O ano era 1984. Eu já com 23 anos.
Algumas colegas já eram mães e eu ainda não sabia o que fazer da vida.
Formada em Nutrição e trabalhando, mas insatisfeita e sempre buscando mais.
Lembro que na infância/adolescência queria ser tudo: aeromoça , médica, violinista, bailarina, pintora, modelo, trabalhar em escritório, trabalhar de caixa nas lojas Americanas.
Eram tantas aspirações que me perdi. E no fim me atrapalhei na hora da minha escolha profissional.
Eis que casualmente ouvi no rádio que estavam recrutando moças para serem misses.
Isso mesmo, você leu direito: recrutando misses. Nem sabia que podia se oferecer pra isso.
Achei que somente moças escolhidas a dedo por administradores da cidade é que se tornavam.
Achava mais chique ser Glamour Girl ou Garota Caiobá, concursos promovidos pelo colunista Dino Almeida, que havia no final dos anos 70 e durante os anos 80.
Mas gostava de assistir aos antigos concursos de Miss Brasil que passavam na TV e eram aguardados com muita expectativa.
Anotei o endereço. Se não me engano era no Edifício Asa.
Tomei um banho, me arrumei, pus salto e fui.
Naquela época não tinha essa de ser loira com luzes, reflexos.
O único recurso pra quem não nasceu loira e queria se tornar, era “oxigenar” os cabelos.
Mas daí ficava aquele cabelo sem vida, meio amarelo esbranquiçado.
Todas que tentavam ser loiras assim se arrependiam em pouco tempo e quase sempre a solução era cortar o cabelo bem curto e esperar crescer tudo de novo.
Então, como era loira, acabava chamando a atenção. E era comprida.
O problema é q eu tinha os seios grandes. Grandes mesmo.
Na época o bonito era ser “tábua”. Ter bem pouquinho.
Eu tentava “achatar”, usava soutien bem apertado para parecer menos.
Ao chegar no endereço, me apresentei para a recepcionista, meio sem jeito. Disse que tinha vindo para me candidatar a ser miss.
Me encaminhou para o diretor: Sr Danilo D’Ávila, um empresário na área de eventos e concursos de beleza.
Não demorou muito e já saí como candidata a miss de uma cidade do Paraná, que por razões que desconheço, não tinha escolhido sua candidata à tempo.
Nooosssa! Assinei os papéis e tudo certo!
Saí de lá radiante. Mas meio envergonhada.
Como eu ia falar para as pessoas que eu tinha me oferecido pra ser miss?
Não fazia sentido. Resolvi não contar pra quase ninguém que agora eu era miss. Nem pra família.
Aos poucos que contei, falava vagamente e logo desviava a conversa.
Falar que eu tinha ido com as minhas próprias pernas em um escritório me candidatar. Nem pensar. Era muito esquisito.
O concurso seria em poucos dias e a primeira etapa em Paranaguá, no Ginásio … Tramujas.
Liguei para o prefeito da cidade que ia representar e perguntei se ele pagaria o aluguel de um vestido de gala para o desfile.
Tudo certo! Um assessor me atendeu e acertou o valor. Aluguei na Veridiane.
A parte mais difícil foi aprender a desfilar. Com aquele salto 12 ou 15 da sandália. E ainda fazer a voltinha…
Eu tinha um namorado na época que me ajudou.
Achou engraçado essa história de ser miss e resolveu me dar umas dicas.
Com uma enciclopédia na cabeça e os saltos altos, ficava desfilando na sala.
Lembro que na hora da voltinha, eu me embananava e ele ia na frente me mostrando como colocar o pé direito na frente, rodopiar o corpo 180 graus e sair novamente com o pé direito.
Tudo isso sem olhar pro chão, encolhendo a barriga, empinando o bumbum, costas retas, sorrindo e sem cair na gargalhada.
Com certeza ele levava mais jeito do que eu para a coisa.
Após dias de ensaio eu estava melhorzinha. Ou talvez, menos ruim.
Mas minha falta de auto confiança para entrar na passarela era paralisante. Tinha pânico só de pensar em desfilar.
E essa sensação só piorava. Pensei até abandonar tudo mas a essa altura eu estava enrolada até o pescoço. E no fundo eu queria e tinha que vencer esse medo.
No dia anterior ao concurso, eu e todas as misses das cidades do Paraná nos encontramos e saímos em um ônibus com destino à Paranaguá.
Visitamos pontos turísticos, jantamos em um restaurante, muitas fotos e várias pessoas curiosas nos observando.
Me senti uma celebridade.
No dia seguinte foram horas de arrumação, bobes, escovas, maquiagem e o maiô catalina preto com o salto alto.
Tudo isso até foi fácil.
Mais o medo da passarela estava ali. Uma sensação constante de frio na barriga.
E conforme as horas passavam, comecei a temer a entrevista.
Meu medo também era de que fizessem perguntas.
Se tivesse que contar o porquê que queria ser miss, nem sabia o que responder
Ia falar que queria ser famosa? Isso não podia né, mas falar o quê?
Os apresentadores eram a Susi Rêgo e o Marquinhos Moura. Famosos na época.
Ela tinha sido Miss Brasil há pouco tempo. Era linda e simpática.
Auditório cheio.
Meu irmão e minha mãe foram até lá assistir nessa primeira etapa, em Paranaguá.
Classificaram 12 moças para a segunda seleção, que seria em Campo Mourão, em pouco menos de um mês.
Fiquei entre as 12. Acho que porque não houve entrevista nesta etapa, por sorte.
Confesso que estava tão apavorada que na hora H fiquei meio anestesiada.. Saí andando. Só lembro que não via a hora daquilo tudo acabar.
Passou na Tv e não contei para amigas e nem para parentes.
Teve só uma tia que soube, a Tia Esmeralda que assistiu a transmissão ao vivo porque ela era ligada em 220V e estava sempre por dentro de tudo.
E daí contou para a vovó toda entusiasmada mas eu mesma fiquei depois com vergonha de admitir.
Para a segunda etapa, segui ainda desacreditada. Não conseguia superar aquele pavor da passarela.
Se tivesse investido em desenvoltura, postura, técnicas de desfile, talvez tivesse mais chances.
Não ganhei nem classifiquei.
Acho que os juízes perceberam que pra miss faltava muito.
O mais perto que cheguei é ser chamada de Miss Batavo.
Alguém gritou alto e eu escutei. Talvez por ser representante de Castro mas acho que por outras razões mais óbvias.
Viram uma certa semelhança com aquelas vacas holandesas produtoras de muito leite.
Leia outras colunas da Karin Romanó aqui.
Eu fui
Escrevi com excesso de pronomes, mas agora já foi