Quando se está chegando, como eu, aos 80 mil quilômetros rodados, é natural que a gente passe a pensar em como o mundo será amanhã — e a própria palavra “amanhã” adquire um novo significado.
Se o idoso tem filhos, netos e bisnetos, a preocupação com o futuro deles é bem natural. Mas, no meu caso, mesmo com a descendência ainda limitada aos filhos, os pensamentos sobre isso, lamento dizer, não são otimistas. Para reforçar o pessimismo, li que “se D’us quisesse fazer um novo mundo, este seria o momento ideal, porque o primeiro também foi feito a partir do caos”.
Um amigo, que se foi bem antes dos 80, dizia que, depois de uma certa idade, “o futuro da gente foi ontem” — e percebo que ele estava absolutamente certo.
Mesmo com essa visão ácida sobre o futuro da humanidade, sou levado a admitir que a esperança (única) que se contrapõe à teoria (ou à vontade de alguns…) da chegada do “grande meteoro” reside nas crianças e jovens de hoje.
Definir o que é uma nova geração de forma temporal é bem subjetivo, por depender da combinação de fatores socioculturais. Mas o que quero transmitir, sem dúvida, vale para todos, e proponho que generalizemos com a definição “os mais novos”.
Tenho guardada uma história simples, mas muito simbólica, que dialoga com a expressão judaica Tikun Olam, que significa “reparar o mundo” e carrega em si a responsabilidade coletiva de melhorar o mundo, tornando-o um lugar mais justo e harmonioso.
A história é sobre um cientista que vivia muito preocupado com os problemas do mundo e queria encontrar um modo de resolvê-los. Passava dias e dias fechado em seu laboratório em busca de respostas para suas dúvidas.
A autoria é desconhecida, e o registro mais antigo que encontrei é de 2010:
“Um cientista vivia preocupado com os problemas do mundo e estava resolvido a encontrar meios de melhorá-lo. Passava dias em seu laboratório em busca de respostas para suas dúvidas. Certo dia, seu filho de sete anos invadiu o laboratório decidido a ajudá-lo a trabalhar. O cientista, nervoso com a interrupção, tentou que o filho fosse brincar em outro lugar.
Vendo que seria impossível demovê-lo, o pai procurou algo que pudesse ser oferecido com o objetivo de distrair sua atenção. De repente, deparou-se com um mapa do mundo. Com uma tesoura, recortou o mapa em vários pedaços e, junto com um rolo de fita adesiva, entregou ao filho, dizendo:
— Você gosta de quebra-cabeça? Então vou te dar o mundo para consertar. Aqui está o mundo em pedaços. Veja se consegue consertá-lo bem direitinho! Faça tudo sozinho.
Calculou que a criança levaria dias para recompor o mapa. Passadas poucas horas, ouviu a voz que o chamava calmamente:
— Pai, pai, já fiz tudo. Consegui terminar sozinho!
A princípio, o pai não deu crédito às palavras do filho. Seria impossível, na sua idade, ter conseguido recompor um mapa que jamais havia visto. Relutante, o cientista levantou os olhos de suas anotações, certo de que veria um trabalho digno de uma criança. Para sua surpresa, o mapa estava completo. Todos os pedaços haviam sido colocados nos devidos lugares.
— Como seria possível? Como você conseguiu? — perguntou o pai.
E o menino respondeu:
— Pai, eu não sabia como era o mundo, mas, quando você tirou o papel da revista para recortar, eu vi que do outro lado havia a figura de um homem. Quando você me deu o mundo para consertar, eu tentei, mas não consegui. Foi aí que me lembrei do homem. Virei os recortes e comecei a consertar o homem, que eu sabia como era. Quando consegui consertar o homem, virei a folha e vi que havia consertado o mundo.”
Essa narrativa, além de enfatizar a pureza das crianças, mostra que realmente só as novas gerações carregam a responsabilidade e têm como reconstruir um mundo melhor. É um chamado à ação, uma afirmação de que as gerações futuras têm a força e as ferramentas para moldar o futuro de forma mais consciente e justa.
Quem viver, verá.
Mínimas Que São o Máximo
“Caminhante, não há caminho, se faz caminho ao andar”.
Antônio Machado, poeta espanhol (1875-1939)
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