O Senado aprovou nesta quarta-feira, 5, a volta da taxação de 20% do imposto sobre as compras internacionais de até US$ 50 (cerca de R$ 265). A tendência é a de que ele seja aprovado na Câmara. O efeito prático deve ser um aumento dos preços pagos atualmente pelos consumidores, segundo economistas. Um dos itens mais vendidos, uma jaqueta de couro que hoje custa R$ 45,59, poderá sair por R$ 64,56, 41% a mais, segundo projeções de tributaristas.
A isenção de US$ 50 foi estabelecida em agosto do ano passado pelo programa Remessa Conforme, que isentou de imposto de importação compras internacionais de pessoas físicas abaixo de US$ 50. Atualmente a medida vale para a empresa que aderir ao programa, que é uma espécie de plano de conformidade que regularizou essas transações.
A volta da taxação é fruto de um “jabuti” (jargão usado no meio político para definir algo que não tem relação com o texto principal) do projeto de lei 914/24, que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover). Segundo a Câmara, o projeto prevê incentivos financeiros de R$ 19,3 bilhões em cinco anos e redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para estimular a pesquisa e o desenvolvimento de soluções tecnológicas e a produção de veículos com menor emissão de gases do efeito estufa.
A taxação de 20% chegou a ser retirada do texto pelo senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL), relator do projeto de lei no Senado. O entendimento dele é de que a taxação do e-commerce é um “corpo estranho” ao projeto original.
Amazon, Aliexpress, Shein e Shopee afetados
A taxação impactará diretamente as importações feitas em sites como a Shein, Amazon, Aliexpress e Shopee, embora esta última já tenha declarado apoiar a medida. Segundo a plataforma, apenas 15% dos produtos oferecidos na plataforma são importados.
O preço das “comprinhas” deverá ir além dos 20% da taxação, já que ela é apenas sobre a importação, e não leva em conta o cálculo do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e outros que incidem em forma de cascata, entre eles o frete.
“Não é só a tributação de 20%, mas tem a questão que envolve outras situações de tributações. Além do imposto de importação, você tem a incidência de outras cobranças, como o frete, o ICMS, que é calculado sobre o valor total da compra, já incluindo o cálculo o valor de importação”, afirma Caio Bartine, advogado e professor de direito tributário.
O efeito prático da medida pode ser uma queda nas vendas, segundo o advogado Guilherme Di Ferreira, do escritório Lara Martins Advogados, e especialista em direito tributário. “O consumidor final para de fazer o seu consumo. Então a gente não consegue enxergar que será bom para o mercado nacional nem para o consumidor final”, diz. Se o consumidor faz uma compra de R$ 100 de um relógio, por exemplo, vai incidir os 20%, e daí vai para R$ 120. Depois incide os 17% de ICMS, o que soma mais R$ 20,40. Ou seja, um produto que hoje custa R$ 100, sairá por R$ 140,40.
A questão da inclusão do “jabuti” no projeto divide opiniões. Enquanto alguns defendem que ela pode ser judicializada, já que é um “corpo estranho” ao projeto, outros defendem que não há espaço para isso.
“É a retirada de um benefício fiscal. Ele [imposto] já existe. A retirada do benefício fiscal é uma prerrogativa do governo, e o que existe é uma questão de legalidade. O questionamento por si é uma questão política, de arrecadação. E o consumidor também não pode questionar, desde que a legislação tenha seguido o rito normal”, defende Kristian Rodrigo Pscheidt, advogado especialista de direito econômico do escritório MV Costa Advogados.
A alta dos preços citada pelos especialistas são projeções, já que um outro efeito em cascata da medida deve ser a alta no valor do frete, o que deverá encarecer ainda mais o produto em relação ao que é pago hoje. O valor também dependerá de quanto as empresas irão absorver o impacto da medida. A Shopee diz apoiar a medida, e alega que apenas 10% de suas vendas no país são de produtos importados (confira em nota ao final deste texto).
A reportagem solicitou que os tributaristas fizessem os cálculos de quanto deverá 10 itens importados que estão entre os mais buscados, comprados e mais bem avaliados nos quatro sites de compras citados na reportagem. O cálculo leva em conta a alíquota de 17% de ICMS, que também pode sofrer variações, e não inclui a variação do preço do frete. Confira abaixo
Jaqueta de couro
Valor atual: R$ 45,59
Quanto deve ficar: R$ 64,01
Sapatos femininos de salto agulha
Valor atual: R$ 74,66
Quanto deve ficar: R$ 104,82
Conjunto de 12 talheres de silicone
Valor atual: R$ 49,98
Quanto deve ficar: R$ 70,17
Relógio de aço
Valor atual: R$ 101,72
Quanto deve ficar: R$ 142,81
Camisa feminina
Valor atual: R$37,95
Quanto deve ficar: R$ 53,28
Kit com 50 balões decorativos para festas
Valor atual: R$ 14,99
Quanto deve ficar: R$ 21,04
Alto-falante bluetooth portátil à prova d’água
Valor atual: R$248,54
Quanto deve ficar: R$ 348,95
Mini projetor portátil
Valor atual: R$ 291
Quanto deve ficar: R$ 408,56
Cinto com fivela de couro
Valor atual: R$ 22,46
Quanto deve ficar: R$ 31,53
Brincos de folha
Valor atual: R$ 8,99
Quanto deve ficar: R$ 12,62
Shopee
Em nota divulgada nesta quarta-feira, a Shopee informou ser a favor do imposto de importação de 20% e afirma que está estabelecida no país desde 2019. A empresa diz apoiar o empreendedorismo e que 90% de suas vendas no país são de vendedores nacionais.,
A empresa afirma que seu foco é local, e que tem como meta “desenvolver cada vez mais o empreendedorismo brasileiro e o ecossistema de ecommerce no país e acreditamos que a iniciativa trará muitos benefícios para o marketplace”, diz a nota. “Não haverá impacto para o consumidor que comprar de um dos nossos mais de 3 milhões de vendedores nacionais que representam 9 em cada 10 compras na Shopee no país”, diz outro trecho.
Shein
Já Marcelo Claure, presidente do conselho para América Latina da Shein, afirma que os produtos podem chegar a ficar até 100% mais caros, segundo entrevista concedida ao Estadão no início de maio. O executivo afirmou que 91% dos clientes do marketplace são das classes C, D e E, e o custo da empresa deverá ser repassado aos mais de 45 milhões de consumidores da varejista de moda no País.
Foto: Divulgação AliExpress
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