Há poucos dias, aqui em Curitiba, uma mulher foi morta a facadas, depois de discutir com um homem dentro de um ônibus. Mesmo em época de banalização da violência, o crime causou comoção, porque a vítima interferiu em discussão a favor de outro passageiro, por motivo banal.
A revolta foi ainda maior ao ser revelado, após a prisão do assassino, que ele é, como disse um jornal, “um andarilho do crime”. Natural do Ceará, já tem registro de delitos no Rio Grande do Sul e, pasme, estava em liberdade provisória após ter sido acusado de matar outra pessoa aqui mesmo em Curitiba, em setembro do ano passado. Preso, passou apenas 20 dias na cadeia. Assim como no assassinato no ônibus, o crime anterior ocorreu por razão fútil, depois de discussão com vizinho por causa de som alto.
Que o Brasil é o país da impunidade, estamos cansados de saber. Os (maus) exemplos abundam e vão da falta de sensatez nos julgamentos ao esquecimento dos direitos dos mais pobres, sem esquecer das excessivas benesses concedidas à categoria dos Magistrados, vantagens essas que os deixam totalmente dissociados da realidade do país. Sabe-se que na maioria dos tribunais brasileiros não há mais espaço para armazenar os calhamaços de processos, muitos dos quais jamais foram folheados. A explicação dada comumente – a de que são poucos Juízes para muitas demandas, há muito deixou de convencer, ainda mais em tempos de internet, digitalização e audiências remotas.
Quem não lembra, p.ex., do Desembargador que em plena vigência da pandemia foi filmado ao ser abordado por Guarda Municipal na cidade de Santos (SP) porque não estava usando máscara? O Desembargador desrespeitou o servidor, humilhando-o a ponto de dizer que jogaria a multa em sua carta, o chamou de analfabeto e – não se sabe se simulou ou foi real – ligou para o Secretário Municipal de Segurança Pública, para tentar dissuadir o guarda de aplicar a multa. O descalabro foi ainda maior: em entrevista que concedeu posteriormente o arrogante cidadão referiu-se forma racista e preconceituosa ao Guarda Municipal, à quem chamou de “negro arrogante”…
O crime cometido aqui em Curitiba e a lembrança do papelão de S. Ex.ª me fez recordar de um caso que ocorreu na Inglaterra já há algum tempo.
Em 2003, um deputado inglês chamado Chris Huhne foi pego por um radar dirigindo em alta velocidade. Para não perder a carteira por excesso de pontos, a mulher dele, Vicky Price, assumiu a culpa. O tempo passou e o deputado tornou-se ministro da Energia, só que o seu casamento acabou. Vicky Price decidiu vingar-se do ex-marido e contou a história à imprensa.
Como isso foi na Inglaterra, Chris Huhne, ministro, demitiu-se primeiro do Ministério e depois do Parlamento.
ACABOU A HISTORIA?
Como disse, isso foi na Inglaterra e na Inglaterra é crime mentir à Justiça. Assim, essa mesma Justiça funcionou e quando o caso veio à tona, os ex-casados foram condenados a 8 meses de cadeia cada um e ao pagamento de uma multa de 120 mil libras.
Segredo de Justiça? Nem pensar, julgamento aberto ao público e à imprensa. Quem quis, viu e ouviu. Segurança nacional? Nem pensar, infrator é infrator. Privilégio porque era político? Nada!
E o que disse o Primeiro-Ministro David Cameron quando soube da condenação do seu ex-ministro?
– “É uma conspiração da mídia para denegrir a imagem do meu governo” ou “é um atentado contra o meu bom nome e dos meus Ministros”?
Errado. Esqueçam, nada disso! O que ele disse foi sobre o funcionamento da Justiça:
– “É bom que todos saibam que ninguém, por maior e mais poderoso que seja, está fora do braço da Lei.”
Estes ingleses monárquicos são mesmo um bando de atrasados, não são? Deve ser muito complicado viver em um país onde a Justiça é justa…