Teve governador tocando pandeiro, show de rapper, exibição de vídeo publicitário e elogios. Muitos. A festa preparada em Porto Alegre para comemorar os resultados de seis anos do programa RS Seguro, a principal vitrine do governo de Eduardo Leite, tinha uma razão de ser: a certeza de que nenhum candidato à Presidência de 2026 poderá passar ao largo do debate sobre a insegurança nas ruas do País.
A queda vertiginosa das estatísticas de criminalidade no Rio Grande Sul são o principal trunfo de Leite como pré-candidato à sucessão de Luiz Inácio Lula da Silva enquanto aguarda a definição do futuro de seu partido: o PSDB. Foi o que se viu na quinta-feira, dia 13, no salão Alberto Pasqualini, no Palácio Piratini.
O lugar começou a lotar por volta das 15h15. Policiais civis, militares e federais além de procuradores, magistrados e especialistas em segurança pública subiram a escadaria central da sede do governo gaúcho para o encontro em que Leite tornaria público os resultados do RS Seguro.

Com instrumentos de geolocalização do crime, o uso de inteligência artificial e com a estratégia de dissuasão focada em grupos criminosos violentos e suas lideranças entre outros pontos do programa, o Estado registrou queda de 57% dos homicídios (foram 1.701 em 2024 ante 3.371 em 2017), 87% nos roubos de veículos ( de 17.872 para 2.286) e 78% dos roubos de pedestres no Estado – de 67,4 mil em 2017 para 15,1 mil em 2024.
Encerrada a apresentação dos dados e de casos relatados por policiais, o governador deixou um salão e passou para outro, onde uma nova apresentação do programa foi feita para o público em geral em um palco montado no salão ao lado.
Foi ali que a apresentação dos dados do programa RS Seguro e dos resultados da segurança se transformou em uma festa que terminou com Leite no palco com um pandeiro na mão. Desta vez, para tocar um samba em companhia do rapper Chiquinho Divilas e do grupo Hip Hop com Samba.
Eram já 19h40 quando a festa acabou e o governador foi se reunir com Andrei Roman, o diretor do instituto AtlasIntel – há 15 dias, pesquisa de outro instituto, o Quaest, mostrou que 62% dos gaúchos aprovam a gestão de Leite quase um ano depois das enchentes que afetaram cerca de 2,4 milhões de habitantes do Estado.
“De 2019 até agora, reduzimos pela metade os homicídios no Estado. O indicador que estava em 30 casos por cem mil habitantes em 2017, agora está em 15 por cem mil habitantes. O que buscamos é trazer o índice para abaixo de dez casos por cem mil habitantes e fazer com que o RS Seguro se torne uma política de Estado e não de governo”, afirmou o Leite.
Os dados levam em consideração o período entre 2018 e 2024. “E os dados de 2025 são ainda melhores. Os dois primeiros meses desse ano apontam uma redução importante em relação ao mesmo período do ano passado”, contou.
Foi só após 2019 que o Rio Grande do Sul passou a integrar as áreas de atuação das Polícias Civil e Militar, um processo feito em São Paulo no começo dos anos 2000 durante o segundo mandato de Mário Covas (PSDB), quando o Estado iniciou sua trajetória de queda da criminalidade violenta.
No caso do Rio Grande do Sul, o delegado Antônio Padilha coordenou a criação de um sistema de dados que permite à polícia gaúcha acompanhar as tendências da criminalidade em bairros e em cidades consideradas prioritárias pelo governo. São 23 municípios que concentrava, 44% da população do Estado, além de reunir 72% dos crimes violentos contra pessoas e 90% dos roubos a pedestres e de veículos.
Foram criados indicadores locais e estaduais e reuniões periódicas com juízes, delegados, associações, guardas municipais, policiais militares, promotores e policiais penais e rodoviários todos os meses. Esses encontros passam das áreas, para as cidades até chegar ao Estado, quando o encontro tem a presença de Leite. Padilha conta durante o encontro que a aposta foi na integração, no compartilhamento de dados e na inteligência.
O governo investiu em tecnologia para a perícia e comprou mil câmeras corporais para a Brigada Militar – os seis batalhões que atuam em Porto Alegre usam agora as câmeras, com o aumento de apreensões de drogas e armas, além de redução de até 80% dos casos de desacato à autoridade. “Nosso principal objetivo é transparência e a proteção dos direitos individuais da sociedade em geral”, afirmou o comandante-geral da Brigada Militar, coronel Cláudio Feoli.
Ou seja, enquanto Leite colhe frutos de seu programa, o inverso acontece com outro possível candidato à Presidência, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. No início, sua gestão apostou em operações policiais com alta letalidade e em diminuir o papel das câmeras corporais na PM.
Acabou às voltas com uma crise após o escândalo de corrupção policial em meio ao assassinato de Antônio Vinícius Gritzbach, o delator do PCC, e uma epidemia de roubos de celular com ladrões cada vez mais violentos. Na semana passada, até a vice-cônsul da Colômbia na cidade, Claudia Ortiz Vaca, foi alvejada em um desses assaltos. Ela foi atingida por uma bala perdida, um tipo de ocorrência praticamente inexistente até então em São Paulo.
Ao mesmo tempo, Lula entrou em seu terceiro ano de mandato sem conseguir apresentar nem mesmo uma proposta ao Congresso sobre a segurança pública e o combate ao crime organizado, ficando a reboque das votações patrocinadas pela bancada da bala. Foi assim quando o Congresso acabou com a saidinha temporária dos presos, proposta apresentada pelo deputado federal Guilherme Derrite, o secretário da Segurança de Tarcísio.
Lula assistiu ainda à primeira fuga de presos no sistema penal federal, antes considerado o mais seguro do País para abrigar integrantes de facções criminosas. Leite também investiu na construção de uma penitenciária de segurança máxima para isolar 76 lideranças das principais organizações criminosas do Estado: Bala na Cara e Manos – PCC e CV são minoritários entre os gaúchos.
“Não vamos transferi-los para presídios federais justamente para não aumentar a interação entre eles e os integrantes dessas duas organizações”, afirmou Luiz Henrique Viana, secretário do Sistema Penal e Socioeducativo do Estado. O governador desativou em 2023 a Cadeia Central de Porto Alegre, que ganhara o epíteto de “o pior presídio do mundo”.
Cada vez que uma das facções mata alguém no Estado, não só a área onde ocorreu o crime é saturada de policiais. A região onde nasceu a facção autora do crime sofre o mesmo processo. Por meio das provas, seus líderes são indiciados pelos crimes.
A vigilância nos presídios, o isolamento das lideranças e as apurações de lavagem de dinheiro completam o cenário para que o homicídio se torne um fator ruim para os negócios dos bandidos. É justamente nessa aposta que se baseia a chamada dissuasão focada, uma estratégia que nasceu nos Estados Unidos.
“Temos um programa também de ações preventivas vinculadas às comunidades que mais sofrem com a violência e que vai ajudar a criar a paz mais duradoura, a partir de oferecer perspectiva de futuro para os nossos jovens. O programa não é só falar grosso contra o crime, como a gente vê, muita gente abordando nacionalmente, né? É uma ação concatenada, articulada, bem estruturada em várias frentes e que tá dando resultados consistentes”, disse Leite.
Naquela quinta-feira, o governador ainda anunciou um acordo assinado entre as secretárias de Saúde e de Segurança Pública para evitar distorções em dados estatísticos sobre mortes violentas – muitos dos casos são computados pela polícia como morte a esclarecer apesar da natureza violenta do óbito.
Trata-se de um velho problema dos dados criminais do País – inclusive de São Paulo – que, segundo o governo, o convênio, agora, pretende resolver. Após duas horas de reunião com a apresentação do RS Seguro, Leite ouviu o veredicto de especialistas em segurança pública: eles destacaram os resultados e apoiaram o que chamaram de política pública baseada em evidências.
“O que diferencia o programa do Rio Grande do Sul dos demais é a participação do sistema prisional, do Ministério Público e do Judiciário. Não há bonificação para os policiais em razão dos resultados e, mesmo assim, conseguiu-se uma grande adesão. O papel dos líderes nesse caso é importante”, afirmou Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada à Segurança Pública (CCAS), da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Para a diretora executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, o RS Seguro é um grande modelo para a segurança pública do país, que ainda faz o enfrentamento do crime sem inteligência. Já o presidente do Fórum Brasileiro da Segurança, Renato Sérgio de Lima destacou a queda dos feminicídios obtida pelo programa.
Por fim, o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa, que foi convidado por leite para a reunião afirmou: “Os responsáveis pelo programa mostraram que o Estado pode ser mais organizado”. Desde o fim do ano passado, durante a crise causada pelo assassinato do empresário Antônio Vinicius Gritzbach, o delator do PCC, Costa se tornou um dos principais interlocutores de Tarcísio para a segurança pública.
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