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HojePR

“Os advogados querem ser ouvidos”, diz ex-presidente da OAB/PR

14/03/2022

A Coluna HOJEPR – Direito e Justiça, inaugura o caderno entrevista, com o advogado Cássio Lisandro Telles,  ex-Presidente e Membro Honorário Vitalício da OAB/PR. O entrevistado dispensa apresentação. Trata-se de advogado raiz, com enorme contribuição na defesa da advocacia, cujo atividade é indispensável à administração da justiça (art.133/CF). Nesse entrevista, Cassio deu conselhos a jovens advogados, falou dos desafios à frente da Ordem e dos programas lançados durante a sua gestão, e fez uma avaliação do futuro da advocacia no século XXI.

 

Cássio Lisandro Telles

Direito e Justiça – Como presidente da OAB/PR no último triênio (2019/2021), quais foram seus principais desafios e conquistas obtidas ao longo de sua gestão?

Cássio Lisandro Telles – Sem dúvidas, o maior desafio foi o impacto da pandemia na advocacia e no sistema de Justiça. Hoje já estamos ambientados com a realização de audiências, sessões e reuniões pelas plataformas virtuais, mas em março de 2020, nós não tínhamos a menor ideia sobre como vencer o isolamento social recomendado pelas autoridades de saúde e o fechamento dos Fóruns. Isso exigiu muito dos dirigentes da OAB e dos Tribunais, muita criatividade, diálogo e construção de um novo cenário para a população continuar a ter acesso à Justiça. Felizmente, com muito diálogo, expondo as particularidades de cada um dos agentes processuais, aqui no Paraná construímos um modelo que funcionou bem. O fato de estarmos com os processos totalmente digitalizados ajudou demais. E também diria que o grande desafio da gestão, por conta da pandemia, foi lutar para que a advocacia continuasse recebendo seus honorários, o que não seria possível se os processos paralisassem. Foi, portanto, um período de
aprendizado e de superação, mas faço um balanço positivo, principalmente do lado da advocacia, que não parou de trabalhar e manteve, inclusive, os escritórios abertos, correndo riscos de vida para atender a população, que precisava da Justiça.

 

Direito e JustiçaComo foi a ideia e o desenvolvimento do programa OAB Paraná Total?

Cássio Lisandro Telles – Foi uma proposta de campanha, que concebemos por acreditar que a OAB é de toda a advocacia. Nós temos 49 subseções e elas estão nas principais cidades. Os presidentes da seccional sempre visitaram as subseções, mas havia a situação das demais comarcas, o Paraná tem 161. Então lançamos o projeto de fazer audiências públicas com a advocacia em todas elas, uma proposta de ir ao encontro da advocacia onde ela está, para colher sugestões e reivindicações. Reputo como o melhor projeto que nossa gestão pode realizar, apesar da pandemia, que atrapalhou bastante. Em 2019, primeiro ano da gestão, havíamos visitado 88 comarcas. Esperávamos visitar as 161 em 2020, mas com a pandemia tudo parou. Em 2021, com o arrefecimento da COVID, decidimos sair novamente a campo, e a partir de julho estávamos de novo na estrada.

Ouvi em praticamente todas as comarcas visitadas a frase “nunca o presidente da seccional esteve aqui”, o que foi gratificante. As audiências públicas permitiram uma gestão sintonizada com a base, e as ações que empreendemos, as postulações perante os Tribunais e as autoridades do Executivo foram baseadas nas sugestões da advocacia. Os advogados querem ser ouvidos e não há nada mais efetivo do que estar presencialmente nas comarcas. Na capital, fizemos o projeto “de colega para colega”, no primeiro ano de gestão, com cafés da manhã, onde convidávamos aleatoriamente colegas para estar conosco conhecendo nossos projetos e trazendo suas impressões, foi muito produtivo. Na pandemia, não conseguimos dar sequência, mas destaco que vejo nessa forma de gestão a melhor maneira de bem encaminhar os temas que afligem o cotidiano de nossos colegas.

 

Direito e JustiçaCom a sua larga experiência na advocacia, inclusive exercendo a defesa das prerrogativas no Conselho Federal da OAB/R (triênio 2016/2018), quais conselhos e dicas que o jovem advogado precisa saber?

Cássio Lisandro Telles – O primeiro conselho que dou é ler e conhecer bem o artigo 7º., da Lei 8.906/94, não adianta querer respeito se o profissional não sabe quais são suas prerrogativas e como podem ser empregadas. É preciso ter consciência que prerrogativas não são um privilégio para o advogado, algo para deleite, elas existem em nome do direito de defesa do cidadão. Quem precisa de um advogado pleno e respeitado é o cliente, que é o destinatário do direito de ampla defesa. O segundo conselho, é acompanhar os debates que a OAB realiza sobre esses temas, eles são riquíssimos e ensinam a melhor postura que o profissional deve adotar, quando existir uma situação em que seu livre exercício profissional for impedido.

E o terceiro conselho é que seja procurada a diretoria de prerrogativas, mediante apresentação de pedidos de assistência e providência, quando o advogado não conseguir solucionar por si os entraves envolvendo prerrogativas. Ressalto que é preciso instruir esses pedidos, além de formalizar, pois isso é vital para que a OAB tome as providências.

 

Direito e JustiçaNa sua visão, como será a advocacia do século XXI?

Cássio Lisandro Telles – Será uma advocacia cada vez mais consultiva e preventiva. Nós já estamos vendo uma queda acentuada no número de litígios em Juízo. Conciliação e mediação são caminhos que o advogado deve sempre buscar. Há também a arbitragem. Por vezes vemos colegas que não conversam entre si, que não buscam o entendimento entre os clientes. Vejo que nós, mais do que ninguém, temos condições de construir as soluções consensuais, isso é inerente à nossa atividade. Também vejo que as formas de julgamento em ambiente virtual vieram para ficar, isso é um novo modo de trabalhar, que modifica os ambientes dos escritórios, que permite o trabalho em qualquer lugar do País e que impacta diretamente no mercado de trabalho. Antes da pandemia, por exemplo, tínhamos muitos advogados correspondentes para audiências, era uma forma de trabalhar e receber os honorários. Hoje isso mudou, pois as audiências podem ser feitas telepresencialmente. Nos Tribunais, penso que as sustentações orais presenciais devem ser preservadas, como uma faculdade, sem deixar de permitir as sustentações à distância. Algo que não acredito, porém, é que a advocacia acabará e que será substituída por máquinas, robôs. Os algorítimos, os robôs podem até auxiliar e facilitar, mas não substituirão a advocacia, porque o direito envolve sentimentos, paixões, aspectos subjetivos, inerentes às relações sociais, que só atingem uma solução plena, através do acompanhamento profissional pessoal. Eu vejo que as relações cada vez ficam mais intensas, há um volume maior de relacionamentos pessoais, comerciais e empresariais, que a facilidade de comunicação permite. O conflito não deixará de existir, bem como a necessidade de prevenção e orientação. As relações ficam mais complexas, as legislações também, e nesse contexto a presença do advogado é essencial, notadamente para orientar e construir a interpretação. Portanto, continuo acreditando na essencialidade da advocacia.

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