Escolher os melhores livros do ano é uma tarefa quase impossível, ainda mais considerando que cerca de 10 mil novos títulos chegam às livrarias todos os anos. Para ajudar a identificar os destaques literários de 2024, o Estadão ouviu 15 escritores brasileiros – que são, também, grandes leitores.
Entre os participantes, que revelam os melhores livros de 2024 que leram este ano, estão autores best-sellers, como Itamar Vieira Junior e Jeferson Tenório, escritores vencedores do prêmio Jabuti 2024, como Rosa Freire D’Aguiar e Samir Machado de Machado, e grandes nomes da literatura brasileira, de Ignácio de Loyola Brandão a Micheliny Verunschk.
A indicação era livre, podendo ser de qualquer país e gênero literário, com a única regra de que o livro tivesse sido publicado no Brasil em 2024. O resultado foi uma lista diversa, com contos, poesia, romances e ensaios. Apenas um livro aparece duas vezes: Bambino a Roma, de Chico Buarque.
Os melhores livros de 2024
Cavalos no Escuro, de Rafael Gallo
- Quem indica: Bethânia Pires Amaro, escritora, vencedora dos prêmios Jabuti e Sesc por O Ninho
- “Um contista excepcional, nesta obra Rafael Gallo nos presenteia com uma série de preciosas, imensas miudezas: a angústia de um artista que se vê forçado a tocar sempre a mesma música, a pedido do público; a indignação de um guarda-vidas obrigado a assistir à teimosia perigosa dos banhistas; a dor de um homem que se vê dividido entre a lealdade à esposa e a seu próprio patrão. A estranheza que permeia toda experiência humana digna de nota vem com força em cada conto, apresentado sob o olhar único e sensível de personagens dos quais é impossível desgrudar a vista. Uma leitura feroz para fechar o ano em excelente companhia.”
- Editora: Record (208 págs.; R$ 64, 90 | E-book: R$ 39,90)
Bambino a Roma, de Chico Buarque
- Quem indica: Jeferson Tenório, escritor, vencedor do prêmio Jabuti por O Avesso da Pele
- “Bambino a Roma, de Chico Buarque, coloca a memória como material literário. Com uma narrativa sincera e delicada temos acesso a um mundo interior da infância, das primeiras descobertas, impressões sobre o futebol e a cultura, revelando muito sobre um Brasil do século passado ao mesmo tempo nos conectando com o Brasil de hoje.”
- Quem indica: Rosa Freire D’Aguiar, jornalista e escritora, vencedora do prêmio Jabuti por Sempre Paris
- “A gente vai lendo aquele texto perfeito, finge que acredita no que diz a capa – ‘ficção’ – e fecha o livro radiante com aquele garoto de calça curta que se lembra do cheiro de alho e coentro, da livraria, dos assobios, da Martine Carol, dos gomos da tangerina, do erotismo nascente, da bola de futebol. Para que mais?”
- Editora: Companhia das Letras (168 págs.; R$ 63,92 | E-book: R$ 29,90)
Solenoide, de Mircea Cărtărescu
- Quem indica: André de Leones, escritor e crítico literário, vencedor do prêmio Sesc de Literatura por Hoje Está um Dia Morto
- “O narrador de Solenoide descreve esse romance estranhíssimo como ‘um antilivro, a obra para sempre obscura de um antiescritor’. O autor cria um duplo que jamais vivenciou o sucesso como escritor e ganha a vida como professor. A partir desse distanciamento, Cărtărescu narra uma série de ocorrências insólitas, delirantes e, no limite, apocalípticas. À pergunta sobre o que salvar do fogo, uma criança ou uma obra de arte, Cărtărescu oferece uma terceira possibilidade, concretizada no próprio livro.”
- Editora: Mundaréu (784 págs.; R$ 146)
Causa Amante, de Maria Gabriela Llansol
- Quem indica: Micheliny Verunschk, escritora e crítica literária, vencedora do prêmio Oceanos por Caminhando Com os Mortos
- “Causa Amante, de Maria Gabriela Llansol, é um dos títulos da autora portuguesa, falecida em 2008, que a editora 7Letras tem publicado no Brasil. O livro narra um encontro simultaneamente poético, filosófico e político entre Ana de Peñalosa e San Juan de la Cruz, no qual a condição da mulher, da escrita, da ficção e da memória são colocadas em jogo e em tensão contra a ‘impostura da língua’. Llansol, como sempre, amplia os limites e territórios da linguagem. A obra desta que é uma das mais inventivas e geniais escritoras em língua portuguesa, vem se tornando cada vez mais conhecida do leitor brasileiro e, também por isso, celebro a publicação de Causa Amante no Brasil.”
- Editora: 7Letras (192 págs.; R$75)
Cassandra em Mogadício, de Igiaba Scego
- Quem indica: Itamar Vieira Junior, escritor, vencedor dos prêmios Jabuti e Oceanos por Torto Arado
- “Uma história sobre o impacto do colonialismo no mundo contemporâneo, o exílio e o eterno deslocamento que muitos viveram e viverão por terem sido esvaziados de sua humanidade e transformados em outros”.
- Editora: Nós (376 págs.; R$89 | E-book: R$ 62,30)
O Sublime Objeto da Ideologia, de Slavoj Žižek
- Quem indica: Adriana Lisboa, escritora, vencedora do prêmio José Saramago por Sinfonia em Branco
- “Originalmente publicado em 1989 e recentemente revisitado, O Sublime Objeto da Ideologia, do sempre provocativo filósofo esloveno Slavoj Žižek, é uma obra brilhante que analisa as forças que moldam nossas crenças e desejos. Entrelaçando Lacan, Marx e Hegel com a cultura pop, Žižek explora de que maneiras a fantasia ideológica sustenta nossa realidade, mesmo diante do cinismo moderno. Um livro para pensar os enigmas do poder, da ilusão e do desejo no mundo contemporâneo.”
- Editora: Civilização Brasileira (322 págs.; R$99,90 | E-book: R$ 19,96)
De Onde Eles Vêm, de Jeferson Tenório
- Quem indica: Ignácio de Loyola Brandão, escritor, jornalista, imortal da Academia Brasileira de Letras
- “Gostei bastante. Aliás, ele vem arrasando. Um tema atualíssimo, ainda não explorado em nossa literatura: o das cotas e dos cotistas. Romance sobre preconceitos, batalhas, discriminação.” LEIA ENTREVISTA COM O AUTOR
- Editora: Companhia das Letras (208 págs.; R$ 74,90 | E-book: R$ 39,90)
O Livro Africano Sem Título: Cosmologia dos Bantu-Kongo, de Kimbwandende Kia Bunseki Fu-Kiau
- Quem indica: Cidinha da Silva, escritora, vencedora do prêmio Literário Biblioteca Nacional por Um Exu em Nova York
- “O Livro Africano Sem Título: Cosmologia dos Bantu-Kong, fruto da tradução feita por Tiganá Santana da primeira obra do filósofo congolês Bunseki Fu-Kiau, apresenta aspectos fundamentais das filosofias e sabedorias da África Central que modelaram o país que entendemos como Brasil. Trata-se de obra de imensurável importância para que nós, desta parte da diáspora africana codinominada Brasil,conheçamos nossa origem e compreendamos nosso lugar no mundo a partir dela e de tudo o que nos legou pela memória, elementos que reconstruímos e ressignificamos aqui, nas terras de pindorama, para onde nossos ancestrais foram trazidos à força. Este livro nos apoia no caminho de volta, com os pés ancorados no presente que edificamos e olhos voltados para onde queremos chegar. Por estes motivos, considero que este foi o livro mais importante lançado em 2024.”
- Editora: Cobogó (208 págs.; R$ 60,20)
Juventude sem Deus, de Ödön Von Horváth
- Quem indica: Samir Machado de Machado, escritor, vencedor do prêmio Jabuti por O Crime do Bom Nazista
- “Um professor repreende o aluno por uma fala racista. Enfurecido, o menino conta ao pai, que reclama na direção e termina acusando o professor de sabotar a pátria, pois ‘sua pieguice humanitária busca solapar as almas inocentes de nossas crianças!’. A situação vai crescendo numa bola de neve, com uma morte misteriosa e uma investigação. Escrito em 1937 em plena Alemanha nazista, bem poderia ser o Brasil do Escola sem Partido, onde professores tem sido acuados por pais que julgam o ensino de qualquer noção básica de Humanismo e tolerância uma doutrinação ideológica. Tristemente atual.”
- Editora: Todavia (176 págs.; R$ 74,90 | E-book: R$ 49,90)
Krakatoa, de Veronica Stigger
- Quem indica: Lorena Portela, escritora, autora de Primeiro Eu Tive Que Morrer e O Amor e sua Fome
- “Foi um ano excelente pra literatura brasileira, não tive tempo de ler vários títulos que queria, mas, dentre os que li, vou citar Krakatoa, da Veronica Stigger. Um livro que me pegou pelo pescoço, é todo inventivo, esquisito, um prato generoso para quem ama literatura e me fez querer saber mais sobre a autora, cujo trabalho eu ainda não conhecia.”
- Editora: Todavia (176 págs.; R$ 74,90 | E-book: R$ 58,80)
De Quatro, de Miranda July
- Quem indica: Mariana Salomão Carrara, escritora, vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura por Não Fossem as Sílabas do Sábado
- “Sou muito fã da Miranda July desde o filme Eu, Você e Todos Nós. O novo romance dela, De Quatro, chegou no Brasil com a tradução da querida Bruna Beber. Temos aqui aquela Miranda – ou sua narradora – idiossincrática que eu já amava em O Primeiro Homem Mau, com seus rituais cômicos e ternos. Ela nos deixa tão dentro das minúcias de sua mente que, quando nos damos conta, é dentro da nossa cabeça que ela está e são nossos segredos coletivos que ela está contando. Queria que Miranda lançasse um livro ou um filme por ano, que ela fosse minha amiga, que pudéssemos adivinhar e completar os pensamentos uma da outra, num delicioso livro vivo.”
- Editora: Amarcord (322 págs.; R$76,41 | E-book: R$ 15,96)
Destinatário Desconhecido: Uma Antologia Poética, de Hans Magnus Enzensberger
- Quem indica: Michel Laub, escritor, jornalista, autor de Passeio com o Gigante, entre outros
- “Indico a poesia do alemão Hans Magnus Enzensberger (1929-2022), que em 2024 ganhou uma antologia muito bem organizada e traduzida por Daniel Arelli. Este é um autor da geração que se tornou adulta no pós-guerra, tendo de lidar com a herança da catástrofe nazista. Nas décadas seguintes ele elaborou isso juntando engajamento político e temas amorosos e existenciais, tudo com uma exatidão de forma e um senso de humor notáveis.”
- Editora: Círculo de Poemas (224 págs.; R$ 74,90 | E-book: R$ 52,40)
O Dia Escuro, org. de Fabiane Secches e Socorro Acioli
- Quem indica: Jarid Arraes, escritora, autora de Redemoinho em Dia Quente e Corpo Desfeito, entre outros
- “Um livro poderoso que reúne 20 autoras brasileiras de várias regiões do Brasil para escrever horror. Na minha opinião, a obra entrega muito mais do que inquietações, ela mostra a diversidade das interpretações que mulheres fazem do que é horrível, do que causa incômodo e do que dá medo. E é também uma leitura incrível, rica em estéticas e linguagens únicas de cada autora. O Dia Escuro aproxima as escritoras brasileiras de outras escritoras latino-americanas que já estão publicando um horror muito peculiar, social e impactante há certo tempo. E mais: contribui para que o gênero rompa preconceitos e seja valorizado por sua riqueza literária.”
- Editora: Companhia das Letras (232 págs.; R$ 79,90 | E-book: R$ 39,90)
Febre de Carnaval, de Yuliana Ortiz Ruano
- Quem indica: Luciany Aparecida, escritora, vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura por Mata Doce
- “Romance perturbador, que com uma linguagem fronteiriça entre a poesia e a prosa, flerta com a rumba e nos envolve no cotidiano de Ainhoa, uma criança negra equatoriana, que descreve seus espaços de tristezas gerados pela asfixia do machismo-patriarcal. Febre de Carnaval traz temas urgentes para nós, sociedade latino-americana, como abandono parental e o abuso sexual na infância.”
- Editora: Bazar do Tempo (152 págs.; R$ 74 | E-book: R$ 55,50)
- Bônus: A escritora também indica Lélia Gonzalez: Um retrato, de Sueli Carneiro: “Esse livro é um refinado espelho do Brasil. Nele, Sueli Carneiro escreve sobre a trajetória intelectual de Lelia Gonzalez, enquanto nos ensina sobre: a história do movimento negro no país; posições e deslocamentos de lugares das mulheres negras na sociedade brasileira. Lélia Gonzalez um retrato é uma leitura urgente para toda a sociedade contemporânea.” Editora: Zahar (128 págs.; R$44,91 | E-book: R$ 29,90).
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