Os ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anularam a colaboração premiada do advogado Sacha Reck (foto), que delatou e entregou provas, em uma investigação criminal, contra a empresa para qual trabalhava, a companhia de transportes coletivos Pérola do Oeste – investigada pela Operação Riquixá por suposta participação em fraudes em licitações de concessão do serviço público de transporte no Paraná. Com a derrubada do acordo, todas as provas decorrentes dele são invalidadas.
O entendimento fixado pelo colegiado é o de que são inadmissíveis provas decorrentes de acordo de colaboração premiada firmado com violação do sigilo profissional de advogado. Por maioria de votos, os ministros seguiram o posicionamento do relator Sebastião Reis Junior, que entendeu que o advogado não poderia ter quebrado seu sigilo profissional. Segundo o magistrado, tal ‘ônus’ não pode ser superado nem em caso de investigação, sob pena de se fragilizar o ‘amplo direito de defesa’.
A decisão foi tomada no bojo de um recurso impetrado por dois ex-administradores da empresa de transportes coletivos. Eles pediram ao STJ que anulasse a colaboração do advogado, que foi fechada após Reck ser denunciado e preso, em 2016. Após o Ministério Público do Paraná fechar o cerco ao advogado, ele decidiu fechar uma delação – a qual implicou na abertura de novas frentes de investigação e também no acréscimo dos nomes dos dois empresários na denúncia da Promotoria.
O relator Sebastião Reis Junior reconheceu a possibilidade de os empresários delatados questionarem a colaboração premiada fechada pelo advogado, considerando que o acordo acaba por afetar, de forma negativa, seus direitos.
A avaliação do ministro é a de que o Código de Ética da Advocacia não autoriza que um advogado quebre o sigilo profissional para atenuar sua própria pena, em um processo no qual ele e seu cliente são investigados. Segundo o magistrado, as únicas brechas para uma eventual quebra do sigilo são casos de grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou ‘quando o advogado for afrontado pelo cliente e, em defesa própria, tenha que revelar segredo – porém, sempre restrito ao interesse da causa’.
“Ao delatar, o advogado que oferece informações obtidas exclusivamente em razão de sua atuação profissional não está defendendo sua vida ou a de terceiros; nem sua honra (afinal, confessa não só um crime como a sua participação em organização criminosa); nem está agindo em razão de afronta do próprio cliente (ao contrário), nem em defesa própria (não está usando as informações sigilosas para se defender, para provar sua inocência em razão de acusação sofrida, mas sim para atenuar sua pena)”, afirmou.
O ministro citou precedente da Quinta Turma que viu ilegalidade na conduta de um advogado que não era alvo de investigação, mas delatou a empresa para a qual prestou serviços.
O ministro Rogerio Schietti Cruz abriu divergência e restou vencido no julgamento. Ele apontou momentos diferentes da conduta do delator: um relacionado a sua contratação e os fatos descritos na acusação, no qual, segundo o ministro, não há notícia de atuação antiética ou delituosa; e outro pelo qual o advogado foi denunciado, quando ele passou a integrar a suposta organização criminosa.
Para o ministro, o sigilo profissional não alcança o período em que haveria a participação ativa do advogado na suposta quadrilha.
“Não pode servir de escudo para acobertar a prática de crimes por profissionais que detenham esse dever, impedindo-os de confessar, delatar ou mesmo colaborar com o Estado para revelar o cenário criminoso de que não apenas tiveram conhecimento, mas também efetivamente participaram”, ponderou.