HojePR

VIDAL-CABECA-COLUNA

The Cranberries: a maravilhosa melancolia irlandesa

02/10/2024

The Cranberries é uma daquelas bandas que são difíceis de esquecer. Com o seu término, após o falecimento da vocalista, guitarrista e principal compositora Dolores O’Riordan, suas canções ficam na memória bastando tocar os seus primeiros acordes. O segundo álbum dos irlandeses, No Need To Argue, foi lançado em 3 de outubro de 1994, portanto completando trinta anos. Fez um estrondoso sucesso, vendendo mais de 17 milhões de cópias até hoje. Completam a banda o guitarrista Noel Hogan, o baixista Mike Hogan e o baterista Fergal Lawler. A produção do álbum fica a cargo do renomado Stephen Street, produtor do The Smiths, Blur, entre outros.

The Cranberries No Need To Argue

Ode To My Family abre o álbum com uma melodia folk simples, apoiada por uma guitarra limpa e uma bateria suave, captura perfeitamente o sentimento de nostalgia. O vocal de Dolores é envolvente, alternando entre suavidade e um leve lamento, destacando a sensibilidade da letra, que é uma reflexão sobre o lar e a perda da inocência com o passar do tempo. “Does anyone care?” é uma das frases mais repetidas, deixando a canção maravilhosa.

 

I Can’t Be With You é uma faixa mais enérgica, mas ainda permeada por uma sensação de tristeza. A canção fala sobre a dor de um amor não correspondido ou impossibilitado. O som aqui é mais agressivo, com uma bateria mais presente e guitarras distorcidas que se contrapõem ao vocal vulnerável de Dolores. “Lying in my bed again, And I cry ‘cause you’re not here, Crying in my head again, And I know that it’s not clear, Put your hands, put your hands, Inside my face and see that it’s just you, But it’s bad and it’s mad, And it’s making me sad, Because I can’t be with you.”

Twenty One é mais lenta e introspectiva. O título refere-se à idade de 21 anos, um marco de transição da juventude para a vida adulta, e a letra sugere uma sensação de vulnerabilidade e dúvida em relação ao futuro. A voz de Dolores, com sua entrega suave e emocional, é o destaque, acompanhada de uma instrumentação simples, criando uma melodia inesquecível.

Provavelmente a faixa mais famosa do álbum e da carreira da banda, Zombie é uma poderosa canção de protesto, escrita como resposta ao conflito entre a Irlanda e o Reino Unido, em particular ao atentado a bomba em Warrington em 1993, que matou duas crianças. Com guitarras pesadas e distorcidas, influências do grunge e uma performance vocal crua e enérgica de Dolores, retrata o impacto da violência e da guerra sobre a sociedade e as gerações futuras. É agressiva, visceral e ainda hoje ressoa como um hino contra a brutalidade e a perda de vidas inocentes. “But you see, it’s not me, It’s not my Family, In your head, in your head, they are fighting, With their tanks and their bombs, And their bombs, and their guns, In your head, in your head they are crying, In your head, in your head, Zombie, zombie, zombie-ie-ie, What’s in your head, in your head, Zombie, zombie, zombie-ie-ie-ie, oh.”

Empty retorna a uma sensação mais melancólica e introspectiva. Explora sentimentos de vazio e solidão, com uma melodia suave e melancólica, destacando a habilidade da banda em misturar emoções profundas com um instrumental contido. O arranjo é simples, com camadas de guitarras leves e uma linha de baixo que dá um ritmo moderado, enquanto a voz de Dolores permanece no centro emocional da faixa.

Com uma melodia que combina tristeza e suavidade, Everything I Said aborda o tema da comunicação e dos arrependimentos que vêm com o que é dito (ou não dito) em relacionamentos. As guitarras acústicas e o uso de sintetizadores atmosféricos criam uma sensação suave, enquanto o vocal etéreo de Dolores expressa o arrependimento e a busca por redenção.

Outra faixa com forte carga política, The Icicle Melts aborda a dor de perder uma criança em meio a um conflito violento. A canção traz uma crítica à guerra, mas de maneira mais direta e emocionalmente crua. O tom aqui é de lamento e descrença, com uma estrutura musical simples que serve de pano de fundo para a vocalização intensa de Dolores.

Disappointment tem uma melodia acústica delicada e uma progressão simples. Aborda o tema da decepção pessoal e emocional. O tom suave, quase sussurrado, de Dolores, junto com arranjos mínimos, cria uma atmosfera íntima e confessional. A simplicidade do instrumental contrasta com a profundidade emocional da letra, onde ela reflete sobre expectativas frustradas e desilusões.

Uma das canções mais dinâmicas do álbum, Ridiculous Thoughts tem uma energia crescente, marcada por guitarras distorcidas e um refrão poderoso. A letra lida com as inseguranças e dúvidas que surgem em situações de grande pressão emocional, talvez refletindo as próprias experiências de Dolores com a fama. A intensidade da canção cresce à medida que a faixa avança, com um clímax vocal impressionante. “Twister, oh, does anyone see through you? You’re a twister, oh, an animal, But you’re so happy, how? I didn’t go along with, You’re so happy, how? Na, na, na, na, But you’re gonna have to hold on, You’re gonna have to hold on, You’re gonna have to hold on, Hold on, hold on.”

Dreaming My Dreams é uma balada acústica e uma das faixas mais suaves do álbum, com uma atmosfera quase de sonho. A letra fala sobre esperança e um desejo de renovação emocional, em contraste com o tom mais sombrio de outras canções do álbum. A voz suave de Dolores, acompanhada por uma guitarra acústica sutil, cria uma sensação de otimismo e paz, em meio às dificuldades.

Yeats’ Grave presta homenagem ao poeta irlandês W.B. Yeats, um dos ícones literários da Irlanda. A letra reflete sobre a importância da sua obra e o impacto que ele teve no país. A canção é carregada de orgulho nacional e reverência cultural, com uma melodia que combina elementos tradicionais com o estilo rock característico da banda.

Uma das canções mais intrigantes e variadas do álbum, Daffodil Lament começa com uma melodia melancólica e lenta, antes de transitar para uma seção mais esperançosa e dinâmica. As mudanças de ritmo e tonalidade ao longo da canção simbolizam a oscilação emocional entre a depressão e a esperança. A transição de uma tristeza profunda para uma sensação de renovação faz desta uma das faixas mais complexas e emocionalmente poderosas do álbum.

No Need To Argue, a faixa-título, fecha o álbum de forma solene, com uma melodia de piano simples e tocante. A letra fala sobre aceitação e resignação em um relacionamento fracassado, com a voz de Dolores transmitindo uma profunda tristeza, mas também uma sensação de paz ao aceitar o inevitável. É uma maneira melancólica, porém apropriada, de encerrar o álbum.

No Need To Argue é um álbum que equilibra brilhantemente a introspecção pessoal com questões sociopolíticas mais amplas, enquanto a voz única de Dolores O’Riordan guia o ouvinte por um terreno emocional vasto e muitas vezes sombrio. É o alternative rock irlandês. O rock’n’roll irlandês. O bom e velho rock’n’roll.

Leia outras colunas do Marcus Vidal aqui.

Deixe seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *