Poucos índices são mais reveladores do fracasso civilizacional do que a taxa de analfabetismo. Num contexto marcado pela Sociedade da Informação com sua ampla oferta de acesso a praticamente todos os bens culturais, o analfabetismo deveria ser um anacronismo, uma fase superada do subdesenvolvimento. Contudo, as estatísticas das últimas décadas deixam claro que a erradicação do analfabetismo absoluto no Brasil, prevista no Plano Nacional de Educação para 2024, certamente não ocorrerá. Particularmente grave é a situação do Estado do Paraná, líder há décadas na Região Sul em número de analfabetos.
A política de erradicação do analfabetismo no Paraná nunca recebeu a prioridade que merece. O problema se arrasta desde o século passado, ganhando contornos dramáticos na atual Sociedade da Informação. O contexto atual demanda cidadãos capazes de promover seu próprio aperfeiçoamento pessoal, bem como profissionais cada vez mais qualificados. Nada disso está ao alcance das centenas de milhares de paranaenses maiores de 15 anos que seguem analfabetos.
Em 2004 o analfabetismo absoluto atingia quase 10% dos paranaenses, proporção bem acima da média da Região Sul então com 7,7%. Os números eram ainda piores quando usado o conceito de analfabetismo funcional, isto é, aquele que engloba as pessoas que contavam com menos de quatro anos de escolaridade. Neste caso nada menos de um quarto (25,7%) dos paranaenses eram analfabetos.
Foi no ano de 2004 que teve início o Programa Paraná Alfabetizado (PPA), resultado de uma parceria com o governo federal. A iniciativa visava recrutar voluntários alfabetizadores e coordenadores de turmas de alfabetização, pagando a estes uma pequena ajuda de custo mensal por turma atendida. Com tal programa se pretendia erradicar o analfabetismo absoluto no Paraná até o ano de 2010. Estava previsto o encaminhamento posterior dos alfabetizados para turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA) mantidas por escolas públicas. Desta forma acabaria então o analfabetismo funcional em alguns poucos anos.
Retoricamente todas as lideranças políticas defendem que a Educação Pública seja tratada como prioridade. Na prática os cortes orçamentários, a descontinuidade administrativa e o descaso para com as necessidades dos professores, funcionários e estudantes geralmente prevalecem. Foi o que ocorreu com o Programa Paraná Alfabetizado, tanto por parte do governo federal quanto do estadual.
No que se refere ao Ministério da Educação, para uma demanda de 40.000 pessoas, ocorreu uma redução da oferta de matrículas para apenas 7.500 vagas na 12ª Edição do PPA de 2018, a última a funcionar com certa regularidade antes da pandemia do Coronavírus. Da parte do Governo do Estado do Paraná foram colocados, desde o ano passado, vários obstáculos à abertura de turmas e matrículas dos alunos como a exigência prévia de CPF, RG, celular com SMS etc., alijando a maioria deles (52%) do acesso a Educação de Jovens e Adultos.
O resultado deste desinvestimento no combate ao analfabetismo não demorou a se manifestar. A erradicação do analfabetismo no Paraná continua estagnada, com 9,5% de maiores de 15 anos que não sabem ler nem escrever. A pior face deste desastre de proporções históricas é que é óbvio que não se trata de um problema nacional ou mesmo regional, mas sim de uma opção puramente estadual: o Paraná segue sendo, como já era desde o século passado, o Estado líder na Região Sul em número de analfabetos. De fato, existem muito mais analfabetos no Estado do Paraná (415 mil) que nos demais Estados da região somados como o Rio Grande do Sul (246 mil) e Santa Catarina (135 mil).
A erradicação do analfabetismo deveria ser prioridade de qualquer futuro governo do Estado.
Dennison de Oliveira é professor de História na UFPR e autor do livro “Professor-pesquisador em educação histórica” (Intersaberes, 2011)