A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou em Plenário na manhã desta terça-feira (4) moção de protesto à publicação misógina e ofensiva feita por um blog feita no dia 2 de janeiro de 2025. O requerimento foi proposto pela vereadora Laís Leão (PDT), com o apoio de outros parlamentares, e foi aprovado por unanimidade em votação simbólica.
Ao defender a aprovação da moção, a parlamentar destacou que a fala – sua primeira na tribuna como vereadora – poderia ser por um motivo diferente, mas lembrou que as mulheres nunca escolhem os desafios que enfrentam e que, quando o fazem, é de cabeça erguida.
“De forma inaceitável, fotos tiradas na cerimônia de posse desta Legislatura – um momento tão simbólico para o mandato de qualquer parlamentar – foram usadas para tentar nos desqualificar. A matéria atacou a dignidade das parlamentares desta Câmara, nos reduzindo a comentários sobre nossas vestimentas e aparência física, desconsiderando nossa trajetória e nossa capacidade de atuação política”, argumentou a pedetista.
Na época, a repercussão do caso fez com que, dias após a publicação, houvesse uma retratação por parte do blog e o conteúdo fosse removido do site.
Em seu discurso, Laís afirmou que a moção é mais que um protesto, mas um marco de o episódio lamentável conseguiu unir a maior bancada feminina da história da CMC. As doze parlamentares, de nove partidos diferentes, foram unânimes ao declarar que não haverá retrocessos e que machistas não passarão.
“Independente de nossas diferenças políticas, há algo que nos une: somos mulheres e enfrentamos, todos os dias, violências que só nós sabemos”, disse.
Laís citou que a violência política de gênero está tipificada no Código Eleitoral desde 2021, ponderando haver um longo caminho para o efetivo combate desse crime.
“Não podemos mais, dia após dia, assistir inertes às reportagens que contam histórias de quem eram essas mulheres. Precisamos lutar para que elas sejam, vivam e vivam em paz”, defendeu, emocionada.
A vereadora destacou também que os números mostram que muitas violências continuam sendo naturalizadas, silenciadas ou ignoradas. “Esta Câmara não será cúmplice do silenciamento das mulheres na política. É por isso que hoje faço um apelo a esta Casa e a toda a sociedade: precisamos cortar o machismo pela raiz. Precisamos parar de normalizar a violência contra as mulheres e começar a combatê-la de forma estrutural”, afirmou.
Leia a íntegra do discurso
“Hoje, dia 4 de fevereiro, subo a esta tribuna pela primeira vez como vereadora desta Casa. Poderia desejar que fosse por um motivo diferente, mas, se há algo que aprendi ao longo da minha trajetória, é que as mulheres nunca escolhem os desafios que enfrentam. E quando eles surgem, enfrentamos de cabeça erguida.
É com esse espírito que venho, junto com minhas colegas e meus colegas, apresentar esta moção de repúdio contra o conteúdo machista e misógino publicado pelo blog “Blog do Tupan” no dia 2 de janeiro de 2025.
De forma inaceitável, fotos tiradas na cerimônia de posse desta Legislatura – um momento tão simbólico para o mandato de qualquer parlamentar – foram usadas para tentar nos desqualificar.
A matéria atacou a dignidade das parlamentares desta Câmara, nos reduzindo a comentários sobre nossas vestimentas e aparência física, desconsiderando nossa trajetória e nossa capacidade de atuação política.
Faço um agradecimento especial às doze vereadoras desta Casa, a maior bancada feminina da história da Câmara Municipal de Curitiba, e a todos os vereadores que subscreveram esta moção. Obrigada pela coragem de não se calarem. Obrigada por compreenderem que esta não é uma luta só nossa, mas de toda a democracia.
Esta moção, mais do que um protesto, é um marco. No dia 3 de janeiro, mulheres de nove partidos diferentes se uniram em um compromisso comum: machistas não passarão. Não haverá retrocessos. Independente de nossas diferenças políticas, há algo que nos une: somos mulheres e enfrentamos, todos os dias, violências que só nós sabemos.
A violência política de gênero não é novidade no Brasil. Desde 2021, ela está tipificada no Código Eleitoral pela Lei 14.192/2021, mas os dados mostram que ainda há um longo caminho para que seja combatida efetivamente.
Segundo o Observatório da Mulher contra a Violência, 32% das mulheres que atuam na política já foram discriminadas por causa do seu gênero, enquanto apenas 10% dos homens relataram esse tipo de discriminação.
Além disso, um estudo divulgado pelo Instituto Alziras revelou que, entre 2021 e 2023, apenas 7% das denúncias de violência política de gênero resultaram em ações penais eleitorais.
Uma pesquisa realizada pela CNN Brasil reforça esse cenário: uma em cada quatro denúncias foi arquivada sem qualquer desdobramento.
O que esses números nos mostram? Que muitas dessas violências continuam sendo naturalizadas, silenciadas ou ignoradas.
Mas aqui não. Aqui nós falamos. Aqui nós reagimos. Esta Câmara não será cúmplice do silenciamento das mulheres na política. Levamos este caso ao Ministério Público, ao Sindicato dos Jornalistas do Paraná e à OAB-PR, e conseguimos que o conteúdo fosse retirado do ar e que houvesse retratação. Mas isso não basta. Não se trata apenas de um ataque a 12 mulheres eleitas pelo voto popular – trata-se de um ataque ao próprio direito das mulheres de ocupar espaços de poder.
E quando falamos de violência política de gênero, falamos também da violência estrutural que assombra este país. O Brasil vive uma epidemia de feminicídios. Segundo o Observatório da Mulher contra a Violência, a cada 24 horas, pelo menos oito mulheres são vítimas de violência no Brasil. O feminicídio é o último estágio desse ciclo de violência, mas ele começa antes, com falas misóginas, com a naturalização do assédio, com a desqualificação sistemática das mulheres em seus espaços de trabalho – seja no setor privado, seja na política.
É por isso que hoje faço um apelo a esta Casa e a toda a sociedade: precisamos cortar o machismo pela raiz. Precisamos parar de normalizar a violência contra as mulheres e começar a combatê-la de forma estrutural.
O diálogo tem seus desafios. Mas eu acredito que a luta pelo fim da violência contra a mulher é capaz de nos unir. Não podemos mais, dia após dia, assistir inertes às reportagens que contam histórias de QUEM ERAM essas mulheres. Precisamos lutar para que elas sejam, vivam e vivam em paz.
E esse caminho começa agora, com a tolerância zero ao machismo.
Mas se há algo que a história das mulheres nos ensina é que a nossa luta se fortalece quando nos apoiamos. É fundamental que, entre nós, mulheres, cultivemos o diálogo, a escuta e a empatia. Precisamos estar unidas, não apenas para reagir aos ataques que recebemos, mas para construir juntas novos espaços e novas formas de existir na política. O machismo se alimenta do isolamento das mulheres. Que a nossa resposta seja o fortalecimento umas das outras, porque só assim construiremos uma democracia verdadeiramente igualitária.”
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