, continua decidindo nos bastidores.
E é trágico para a empresa quando essas tensões se arrastam: talentos se perdem, resultados se comprometem e os conflitos deixam marcas que ultrapassam o CNPJ.
A sucessão não é apenas uma transferência de poder. É, antes de tudo, um exercício de confiança. E confiança não se impõe se constrói. No cotidiano, na escuta genuína, na abertura para o novo, no respeito às diferenças (e também às semelhanças) entre as gerações. É preciso abandonar a ideia de que o sucessor deve ser uma cópia do fundador. Não será. E, talvez, justamente por isso, o negócio possa evoluir.
A nova geração pode até não querer “fazer igual”, mas isso não significa desinteresse. Muitas vezes, o que falta não é capacidade é espaço. O que falta não é vontade é conexão com o propósito. E se a empresa não conseguir se abrir para esse diálogo, corre o risco de se tornar um museu de glórias passadas: bonito por fora, oco por dentro.
Conduzir uma sucessão saudável vai muito além de contratos e planejamentos financeiros. Exige maturidade emocional. Exige deixar o controle, abrir espaço para conversas difíceis aquelas que envolvem não só o futuro da empresa, mas também mágoas antigas, inseguranças pessoais e expectativas não ditas.
Uma sucessão bem feita é aquela em que ninguém precisa se anular para o outro entrar. É quando o fundador entende que seu maior legado pode ser justamente ensinar a sair de cena com dignidade. E quando o sucessor compreende que honrar a história não é se aprisionar nela.
No fim das contas, o que sustenta uma empresa familiar não é o sobrenome. É a capacidade da família de se reinventar sem se perder. É o compromisso com a verdade, mesmo quando ela machuca. É a coragem de transformar a dor da transição em força de renovação.
E você? Está pronto para esse processo?
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